06/11/2025

Christian Bouchet - Os Carlistas: Os Vendeanos da Espanha

 por Christian Bouchet

(2025)



Surgido há 192 anos na Espanha, o carlismo permanece bem vivo. Ele encarna uma fidelidade a uma visão de mundo tradicional e pré-industrial, próxima à dos legitimistas franceses.


A origem: uma questão de valores


Tudo começou em 1830, quando o rei da Espanha, Fernando VII, alterou a ordem de sucessão – que até então seguia a lei sálica – para que sua filha mais velha, Isabel, pudesse herdar o trono. O irmão do rei, Carlos de Bourbon, que seria o legítimo sucessor, recusou-se a jurar lealdade à sobrinha e, em 1833, após a morte de Fernando VII, autoproclamou-se rei da Espanha.

À primeira vista, parecia uma simples disputa dinástica, mas, na realidade, escondia algo mais profundo: um embate entre duas visões de mundo. De um lado, Isabel II agrupava a burguesia anticlerical, liberal e centralista; do outro, Carlos de Bourbon era o porta-voz do povo simples, dos católicos e da defesa dos fueros (privilégios regionais e locais).


As guerras carlistas


Três guerras civis opuseram os partidários de Isabel II e seus sucessores, Amadeu I e Afonso XII, aos carlistas.

A primeira durou de 1833 a 1840. Os carlistas, apoiados por um número significativo de oficiais legitimistas vendeanos ou chouans (realistas franceses), provavelmente teriam vencido se as tropas de Isabel II não tivessem recebido ajuda externa de países que compartilhavam sua ideologia liberal. O Reino Unido enviou uma legião de voluntários, e a França de Luís Filipe interveio com sua Legião Estrangeira.

Após seis anos de paz, uma insurreição carlista seguida por uma nova guerra civil eclodiu na Catalunha, Aragão, Navarra e País Basco entre 1846 e 1849. Derrotados novamente, os carlistas não desapareceram, e quase um quarto de século depois, outra guerra civil sangrenta assolou o norte da Espanha de 1872 a 1876.


O carlismo da queda da monarquia à Guerra Civil


Derrotados no campo de batalha, mas não nos corações, os carlistas participaram da vida política a partir do final do século XIX sob diversos nomes – Partido Tradicionalista, Comunhão Católico-Monárquica, Partido Carlista, Partido Jaimista, Comunhão Legitimista e Comunhão Tradicionalista – de modo semelhante aos católicos sociais franceses. O historiador espanhol Pierre Vilar descreveu sua ação como "uma rejeição ao capitalismo liberal e individualista em nome das tradições comunitárias, morais e religiosas; uma espécie de populismo político reacionário, mas indiscutivelmente popular". Assim, em 1919, os operários carlistas catalães fundaram em Barcelona os Sindicatos Libres, enquanto no início do século buscavam alianças com os nacionalistas bascos e catalães.

No entanto, as tendências operárias e federalistas foram gradualmente abandonadas pela liderança do movimento, que julgou mais estratégico posicionar-se quase exclusivamente na defesa da Igreja Católica, em reação ao crescente anticlericalismo.

Foi nessa época que Juan Vázquez de Mella, fortemente influenciado pelo pensamento de Donoso Cortés, sistematizou a doutrina carlista, transformando-a em um programa político coerente. Mas, germanófilo por antiliberalismo, Vázquez de Mella opôs-se, durante a Primeira Guerra Mundial, ao pretendente Jaime de Bourbon, que apoiava os Aliados. Isso levou a uma cisão, e seus seguidores abandonaram o movimento carlista para fundar, em 1919, o Partido Católico Tradicionalista – antissemita, islamofóbico, antimaçônico, antifrancês, antibritânico e defensor de uma sociedade orgânica baseada na família, nos municípios e nas regiões.


Franco contra o carlismo


Desde os primeiros dias da Guerra Civil Espanhola, os carlistas forneceram 60 mil voluntários organizados em tercios de requetés e tiveram papel crucial no conflito. Eram, sem dúvida, uma das duas maiores forças em mobilização popular e enquadramento ideológico (a outra sendo a Falange). Por isso, assim como a Falange, representavam um perigo potencial para Franco e precisavam ser neutralizados. Em 20 de abril de 1937, um decreto impôs a fusão da Falange e da Comunhão Tradicionalista em um partido único: a Falange Espanhola Tradicionalista das JONS. Como os líderes carlistas resistiram, seu chefe, Fal Conde, foi preso. Ainda assim, a Comunhão Tradicionalista manteve-se ativa na clandestinidade, em oposição a Franco, que em 1955 a denunciou no jornal Arriba como "um pequeno grupo de integristas, marginalizados desde o início do Movimento, que seguem um príncipe estrangeiro".

Ao mesmo tempo, o regime franquista manobrou – após a morte do pretendente Afonso Carlos I – para fragmentar o movimento carlista, apoiando pretendentes rivais...

Enquanto parte dos carlistas acomodou-se ao franquismo, uma facção significativa adotou uma oposição mais ou menos declarada. Já em 1950, 275 acadêmicos da Associação Escolar Tradicionalista enviaram uma carta aberta ao ministro da Educação, protestando contra a falta de liberdade na Espanha.

A Lei dos Princípios Fundamentais do Movimento (1958) acalmou temporariamente essa oposição, pois alimentou a esperança de que o pretendente carlista Carlos Hugo sucedesse Franco. O regime também flexibilizou-se, permitindo organizações carlistas legais e grandes manifestações em Montejurra.

Mas a trégua durou pouco. A partir de 1965, o carlismo tornou-se novamente um movimento antifranquista, inclinando-se cada vez mais para a esquerda: rebatizou-se como Partido Carlista, criou uma ala armada que colaborou com o ETA, declarou em seu congresso de 1972 ser um "partido de massas, de classe, democrático, socialista e defensor de uma monarquia federalista" e uniu-se às frentes de oposição de esquerda (Junta Democrática da Espanha e Plataforma de Convergência Democrática).

Essa guinada não foi aceita por muitos carlistas veteranos da Guerra Civil. O Partido Carlista perdeu apoio, a Comunhão Carlista foi reativada, e confrontos armados ocorreram entre os dois grupos.


Que carlismo para o século XXI?


Hoje, o carlismo não tem peso eleitoral na Espanha. Se nas eleições de 1977 obteve 12% dos votos na Navarra (4% para o Partido Carlista, 8% para a direita carlista) e 7,7% na mesma região em 1979, desde então desapareceu das urnas – o Partido Carlista recebeu 0,1% em 2012, e a Comunhão Tradicionalista Carlista, 0,48% em 2008.

Além disso, permanece dividido em três grupos antagônicos: o Partido Carlista (que apoia Carlos Xavier de Bourbon-Parma), a Comunhão Tradicionalista Carlista (sem pretendente reconhecido) e a Comunhão Tradicionalista (a mais à direita), ligada a Sixte-Henri de Bourbon-Parma (tio de Carlos Xavier).

Sem relevância eleitoral e fragmentado, o carlismo ainda exerce influência – assim como a Action Française na França – não como força política, mas como centro de ideias contra-revolucionárias e reacionárias no melhor sentido do termo.


Rumo à reunificação?


Em 5 de maio de 2020, pela primeira vez desde 2010 (quando se tornou pretendente), Carlos Xavier de Bourbon-Parma participou da Via Sacra que os carlistas realizam desde 1939 em Montejurra, Navarra, em memória dos requetés mortos na Guerra Civil.

No mesmo local onde, em 1976, um confronto entre carlistas "de direita" e "de esquerda" deixou dois mortos e vários feridos, Carlos Xavier não se colocou sob a égide de seu pai (responsável pela guinada à esquerda do carlismo), mas de seu avô Xavier I, o último pretendente consensual. Além disso, não mencionou o Partido Carlista oficial, mas invocou o "povo carlista, reunindo velhos e jovens, com um passado distinto", exortando-os a unir-se por uma "Espanha melhor, mais democrática, justa, solidária e federal".

Se o Partido Carlista ignorou a declaração, Tradición Viva (órgão dos carlistas mais tradicionais) celebrou-a, alegrando-se por ter um pretendente alinhado a suas convicções.

Mas daí a imaginar uma reunificação carlista há um longo passo – e este parece intransponível, dada a deriva libertária de esquerda do Partido Carlista, que na primavera passada declarou apoio ao movimento LGBT+.