19/07/2021

Giovanni Sessa – Cioran e Eliade: Uma Cumplicidade Discorde

 por Giovanni Sessa

(2020)


Cioran e Eliade, dois distintos representantes da cultura romena do século XX. O primeiro, escritor puro, refinado transcritor do nada, cético contemplativo do mundo e do seu destino, o segundo historiador das religiões e erudito, exegeta de mitos e contos fabulosos com os quais também aprendeu a técnica requintada de um romancista de qualidade. Suas relações são duradouras, eles "frequentam" um ao outro, pelo menos epistolarmente, por mais de cinquenta anos, passando por momentos dramáticos e trágicos da história do século XX. Isso é lembrado pela recente e digna publicação de sua correspondência, Uma Cumplicidade Secreta. Cartas 1933-1983, editada por Massimo Carloni e Horia Corneliu Cicortaş, aparecendo no catálogo da Adelphi (pp. 299, euro 22,00). O volume é encerrado no Apêndice por dois escritos: no primeiro, Cioran fala de Eliade, no segundo, ao contrário, Eliade se ocupa com Cioran. Seguem-se dois ensaios dos editores, permitindo ao leitor contextualizar historicamente o conteúdo do epistolário.

A antologia consiste de cento e quarenta e seis cartas, noventa e seis de Cioran e cinquenta de Eliade, mantidas em arquivos e bibliotecas americanas, francesas e romenas. As cartas do historiador das religiões são escritas em romeno, as de Cioran, depois de 1958, são em francês, a língua de "adoção" deste último. O primeiro encontro entre os dois aconteceu em Budapeste, no final de uma palestra dada por Eliade sobre Tagore, que também contou com a presença do muito jovem escritor. O conhecimento entre os dois foi propiciado, naquela noite distante, pelo filósofo Constantin Noica. Cioran tinha vinte e um anos, seu correspondente, recentemente retornado da Índia, e já bastante conhecido como ensaísta e jornalista, vinte e cinco. O escritor lembra que, desde o ensino médio, lia vorazmente todos os artigos do futuro acadêmico, considerado o mestre da "nova geração" de intelectuais transilvanos. Tais leituras o introduziram a civilizações e culturas distantes. Mesmo durante os anos da universidade, Cioran continuou com as leituras eliadianas, embora conduzidas em extrema solidão. Os dois estavam ligados por interesses comuns que, nos seus primeiros anos, eram também de natureza política, devido à sua proximidade mútua com o fascismo europeu e, em particular, com a Legião de Codreanu. Isto é confirmado em uma carta de Eliade datada de 24 de julho de 1936, escrita no seu retorno de Londres, onde ele havia sido enviado para saber sobre o Movimento do Grupo Oxford. Diz: "Eu fui lá e vi; é a coisa mais magnífica da Europa. Supera até mesmo Hitler" (p. 23).

Ambos estavam convencidos, como os tradicionalistas, de que a civilização europeia estava chegando ao fim, impregnada como estava, pelo espírito da decadência. Então Eliade disse: "Estou convencido de que tudo vai acabar, muito em breve [...] tudo que diz respeito à nossa época (Kali-yuga) vai desmoronar de forma apocalíptica" (p. 15). Apesar da proximidade, é possível detectar nas missivas, diferenças significativas nas "equações pessoais" dos dois autores. Cioran, em 25 de dezembro de 1935, escreveu a seu amigo: "Embora sinta por você uma simpatia infinita e inegável, às vezes sinto o desejo de atacá-lo, sem argumentos, sem provas e sem ideias. Sempre que tive a oportunidade de escrever algo contra você, meu afeto aumentou" (p. 21). Além disso, já em 1933, em suas Cartas a um Provinciano, Eliade havia atacado Cioran pela tanatologia obsessiva que caracterizava, em sua opinião, seu mundo ideal e o próprio escritor de Sibiu, no mesmo ano, em O Homem sem Destino, havia "demolido" seu amigo sem nomeá-lo. Além disso, os dois estavam divididos, em alguns momentos da vida, por fatos pessoais: Mircea havia seduzido e abandonado uma amiga de Emil. O segundo, portanto, sentiu-se autorizado a estigmatizar o comportamento desonroso do primeiro. Muito mais tarde, nos anos 80, durante um feriado passado no sul da França, houve novas discordâncias entre os dois, o que também envolveu Ionesco. A deles foi, portanto, uma cumplicidade discorde.

Estima mútua, mas as profundas diferenças de caráter, que também se refletiram em suas respectivas visões de mundo. Enquanto Eliade era dominado, desde a adolescência, por uma sede absoluta de conhecimento, por uma tensão incontrolável que o levava a isso: "acumular conhecimento nas mais diversas áreas" (p. 284), a existência de Cioran sempre foi acompanhada por uma visão trágica. Ele julgava o ecletismo de seu amigo, o produto de sua movimentação, no mundo da cultura e do espírito, mais em "extensão" do que em profundidade. Para Emil, a personalidade de Mircea era desprovida de angústias metafísicas e de convulsões existenciais: tais traços podem garantir um "destino" a quem os suporta. Para o historiador das religiões, a definição que Cioran usava para o empresário de ideias, Jean Paul Sartre, pode ser válida: "Pensador sem destino, infinitamente vazio e maravilhosamente amplo [...] Nenhuma fatalidade o persegue" (p. 283). A falta de um polo ideal imóvel em seu horizonte especulativo fez de Eliade, um explorador do sagrado, alheio à dimensão autenticamente religiosa. Mircea era fiel a um culto único, raro e precioso, o da bibliofilia: mais do que os deuses ele adorava os livros que, de qualquer forma, eram seus fiéis guardiões.

No sentido contrário, o que unia intensamente os dois estudiosos? Sobre este aspecto seu epistolário não admite negação: a estraneidade em relação à história e as filosofias da história. Para ambos, os eventos humanos, demasiado humanos, possuíam o traço de inessencialidade. Assim, sobre o assunto, Cioran se expressa: "O que não é história é religião. Tudo é religioso; já que a história não é. Minha tragédia decorre do fato de eu ser um homem irreligioso, assim como você". (p. 21). Não teria Emil escandalizada a família, especialmente o pai, que era padre, e o próprio Eliade, com a publicação de Lágrimas e Santos? Apesar disso, o ilustre historiador das religiões é considerado por seu correspondente, símbolo do paradoxo religioso de nosso tempo, marcado pela morte de Deus: "Somos todos, Eliade na liderança, ex-crentes, somos todos espíritos religiosos sem religião" (p. 286). O cético Emil entendeu que a fraqueza do amigo também era sua força: paladino teórico da coincidentia oppositorum, o estudioso a realizou admiravelmente em sua própria vida, conciliando misticismo e literatura, espírito erudito e espirituosidade.

Eliade, antes de perder a consciência por causa do derrame que, dois dias depois, o separou da vida terrena, estava imerso na leitura dos Exercícios de Admiração de Cioran. Em particular, ele estava lendo as páginas brilhantes, embora irreverentes, que naquele texto de despedida havia dedicado a ele seu amigo de toda a vida. A esposa do estudioso relatou que o encontrou, na cadeira de leitura, com um sorriso nos lábios: um sinal, talvez, de que ele esteve ciente, uma última vez, de sua cumplicidade secreta, cumplicidade de cume, cumplicidade estelar.