31/07/2025

Julius Evola - A Religiosidade do Tirol

 por Julius Evola

(1936)


À beira do caminho há uma grande cruz, com uma data e uma inscrição desbotada, da qual não lembramos exatamente as palavras em alemão, mas que dizia aproximadamente o seguinte: “Tu que passas, detém-te por um momento, olha os gelos e os sinais d’Aquele que morreu pela nossa redenção, ensinando-nos que a morte é o caminho para a vida.”

Uma lenda enigmática sugere que o Santo Graal, a mítica taça que recolheu o sangue de Cristo e simboliza a tradição espiritual viva do Ocidente medieval, teria se transferido da Espanha – do Monsalvato de Salvatierra – após várias peripécias para a Baviera e, finalmente, para o Tirol.

Em Innsbruck, na “Capela de Prata”, entre as estátuas dos lendários ancestrais do último cavaleiro “europeu”, Maximiliano I, encontra-se a de Arthur, o rei da Távola Redonda e, precisamente, dos Cavaleiros do Graal. Mesmo no fechamento e no endurecimento próprios de uma realidade residual, no Tirol parece conservar-se algo desse obscuro legado. As origens da raça predominante, dinárica e nórdico-dinárica, não são claras. Certo é que o cristianismo deve ter revivido nela uma herança muito mais remota, dando-lhe a possibilidade de se prolongar, transformada, em um período histórico adicional.

A presença de alguns símbolos primordiais em forma cristianizada, mais do que ocidental, deve ter essa origem.

É, por exemplo, bastante difundido, nos vales tiroleses e também em cidades como Innsbruck e Lienz, uma estranha variante do crucifixo, que repousa sobre o hieróglifo do Carneiro, formado com troféus de caça e que traz ao redor de Cristo uma auréola solar do mesmo tipo radiante das religiões primordiais. No topo de casas rurais, sempre fiéis a um estilo característico, encontram-se interessantes combinações do crucifixo com figuras animais sintéticas, variadas conforme os vales, as quais conservam com grande verossimilhança símbolos arcaicos “totêmicos”. E assim por diante.

São frequentes, em todo caso, os sinais de uma religiosidade que se afasta do plano sentimentalista ou convencional e se eleva diretamente ao plano da síntese espiritual.

Há pouco indicamos um exemplo. No Oetzal, um caminho que leva até os gelos é, por assim dizer, marcado pelas imagens da Via Crucis. As várias estações se sucedem a longos intervalos, desde a “paixão” até a ressurreição, lá onde o mundo das rochas termina e se preludia o dos gelos perpétuos.

Isso, numa zona fora dos itinerários alpinos mais frequentados, como um rito anônimo e silencioso, mas ainda assim saturado de significado vivo.

Na região do Gross-Glockner, numa garganta onde o riacho gerado por esse pico desce em uma cascata turbulenta, há uma pequena capela com vários ex-votos. Um deles é representado por medalhas de valor militar, com a seguinte inscrição: “A Deus devo a coragem que me conferiu esta honra.”

Lembramo-nos de uma cerimônia celebrada, não sabemos por qual ocasião, na igreja de Prägraten. A igreja tinha o aspecto de um verdadeiro alinhamento. À direita, os homens; à esquerda, as mulheres, todos em trajes tradicionais e em perfeito alinhamento. No centro, uma espécie de representação corporativo-militar, de pé com bandeiras e estandartes. Todos acompanhavam o motivo dado por um órgão, mas reforçado por trombetas, com um efeito singular, não desprovido, apesar dos desafinos, de uma certa grandiosidade.

No Tirol, não há grupo de casas, por mais remoto e exíguo que seja, que não tenha sua capela, e não há passo montanhoso ou ponto panorâmico que não tenha seu crucifixo, constantemente recolocado no lugar toda vez que o vento ou a tempestade o derrubam ou o levam: quase como um mudo convite a transfigurar e integrar aquilo que, como simples emoção estética, pode vir da contemplação da natureza na forma superior de um significado espiritual, para não dizer de um símbolo iluminante.