por Aleksandr Dugin
(2019)
A Inspiração do Último Evola
O primeiro opúsculo do Barão Julius Evola é chamado “Arte Abstrata” (1920)[1]. É uma obra juvenil, onde todavia é fácil entrever as principais linhas diretrizes deste autor, desta personalidade, deste mito. Conhecendo concorrentemente Julius Evola, a sua herança e o seu incrível destino, buscaremos inserir este pequeno opúsculo na monumental totalidade do seu pensamento.
Em um dos raros vídeos no qual aparece, Evola, já ancião, fala das suas simpatias dadaístas[2]. É impressionante ver como é vivaz, como brilham os seus olhos, como ele se inspira ao recordar o seu passado dadaísta, nos mínimos detalhes... Obviamente, ele amava tudo isso loucamente – e, de fato, ele se recorda disso com grande prazer. Seria divertido, em paralelo, ver o velho Guénon falar da sua poesia juvenil, dedicada às iniciações dos ciganos ou a uma certa reabilitação do diabo... Teriam seus olhos brilhado também? Não creio. Mas isto é algo que nunca saberemos...
Vamos, portanto, à “Arte Abstrata”. Por que abstrata? O que quer dizer Evola, o grande Evola, na sua totalidade, com a palavra “abstrata”?
Abstrato e Diferenciado
A primeira associação que vem à minha mente é com o “homem diferenciado” da obra “Cavalgar o Tigre”, escrita em 1961[3], décadas depois. O “homem diferenciado” é aquele que, apesar de estar imerso no mundo moderno, dele permanece absolutamente separado, distante, privado de conexões orgânicas, de cumplicidade emotiva ou de comunhão valorativa. O “homem diferenciado” é uma “pessoa autônoma”, defensor de uma subversão radical do mundo moderno e dos seus fundamentos, os quais, por sua vez, representam a subversão do mundo normal, tradicional, de uma sociedade hierárquica baseada em valores sagrados.
Um dos temas mais importantes que conectam o início e o fim do pensamento evoliano é a adesão absoluta a um fundamental princípio do desapego. A abstração é, para Evola, um desapego radical. A sua atenção se foca antes de tudo no problema da distância, do desapego em relação a um ambiente particular, que gera uma ruptura clara e irreversível. Antes de se transmutar em ação, é a consciência de uma distância fundamental e substancial. Se, em geral, é possível romper os laços existentes, a abstração e o homem diferenciado implicam a compreensão espontânea e fulminante do fato de que tais laços não existem na verdade.
O Observador e a Superação Concreta do Humano
Em “Arte Abstrata” Evola fala do observador, da transcendência interior que, capturada, se torna uma nova essência sobre-humana, constituindo ao mesmo tempo um substrato individual. É um vetor fundamental desde o princípio, uma concreta superação do ser humano – concreta, no sentido de que não é a afirmação de uma meta longínqua, mas o resultado verificável de uma experiência direta e tangível, uma sobre-humanidade realizada com meios quase científicos. O observador descrito por Evola no seu primeiro livro nos é imediatamente apresentado como um dado factual.
É bastante claro que Evola havia se tornado Evola bem antes deste texto, ditado por uma experiência rigorosamente verificável – fundamental, irreversível e inalienável. Não há dúvida: Evola já havia experimentado o encontro com o observador, conseguindo uma peculiar altura estratégica da qual falar aos leitores. Jean Parvulesco, que o conhecia, falou claramente de um sentimento seu de total distanciamento.
Teoria e Prática do Desapego Radical
O Evola de “Arte Abstrata” é certamente desapegado. É desapegado e sabe o que é o desapego. É desapegado e faz do desapego um programa. É desapegado e recomenda que façam o mesmo àqueles que podem e querem.
A minha hipótese é que Evola havia compreendido tal desapego nos termos de “abstração”. A “abstrata” é uma arte que se encontra alheia em relação à raça humana, em uma zona de superação precisa e ativa. Para além dos aspectos estéticos e filosóficos do primeiro Evola (que não tem ainda familiaridade com as obras de Guénon, as principais das quais ainda nem haviam sido escritas), o dado mais importante é que ele leva consigo a experiência da transcendência. O observador que há nele já havia tomado vida. É o ponto de partida. O observador é um espírito interior, é um momento de superação da vida e da morte.
Para sermos observadores, no sentido evoliano, é necessário portanto sermos diferenciados. A palavra “abstração” significa “separação”, “desapego”, “diferenciação”. Separação em relação a que? A linha de Evola é clara e inequívoca: em relação ao homem, cujos limites são superados. A abstração, neste caso, é clara e transparente: avançando além dos limites do humano, é necessário romper as pontes com ele. É um salto rumo a uma identidade alternativa.
O Objeto da Suspensão
Mas quem realiza a abstração? Quem é o artífice da superação? De onde vem tal impulso? É uma boa pergunta, mas que não pode encontrar uma resposta. A abstração descrita por Evola é, de fato, uma operação que muda radicalmente toda a geometria existencial do mundo. Um homem não pode vencer a si mesmo. E Deus não tem motivo para fazê-lo. Onde quer que um homem queira ir, levará sempre qualquer coisa de si, de “humano”. As entidades espirituais, com exceção das mais baixas e menos criteriosas, não entram voluntariamente na prisão da carne (salvo raros casos, de natureza avatárica). Disso deriva que a captura da posição do observador, a sua constituição e a encarnação prática da abstração são impossíveis tanto a partir de baixo como a partir do alto. Evola o percebe claramente. O seu “dadaísmo” não é conservador (não é até então tradicionalismo), mas já é extremamente crítico perante a modernidade, ainda que não privado de simpatias pelas suas possibilidades niilistas e destrutivas (a “água corrosiva” de que falarei mais adiante).
Sucessivamente, em “Cavalgar o Tigre”, Evola desenvolverá o tema nietzscheano do “conquistador de Deus e do nada”[4], referindo-se ao Deus do passado e ao nada do presente. Mas tudo isto já está implícito em “Arte Abstrata”. Mesmo não se tratando até então do Super-Homem (figura que Evola nunca compreendeu completamente), a questão do observador já está presente, sendo relativa aos princípios.
A posição do observador, a sua localização ontológica e epistemológica é muito importante. Ele ocupa um posto estranho e peculiar: não coincide com o homem, mas não pertence tampouco ao mundo divino; está em qualquer lugar “entre” (inzwischen), ocupa uma posição intermediária; pertence a uma dimensão multi sutil e de modo algum garantida. Não está tampouco ligada ao além-mundo, sendo imanente. Está “ao lado de”. O seu distanciamento não possui valor prognóstico constitui nele a essência, a natureza, o núcleo. Isto nos leva a um problema muito particular – a geometria da diferenciação, dentro da qual o problema do sujeito é resolvido no contexto da arte abstrata, tal como entendida por Evola. Não podendo confrontar de frente a questão, nos movimentaremos concentricamente...
Evola na sua Totalidade – A Geometria do Observador
Em “Arte Abstrata” se fala de “separação”, de “desapego”, de “ruptura”. É uma questão fundamental. A partir daqui tudo começa. A partir daqui tudo deve começar. Fala-se em “separar” – mas como, se não sabemos o que está entre uma coisa e outra? E então, quem o faz? O que acontece depois que o limite é atravessado e as existências são irremediavelmente divididas? Na realidade, a separação deve ser assumida como base. Afinal, não sabemos nem o que era o homem antes que isto ocorresse, nem onde estava o observador, antes de ter substituído o velho “eu” do “liberto em vida”.
Podemos supor que o “eu” não fosse nada e que o observador não se encontrasse em parte alguma. Todavia a separação, a abstração, a diferenciação, a divisão, a atualização dos limites junto à sua superação (o limite é aquilo que é efetivamente superado, existe apenas enquanto tal), formam uma nova topologia, da qual o grande Evola se ocupará por toda a vida. Partindo da “Arte Abstrata”, da sua teoria estética um pouco ingênua e das poesias experimentais (não muito elogiáveis – a poesia poderia ser melhor), chegaremos ao Evola integral. Porque é um livro que o observador ditou e presenteou aos observadores. “Arte Abstrata” é um livro cujo autor é abstrato (literalmente, “arrancado até a raiz”) e se volta para análogas entidades abstratas.
A coisa mais interessante é que, neste caso, o observador não possui época e se encontra em um equilíbrio precário, apoiado no dedo mindinho (como um asceta indiano), no interior de uma específica fase histórica. No curso da vida de Evola, o observador não aprenderá nada, não compreenderá nada, não se desenvolverá de forma alguma. Para ele, para este substrato puramente espiritual (“individual”, como o chama Evola), o tempo não tem importância. O observador é sempre o mesmo. E está tudo aqui, em “Arte Abstrata”. É fundamental. Aqui se manifesta a totalidade de Evola, o abstrato Evola, Evola enquanto observador.
Entre a abstração de “Arte Abstrata” e o homem diferenciado, “isolado” da última fase evoliana se desenrola o fio condutor da missão histórica do barão. Os seus aspectos políticos, ideológicos e intelectuais são extremamente interessantes, mas em todo lugar vemos se erguer o mesmo eixo existencial e metafísico – o eixo da diferença. Evola não quer ser “diferenciado”, ele o é. Em determinado momento – antes de escrever “Arte Abstrata” – ele se torna um.
Quando, exatamente? O que o agita? Existem diversas interpretações... É um fato que, em um determinado ponto, ele claramente experimenta a separação. O ambiente se torna um inferno insuportável e qualquer coisa nele realiza o salto pelo qual ele ansiava. Como sabemos, ele estava prestes a cometer suicídio – de um modo gratuito e sem propósito, impelido apenas por um imenso desgosto. E, ao invés disso, ele dá um salto, cuja repercussão durará por todo o resto da sua vida...
Um Tradicionalista sem Tradição
Uma vez eu chamei Evola de “tradicionalista sem Tradição”. Esta é, em minha opinião, a essência do tradicionalismo. O tradicionalista é ele mesmo quando o seu eixo se baseia (diretamente, na ausência de provas exteriores) na separação, em uma separação radical e irreversível, mas experimentalmente verificável, concreta. Quando ocorre tal separação, não importa se temos ou não uma Tradição. Na ausência de tal separação, a própria Tradição não passa de um simulacro “humano, demasiado humano”[5]. A tradição é aquilo que é separado. Mas isto que é separado de si é ainda mais importante e primordial, precioso e sagrado, que a Tradição.
O primeiro Evola de “Arte Abstrata” é a perfeita demonstração desta tese. Ele é já um tradicionalista feito e acabado, ainda que não esteja ainda voltado para a Tradição em um sentido verdadeiro e próprio. Os seus estudos tradicionalistas sucessivos não seram uma busca pelo desconhecido, mas a tranquila e previsível transcrição destas páginas. O observador tem as características de um dândi. Evola compara a arte a beber chá. Parvulesco me contou de uma pegadinha iniciática sua: “Café pour vous reveiller”. Frio em relação ao mundo moderno, Evola era também bastante frio em relação a Tradição. Ao primeiro disse um frio “não”, ao segundo um similarmente frio “sim”.
Teoria do Indivíduo Absoluto
A separação é o tema principal de toda a obra de Evola. O vemos nas suas obras filosóficas dedicadas ao “Indivíduo Absoluto”.
O que nos interessa é a descrição deste “eu absoluto”. É um eu suprarracional – ingressando na esfera racional, de fato, o eu deixa de ser absoluto, tornando-se condicionado e relativo. Mesmo que não seja concebível, o absoluto (etimologicamente: “destacado”, portanto “abstrato” e “diferenciado”) pode ser concreto. Podemos “possuí-lo” sem destruí-lo em um conceito, podemos ter consciência dele, apreendê-lo, nos situarmos em seu centro, na imanência absoluta e em uma total ausência de intermediários.
Partindo deste fundamento, segundo Evola se pode seguir em duas direções. A primeira é a “Via do Indivíduo Absoluto”. Aqui está dado apenas o Si absoluto; o observador é autossuficiente e separado de todo o resto. Não postula nenhum objeto, nenhum outro; é indiferente à sua afirmação ou à sua negação, à prova ou à recusa do seu ser. Não conhece outro além de si mesmo e crê que tudo que ele conhece participa de seu próprio jogo.
A segunda direção é chamada de “Via do Outro”. Aqui o Si absoluto gera o “outro”, o imanente, o humano, o conhecido, o sensível, que promove um movimento dialético em relação ao Si absoluto. Se considerado separado e oposto ao verdadeiro Eu, todavia, o outro não pode retornar: o percurso é uma ilusão, posto que quem admite a existência de uma distância analiticamente fragmentada – que, de fato, não existe – é condenado para sempre a superá-la. É, em suma, a reproposição da antiga aporia de Zenão sobre Aquiles e a tartaruga.
A separação/aspiração é instantânea e imediata. O caminho rumo ao verdadeiro “Eu” é inacessível, e ao mesmo tempo brevíssimo. Mas demanda uma ruptura de nível.
Introdução à Magia como Ciência do Eu
Nos ensaios de “Ur” e “Krur” inseridos em “Introdução à Magia como Ciência do Eu” (1955)[6] encontramos os mesmos temas, desta vez aplicados no contexto das práticas mágico-herméticas e tântricas. Toda a prática de Evola é centrada na exploração experimental da estrutura do observador. Algumas das suas soluções são extravagantes – em um dos textos dedicados ao homem interior, se propõe experimentar a liberdade de movimento corporal através de “uma rotação ao redor do próprio eixo”... Estas práticas ocultistas e os tons de alguns artigos podem suscitar um certo espanto. Alguns dos autores dos textos compilados por Evola não entendem nada e são simplesmente neo-espiritualistas delirantes. Não por acaso, o próprio Evola foi chamado de “o mestre que não queria discípulos”[7]. Muitos dos seus amigos ocultistas eram freaks, semelhantes a simulacros. A situação se agrava no caso dos neo-espiritualistas mesmo que, de modo geral, as fronteiras sejam muito sutis.
Algo me diz, porém, que se perguntássemos a Evola sobre estes colegas ocultistas, os seus olhos arderiam, como que recordando as desastrosas performances dos seus colegas dadaístas. Uma dança circular lunática de bacantes e coribantes cercava o observador... Os ocultistas ou os artistas de vanguarda são os equivalentes modernos da indispensável multidão que seguia as procissões dos antigos Deuses.
Todavia, os textos de Evola, sejam eles ocultistas ou dadaístas (como as fórmulas de “Arte Abstrata”), se destacam sempre em relação aos outros. Se encontram em um nível muito diferente e dizem coisas diferentes. Para aqueles que tenham ouvidos para entender, obviamente.
A Política Diferenciada e a Angelópolis do Barão Evola
Nos seus escritos políticos (como “Imperialismo Pagão”, de 1928)[8] e em muitos livros e artigos escritos por Evola sobre a atualidade, nos deparamos com um fenômeno único: a política transcendente.
Em uma das relações mais confluentes em “A Quarta Teoria Política”[9], eu introduzi o conceito de “Angelópolis”, a Cidade dos Anjos. A política é aquilo que ocorre na pólis, na cidade. Mas a cidade pode ter ontologias diversas. Se consideramos a topologia neoplatônica, muito apreciada por Evola, nos deparamos com a interpretação de Proclo das três Cidades, das três Repúblicas.
Proclo fala do Estado platônico, que existe em três níveis.
Existe uma πόλις νοητικός e, consequentemente, uma política noética. É uma concepção encastelada no cume da mente divina, no Νοῦς. É o inteligível político, uma política νοήτα. A política enquanto ideia. Eis o plano arquitetônico da ontologia política.
A modernidade perverteu radicalmente o conceito de “inteligência”, tornando ambíguas todas as referências a essa. O próprio Evola buscava se distanciar do elemento racional, estando interessado em algo mais.
No terceiro nível do Estado encontramos a cópia terrestre do modelo noético, a encarnação da ideia na poeira, na matéria. Evola negava autonomia a este plano da realidade, frente a seu arquétipo. Não existe uma política autônoma. É uma ilusão. Nada existe que não tenha primeiro acontecido em um plano arquetípico.
Há, finalmente, uma outra política – uma política intermediária, chamada por Proclo de “dimensão do Estado celestial”. Não é um projeto ou um plano, nem uma cópia velada por uma obscuridade ilusória. É a política enquanto tal, na sua expressão prática e experimental. É a Angelópolis, a cidade dos observadores. Se poderia também chamá-la de Cidade dos Kshatriyas Celestes, dos Guardiões, dos Vigias, dos Veilleurs.
Eis a fria e imanente realidade da abstração. Não é um plano ou uma encarnação. Evola combateu sem trégua uma guerra, alegre e perigosa, em nome de tal política, da Cidadela Celeste e da Angelópolis. Passou toda a vida por fora de todo “politicamente correto”, não por uma pose, mas pelo seu desprezo pelos simulacros terrenos. O observador observou a realidade – aquela celeste, da Cidade dos Espíritos – percebendo-a diretamente. Vendo distorcida e deformada a cópia terrestre – bem distante do original concreto e evidente, da carne ardente da política celeste – frequentemente se indignava e era tentado a incinerar este horror, mas algumas vezes tentou desesperadamente melhorá-la, reconectando-a à sua forma divina.
Em “Arte Abstrata” e “Cavalgar o Tigre”, Evola tende a fazer terra arrasada, tentando uma forma de salvação em meio ao nada. Pouco importa. Não é a cópia política que é fundamental, mas uma política existencial original. Atenção: não é uma intenção política, mas uma realidade política, a política tal como ela se encontra no céu para além dos confis da morte. É uma política vertical, a única que merece ser seguida.
Separabit Terram ab Igne
A “Tradição Hermética” (1931)[10] descreve a mesma separação no contexto da alquimia. Significativamente, a “Tábua Esmeralda” de Hermes Trismegisto fala de uma separação (ou abstração).
Sepaparabit terram ab igne
Subtile ab spisso
Suaviter cum magno ingenio[11]
Se poderia escrever um tratado inteiro sobre a divisão alquímica e suas operações análogas, traçando correspondências e paralelismos.
Uma vez, Yevgeny Golovin me revelou: “A alquimia começa com a produção de um ovo filosófico, uma sutil membrana que te separa do mundo exterior. É muito flexível e multiforme, pode assumir a forma do mundo exterior nos mínimos detalhes; mas, se permanecemos no seu interior, o mundo não nos tocará”.
Em uma das surpreendentes conferências do Instituto de Filosofia dedicadas à vida dos alquimistas franceses René e Marikka Devocoux, estudantes de Eugène Canseliet (o qual, porém, interpretava o Opus exclusivamente em termos católicos), Golovin traçou uma relação inesperada sobre o “duplo livre”.
“A essência da alquimia”, disse, “é obter um duplo livre e volátil que desliza para além do nosso limite extremo”.
Golovin era o máximo especialista na questão do observador. Não obstante, não gostava do livro de Evola dedicado à alquimia. “A confunde com o tantra” observou, enigmaticamente.
Não sei o que ele quis dizer com isso. Uma coisa é certa: ele interpretou a alquimia como a mecânica da manifestação, da fixação e da libertação do observador. Era, mais uma vez, uma variação sobre o tema da abstração.
Assim Novalis entendia a abstração na alquimia: “Antes da abstração, tudo está em um, mas como caos; após o que tudo está de novo unido, mas em uma livre conexão de seres autônomos e autodeterminados. A massa produz uma sociedade, o caos um mundo”.
Os “seres autônomos e autodeterminados” de Novalis constituem uma sociedade de observadores. São os cidadãos da Angelópolis, os Indivíduos Absolutos de Evola.
A Doutrina do Despertar
Na sua obra sobre o budismo (A Doutrina do Despertar, de 1943)[12], pondo ênfase particular no budismo tântrico (Vajrayana), Evola explica substancialmente como alcançar o completo distanciamento, a abstração em relação ao mundo, transformando-se em uma presença transcendente sustentada em vida para cumprir uma missão ou simplesmente um capricho.
Aqui, o termo “Despertar” é sinônimo de separação, da abstração de que se fala em “Arte Abstrata”. O desperto, que deixa de ser si mesmo em sentido humano, é substituído pelo observador. Pela enésima vez, todas as práticas se reduzem a uma só coisa: revelar o lugar do “libertado em vida”, a intuição do observador que Evola descreve como o estado de “satori”.
Império do Ocidente
No estudo sobre a Tradição Ocidental (O Mistério do Graal, de 1937)[13] e na sua obra principal, “Revolta Contra o Mundo Moderno” (1934)[14], Evola parece se distanciar um pouco do observador e do Indivíduo Absoluto. Na realidade, nem tanto.
O centro da sua atenção é sempre o homem superior, que realiza a presença do observador em si mesmo – como si mesmo. Aqui – neste particular momento espiritual e existencial, nesta propriedade essencial – tem origem a hierarquia política, social e religiosa das antigas sociedades indo-europeias. Ser nobre e ário significa ser “nascido duas vezes” (dvija): a primeira fisicamente, a segunda espiritualmente, em um outro nível, na abstração. As reconstruções da estrutura sociopolítica ideal descrita por Evola como “normal”, posta em um passado mitologizado, podem ser interpretadas como um tipo de abstração política. Não obstante, são abstrações operativas, eficazes, metafísicas, ativas.
O filósofo russo (não muito brilhante, para falar a verdade) Nikolai Berdyaev escreve, assustado: “A pior coisa das utopias é que elas acontecem”[15]. Se substituirmos utopia por abstração e pior por melhor, obteremos uma fórmula perfeita. Pouco importa se o Medievo europeu ou a “Idade de Ouro” hiperbórea foram como Evola as descreveu. Estes “passados” abstratos determinarão um futuro concreto. Se fizermos o nosso melhor. Tal como Evola fez.
Entendido deste modo, o império é o que nos encoraja a impor sobre a matéria a realidade viva da estática Cidade Celestial; é uma práxis angélica. Em certo sentido, é um Império diferenciado, e portanto sagrado e interior. É o Império dos Despertos.
Neo-Espiritualismo e Águas Corrosivas
Na sua crítica ao neo-espiritualismo (Maschera e Volto dello Spiritualismo Contemporaneo, de 1932)[16], conduzida desenvolvendo principalmente as ideias de Guénon[17], como em muitas outras obras, Evola se refere uma vez mais ao observador e à compreensão da abstração. A sua crítica, todavia, não parte da bagunça formal e da demência dos círculos e das correntes neo-espiritualistas, mas da incompletude do despertar do “duplo livre”, de uma relação passiva com o sagrado e da incapacidade de fazer acordar verdadeiramente o observador.
Distinguindo as trilhas de um observador mesmo em correntes confusas e neo-espiritualistas como o Thelema de Crowleu ou a Miriam de Kremmerz – que Guénon insere no quadro da “contra-iniciação” e da “paródia” – Evola enfrenta estes fenômenos com atenção e simpatia, ponto por ponto, sem se deter diante de suas perturbadoras fanfarronices, nem diante de suas injúrias.
Sob o pseudônimo de “Iagla”, em “Introdução à Magia” Evola escreveu um ensaio chamado “Sobre Águas Corrosivas”[18]. É uma avaliação positiva, desde uma perspectiva iniciática, dos fenômenos transgressivos mais terríveis e destrutivos. Eis a lógica do artigo: a alma eterna é uma fantasia. Entrando no corpo, a alma é nele capturada, passando inteiramente à consciência individuada, fora da qual ela não existe. Torna-se, em suma, a forma de um ser humano, com a qual partilha completamente o destino. É isto que Iagla chama “estado A”. Imaginemos um poder – aquele das “águas corrosivas”, de fato – que rompe esta forma humana, destruindo-a completamente. É o “estado Z”. A alma é como a água derramada em um recipiente, ou seja, em um indivíduo imanente e inteligente. Se o vaso quebra, a água se espalha, perde a precedente forma, se dissipa...
Vários meios podem ser empregados como fatores de transgressão, veneno ou águas corrosivas: a intoxicação, as drogas, certas práticas “místicas” pouco conclusivas, o suicídio voluntário, a dissolução, etc. Tudo isto pode levar a alma de um estado A a um estado Z, conduzindo à pura destruição. Antes se era um homem – agora não se é mais. Não se é mais nada.
E ainda assim, esclarece Iagla, pode acontecer de a alma mesma, assustada pela resolução de uma pessoa a passar ao estado Z, tome a iniciativa, interferindo imperativamente no processo, revelando a presença de um observador, de uma testemunha, de um ser abstrato que, sendo indiferente à pessoa, obstaculiza completamente a plena e decidida autodestruição. É como se nós mesmos provocássemos a nossa alma, obrigando o observador a sair em descoberto, não importando quanto ele não o queira ou se oculte conscientemente de nós.
Para correr este risco, porém, é necessário ter ouro dentro de si. Se o observador não aparece, o Estado Z é um desaparecimento irrevogável no grande subsolo das “trevas exteriores”[19]. Apenas poucos eleitos possuem um observador, o qual aqui, pela força das coisas, entra em cena. Iagla chama este fenômeno a arte de “morrer ativamente”.
O neo-espiritualismo, por sua vez, não leva a lugar algum. É um percurso direto ao Estado Z que leva consigo a loucura: mas se enlouquecemos de forma ativa e consciente, temos uma minúscula possibilidade de obter resultados interessantes.
É interessante como Evola avalia Crowley. Todos os seus seguidores se transformaram em monstros frios ou em charlatães inescrupulosos, as suas amantes acabaram em hospícios, mas ele, como se isso não fosse nada, se decompondo em um ritmo intenso e acelerado, viveu até a velhice mantendo intactas a sua memória e a sua energia. Aquilo que deveria tê-lo matado só o tornou mais forte, enquanto os outros foram varridos ao longo do caminho. Evola vê nele, com uma clara simpatia (diferentemente de Guénon), um adepto da Via da Mão Esquerda. Crowley se demonstrou capaz de alcançar a própria “estrela interior”. Os meios são irrelevantes: conta apenas a capacidade de fazer surgir esta estrela interior.
De outra forma, podemos também seguir a tradição mais ortodoxa; mas se não aparece algum observador, se não há “nenhuma estrela à vista”, para Evola isso não significa nada. Está tudo privado de valor. A propósito, é propriamente aqui que reside a essência da controvérsia entre Evola e Guénon. Se Evola atribuía um certo valor a esta iniciação “virtual”, segundo Guénon, na ausência de uma severa preparação preliminar por dentro de uma transmissão iniciática regular, não era possível qualquer realização espiritual. Foi isto que os separou. A sua oposição não foi aquela entre um brâmane e um ksatriya, mas entre um moralista e um dândi – ambos, naturalmente, agentes no contexto do tradicionalismo e de seu incomparável espaço semântico. Ainda que esta corrente tenha sido criada (isto deve ficar claro) só e exclusivamente por Guénon, Evola, que nela se inseriu, desenvolveu uma ação bem mais convincente do que qualquer outro, inclusive em relação aos guenonianos mais ortodoxos.
O fato é que Evola nutria um profundo desprezo em relação ao neo-espiritualismo convencional – em primeiro lugar, pelo seu caráter plebeu e pelas suas simplificações.
Eros Viril e Via Tântrica
Em “Metafísica do Sexo” (1958)[20] retorna mais uma vez o nosso tema, dessa vez como especulação sobre uma abordagem masculina à sexualidade.
No eros, segundo Evola, a principal função masculina é a de ser abstrato (no sentido de: separado, diferenciado) em relação à natureza feminina, não nos termos de uma distância em relação a ela, mas mais precisamente de uma profunda penetração. Um conhecido dito alquímico afirma: “O metal não é forte quando não se mistura aos outros metais, mas quando, apesar de se misturar, permanece ele mesmo”. Eis, segundo Evola, o eros autenticamente viril. A verdadeira separação e diferenciação não deriva da abstinência (em todas as suas manifestações), mas de uma alegre disponibilidade de submergir ali – sob a condição, obviamente, se possuir um total controle metafísico interior sobre aquilo que ocorre. O amor é aqui análogo às “águas corrosivas”. Ele esmaga e pulveriza os fracos, elevando os mais fortes, os eleitos, libertando-os com misericórdia e crueldade. Me vem à mente o brilhante livro de Jean Parvulesco, “A Misericordiosa Coroa do Tantra”[21].
Vamos agora ao Tantra, do qual Evola fala em “O Homem como Poder” (1926) e em “O Ioga do Poder” (1949)[22]. Atentemos ao primeiro título: o Homem como poder. No tardio “Cavalgar o Tigre”, Evola retornará a ele. A ideia principal é que a pessoa é a máscara de uma essência sobre-humana, um casulo, um instrumento. Esta essência sobre-humana pode emergir ou não. No primeiro caso, a pessoa não é apenas humana, mas possui algo além. O Observador. No caso contrário, não há nada que se possa fazer. Toda a problemática é reduzida à técnica – assim como o primeiro Evola descreve as técnicas da arte abstrata, como um “engenheiro indiferentemente sábio que caminha entre as suas grandes máquinas imóveis em um dia de festa”[23]. Pura técnica, nada de pathos. A autópsia do poder do observador na via tântrica é um manual de mecânica iniciática repleto de detalhes ilustrativos e procedimentos científicos. Antes de lidar com isso, é necessário pelo menos morrer.
Descrevendo o peculiar estado tântrico – a “intoxicação transparente” e a “ebriedade lúcida”, para cuja realização são dirigidas as práticas tântricas – Evola nos presenteia mais uma vez com um retrato perfeito do observador. Nenhuma visão, nenhuma compreensão da essência das coisas – tudo isto é secundário, acidentai, e por assim dizer, “facultativo”. A coisa mais importante é o fato experimental de ser separado, abstrato e diferenciado. Para quem está separado tudo é e não pode deixar de ser bom. E é ruim para quem não é separado, para os que permanecem indiferenciados. Nada faz sentido para estes.
O erotismo configurado sacralmente leva a uma constante “intoxicação transparente”, à “ebriedade lúcida”. É, substancialmente, um estado de “libertação em vida” (jivan mukta).
Os Olhares do Observador e a Equação Pessoal
Os livros de Evola são construídos ao redor daquilo que é livre, já livre, não daquilo que ainda deve se libertar (e a libertação é reservada a poucos, não a todos; seria uma ingenuidade acreditar no contrário: todos os outros serão jogados fora, na lixeira). É o poder reencontrado, identificado, descoberto, um poder que, por assim dizer, se garante apenas diante de si mesmo, se auto-hipnotizando. O observador se contempla, dando ocasionalmente uma olhada àquilo que o circunda. Aquilo que ele observa é transferido à zona abstrata, extirpado, incinerado, tornado diferenciado. Os livros e os textos de Evola, junto aos seus gestos e às suas palavras, às suas paixões e posições, são olhares do observador. Podem cair sobre qualquer coisa: sobre o esporte (Evola considerava o ski uma degeneração e o alpinismo uma ocupação aristocrática)[24], sobre a droga (em “Introdução à Magia” são dadas instruções detalhadas sobre como cheirar éter), sobre o jazz negro (Evola não gostava das danças dos negros)[25], e assim por diante. O observador olha sempre através, e também sempre na direção contrária em relação a tudo que passa por moda do lado de fora.
É interessante recordar a famosa “equação pessoal”[26] de Evola, em constante oscilação – e similarmente equidistante – entre os arquétipos do kshatriya e do brâmane. Não é um problema de escolhe, mas de constituição abstrata. O observador não é nem um brâmane nem um kshatriya. É os dois, ao mesmo tempo. Pode ser várias coisas, movendo-se em direções diversas. Se o seu poder absoluto se concentra sobre si mesmo, é calmo e, em certo sentido, pacífico. Depois da separação, nada do exterior o toca. Mas se ele se volta (e por que não?) para o exterior, então aquilo se revela algo que merece ser destruído (ou, no mínimo, necessita de uma radical mudança revolucionária). É um despertar bestial. Na revolta dos berserker aparece uma calma ascética. Apenas aqueles que imitam sacerdotes ou guerreiros, não superando o “humano demasiado humano”, veem em tudo isto uma contradição. A experiência do poder demonstra como ambos estão indissoluvelmente ligados pela partilha de um substrato transcendente.
O Tempo Vertical de Plotino e o Sujeito Radical
Em “Arte Abstrata” Plotino é citado. Também em “Introdução à Magia” Evola o aborda repetidamente. Ele é essencial. Plotino é o tradicionalista por excelência. Quase como o Barão, é um tradicionalista sem Tradição. Claro, em seu tempo existia uma tradição, mas isto não é fundamental. Na sua resposta a Amélio, que lhe propunha adorar aos deuses no templo como teria feito um pagão pio, Plotino responde: “Cabe aos Deuses virem a mim: não a mim ir a eles”[27]. Tais citações plotinianas – por assim dizer, dândis – se encontram por toda parte nos três volumes de “Introdução à Magia”.
Plotino e as suas Enéadas são monumentos erguidos à experiência da separação. Eis, em síntese, os temas gerais do neoplatonismo. Os mundos espirituais fluem um do outro. A primeira tese do “Parmênides” de Platão enuncia quatro hipóstases[28], da primeira à última: o apofático Um (ἓν), puro e supra-ontológico (que transcende o Ser); o Intelecto (νοῦς), uno-múltiplo; a Alma, una e múltipla (ψυχή); a pura multiplicidade (ὕλη), Matéria). Eis o πρóοδoς, o êxodo, a emanação. Quando este processo chega ao limite inferior – a matéria, a corporeidade, a realidade ontológica mais baixa – acontece uma mudança radical. Depois de ter explorado a profundidade do abismo, o espírito se move ao contrário, na direção opostoa em relação ao desenvolvimento das quatro hipóstases do “Parmênides” platônico. É o ἐπιστροφή, o início do retorno. Emerge assim o dramático tempo vertical da cosmologia e da soteriologia neoplatônica, perpendicular ao tempo horizontal (seja ele cíclico ou linear-histórico), segundo um esquema descrito em todas as tradições sagradas.
O homem é o limite inferior do mundo, a realização do fundo, do qual devemos retornar. Não podemos permitir que Deus fique preso nesse lodaçal desprezível. Plotino era alarmado pela corporeidade, como se fosse imundície. A pessoa representa, ao contrário, o momento de mudança direcional do processo ontológico, o fulcro, o lugar no qual ocorre uma rotação inversa; podemos pensar na “virada” (die Kehre) de Heidegger.
Mas o neoplatonismo conhece também uma outra modalidade ontológica fundamental: a espera (μονή), um estadia constante e imutável em si mesmo livre do fim último e do retorno. Nem mesmo o tempo vertical tem poder sobre a μονή. Parvulesco falou dele como de “um mundo paralelo ao mundo paralelo”. A luz vertical perdida no ouro último dos céus invisíveis reside em uma outra perpendicular, que, contrariamente às leis da geometria física, não coincide com a linha horizontal – é, por assim dizer, uma “horizontal” imaginária, completamente diferente. É uma “constante” daquilo que é radicalmente separado, abstrato duas vezes, profundamente – abissalmente – diferenciado. É aquilo que eu chamo de Sujeito Radical: como o observador de Evola, pode ser julgado apenas com base na experiência.
O Sujeito Radical pode ser definido como aquilo que não muda enquanto todo o resto muda. Posto que o tempo da origem e do retorno é vertical, segundo o neoplatonismo o mundo é eterno, não muda nunca em sua estrutura. O Sujeito Radical, todavia, não muda de modo algum, nem mesmo na estaticidade e na verticalidade do mundo eterno. Não depende do tempo vertical, mas é igual a si mesmo seja no ponto inferior seja no superior. Na realidade, não reconhece nem mesmo um cume superior ou inferior, nem à matéria como limite exterior: é capaz de descer até mesmo abaixo da quarta hipóstase do “Parmênides” platônico, empurrando até uma – ontologicamente impossível – quinta hipóstase ou até à nona [29] (este é o mundo moderno e pós-moderno, irreal [30] e bizarro; o mundo da subversão, infestado de simulacros tão desgastados que não é nem mesmo claro do que é que são cópia...), e mais uma vez ainda mais baixo – onde não há mais nada... Ao mesmo tempo, o Sujeito Radical pode se elevar ao Intelecto, ou através dele, ainda mais alto – na direção do Uno apofático e supra-ontológico (ou pré-ontológico). Até mesmo além – através do próprio Uno... Onde não há nada... E ainda assim, está em todo lugar sempre igual a si mesmo. É invariável, no sentido mais absoluto. Este é o Sujeito Radical... Teria ele algo a ver com Evola? Não posso lhes dizer. Talvez, sim...
Uma Atitude Ativa diante do Sagrado
Um tema constante em “Introdução à Magia”, assim como em outras obras evolianas, é a atitude ativa diante do sagrado. Essa implica aquilo que Evola chama de “esoterismo”, em contraposição ao misticismo, ao neo-espiritualismo, ao profano e ao mero devocionalismo. Não basta que o sagrado venha a nós. É bom que isso ocorra, mas não é o bastante. Devemos subjuga-lo, por assim dizer, vencê-lo. Ele é superior a nós, mas algo dentro de nós é ainda maior que ele. O sagrado golpeia, destrói e fascina (nos enfeitiça, nos transporta a outro lugar ou nos arremessa no abismo), mas é mulher. Este é um aspecto a ser considerado com atenção.
O esoterismo é negócio masculino. Um verdadeiro homem ama as mulheres. Não obstante, conhecendo-as, permanece vigilante. O sagrado deve ser amado como se fosse uma mulher. Eis porque a metodologia tântrica é particularmente adequada como exemplo.
Irmãos Diferenciados: Mundus Imaginalis e Gimnosofistas
É bom acrescentar alguns exemplos relativos aos conceitos, sinônimos, de “abstração” e “separação”.
Na tradição do Ishraq do mestre Shihab al-Din Yahya Suhrawardi, a imaginação separada (hayal-i munfasil) assume um papel muito importante. Descreve a realidade de uma zona intermediária (barzakh) situada entre o mundo da matéria e o dos princípios inteligíveis. A este mundo da imaginação corresponde uma tripartição – nela encontramos o homem de luz, angélico, situado entre o homem corpóreo e o “homem” do intelecto puro. As três pessoas exaurem a extensão geral do eixo espacial. A pessoa média é imaginária e imaginante, um homo imaginalis. É um centro de irradiação imaginativa, que forma o próprio mundus imaginalis (hurkalia). Também o mundo material, na realidade, é fantasioso, mas é mais pesado, sujeito ao peso da matéria. A tarefa do filósofo da escola mística de Ishraq é passar do corpo à imaginação separada, ao mundo intermediário. Ali ele encontra um anjo consagrador. É o observador – ou, melhor, a sua máscara (persona). Este anjo é chamado por Suhrawardi de “Intelecto Escarlate” (‘aql-i-sorkh)[31]. É “escarlate” porque a sua luz não é pura, possuindo dentro de si resquícios de matéria. A separação e a abstração nos conduzem a uma imaginação desencarnada.
Em um dos seus tratados, Suhrawardi fala da existência de uma comunidade especial, que inclui Hermes Trismegisto, o Seth bíblico, Pitágoras, Platão, Plotino, Empédocles e, sucessivamente, sufis como Al-Hallaj ou Dhul-Nun al-Misri (Suhrawardi se coloca entre eles). São todas “pessoas separadas” ou “irmãos da diferença” (ikhwan-i tajrid). São todos, por assim dizer, “abstratos” ou “diferenciados” (Evola), e constituem uma “catena aurea”. O que os diferencia é o fato de que a sua órbita é de todo independente do humano. Não são sobrecarregados pela materialidade, da qual estão separados, tal como estão isolados da humanidade.
O termo árabe com o qual Suhrawardi define esta comunidade (tajrid) significa “nudez”. Não se pode excluir que as raízes deste simbolismo retornam à linha dos gimnosofistas (os γυμνοσοφισταί, os “sábios nus” encontrados por Alexandre Magno na Índia), assim como aos ritos da nudez sagrada (por exemplo, a “dança dos sete véus), dos quais Evola escreve em “Metafísica do Sexo”. A nudez simboliza a fundamental operação de abstração, a separação. Chegamos assim à denudatio alquímica.
As Lendas Metropolitanas de uma Alma Estática e Não Cadente
O observador de “Arte Abstrata” permanecerá com Evola o resto da sua vida. O reencontramos, vivaz, frio, mas ainda alegre, nos seus últimos textos e nas raras entrevistas televisivas. É menos distinguível no período intermediário, sob as “tempestades de aço” do século XX, em meio a qual o observador se move com desenvoltura. Como todos sabem, Evola amava caminhar sob os bombardeios (tal como Ernst Jünger) e a estética do cair das bombas. Muito dadaísta.
Evola amava citar a expressão “alma estática e não cadente” de Agrippa von Nettesheim[32]. Uma alma humana ordinária não só cai, mas é já caída: está distendida, colapsada na terra. Não no melhor dos mundos, ademais. A alma estática e não cadente é algo de fundamentalmente diferente; possui uma geometria diversa, outra atitude, diferentes ideias de espacialidade e temporalidade. É uma alma separada, nua, abstrata, diferenciada. Está de pé, sem cair, porque nada a derruba. Pode descer bem como ascender, até mesmo imitando(se o quiser) os homens comuns e movendo-se horizontalmente. Também neste caso, todavia, tal alma procede aos saltos – esquecendo a gravidade opressiva da matéria e esmagando sob o próprio calcanhar alado a carne, que já não existe nela.
Parvulesco me contou uma história bizarra. Um dia, enquanto se encontrava com Evola – o qual, como noto, passou metade da sua vida semiparalisado – testemunha um fato muito bizarro: certo de não ser visto por seu jovem amigo, Evola se levantou bruscamente da poltrona, deu dois rápidos passos na direção da mesa, onde estava apoiada uma garrafa de álcool, a derramou em um copo e bebeu velozmente. Depois disso voltou à sua cadeira, cobriu rapidamente as pernas com um cobertor, transformando-se novamente em um enfermo. Parvulesco ficou tão surpreso que não ousou dizer uma palavra. Relembro este episódio para fazer com que vocês compreendam melhor a grandeza deste homem, que nos deixou (assumindo, então, que ele de fato fez isso...).
Uma outra história sobre Evola me foi contada por um amigo, o ótimo artista sérvio, tradicionalista e dândi, Dragos Kalajic – também ele, infelizmente, falecido. Enquanto jovem, Kalajic viveu em Roma, onde pintava. Por um período, movido por bondade (e talvez também por outros motivos...), hospedou no seu laboratório uma jovem, uma hippie que de vez em quando usava como modelo. Frequentemente desaparecia, sem dizer por onde andava (como fazem habitualmente os hippies, e não apenas...). Um dia, Dragos pergunta a ela onde havia estado, e ela fala sobre se encontrar regularmente com um interessante velho paralítico, com o qual fazia amor. Grande foi a surpresa de Dragos ouvindo seu nome. Sim, sim, é precisamente aquele nome... Se pensamos no que é uma paralisia para as artes inferiores e sobre como se faz amor, é impossível não imaginar sérios problemas anatômicos.
A alma estática e não cadente pode ser a chave para decifrar estes episódios incompreensíveis, mas não pretendo insistir, consciente de que poderia ser, no mínimo, tolice. A propósito, uma vez – em um congresso romano dedicado aos vinte anos de sua morte [33] – pedi ao médico pessoal de Evola, o doutor Placito Procesi, alguma explicação sobre estes episódios. Ele deu de ombros, dizendo que era impossível, tendo estado na companhia do filósofo quase diariamente. Violando as ordens do seu médico, Evola às vezes bebia e fumava. Mas, como isto não tem nada de “mágico”, não nos ocuparemos.
Ars Sacra e Metáforas Catafáticas
Tendo examinado a hermenêutica da “abstração” no primeiro Evola – de modo livre, mas detalhado – passemos então à arte.
Em sentido estrito, a arte é apanágio da terceira casta, dos artesãos, que se ocupam da matéria. Os sacerdotes, a primeira casta, não tem nada a ver com a matéria, e os kshatriya, a segunda, normalmente a destroem. A arte é associada à materialidade, à sua transformação. Mas este é apenas o esquema do tradicionalismo, a ser exposto àqueles que se interessam excessivamente por arte, sobrevalorizando a sua importância.
Todavia, na alquimia nos deparamos com expressões como Ars Sacra, Ars Regis, Ars Sacerdotalis, etc. Em suma, pode ser definido como “arte” também aquilo que fazem as castas superiores (guerreiros e sacerdotes). Se aquilo que está no alto é símbolo daquilo que está no baixo, então vale também o discurso inverso. Sobre isso, reproduzo aqui um longo fragmento de Dionísio Areopagita: “Perceberemos que os teólogos iniciados não moldam estas imagens devotamente apenas para revelar as ordens celestiais: às vezes eles as usam também na revelação da própria divindade. Em certas ocasiões, partindo das coisas que nos parecem mais preciosas, a celebram como Sol da justiça, como Estrela Matutina que se ergue misticamente na inteligência, como luz que brilha sem véus e de modo inteligível; em certas outras, partindo dos objetos de grau intermediário, a chamam de fogo que ilumina sem ferir, água que transmite a plenitude da vida e que – para falar simbolicamente – penetra no ventre e esguicha rios que escorrem sem impedimento; em ainda outras, finalmente, recorrendo às coisas mais baixas, usam apelativos como “unguento odorífico” ou “pedra angular”. Mas também atribuem formas de feras, costurando nelas as propriedades de um leão ou de uma pantera; e afirmam ainda que ela é um leopardo ou uma ursa sem filhos. Acrescento ainda a representação que entre todas parece a mais vil e a mais absurda: os especialistas nas coisas divinas nos transmitem que essas assumem o aspecto de um verme. De tal modo, todos os teólogos e os intérpretes do pensamento oculto tem distanciado o “santo dos santos” dos não-iniciados e dos ímpios, conservando-o não-contaminado; e veneram as representações sagradas incongruentes seja para não tornar acessíveis as coisas divinas aos profanos, seja para evitar que aqueles que amam contemplar as imagens divinas se detenham nestas representações como se fossem verdadeiras: só assim as coisas divinas podem ser honradas mediante as verdadeiras negações e as representações incongruentes que se situam no limite extremo da degradação”[34].
Tudo aquilo que existe é simbólico. Se o mundo simboliza catafaticamente o Criador, as suas partes singulares podem simbolizar os aspectos singulares do Criador. Segundo esta lógica, a “Arte”, como esfera da atividade humana, pode ser aplicada a algo mais elevado. O supremo, de fato, é omnicompreensivo e se reflete em tudo.
No seu primeiro texto, Evola fala de arte, querendo claramente se referir a algo além. O seu espírito salta no abismo do νοητóς aristocrático, levando consigo o que está a seu alcance. Neste caso, a arte. Evola transcende a arte, elevando-a a Ars Sacra e Ars Regia. Em “A Tradição Hermética” completará esta movimentação semântica, levando-a às suas últimas consequências.
Mas não é o fim que nos interessa, mas o início. Por que a arte atrai Evola? Por que, diferentemente dos seus sucessores, mais dogmáticos, ele confere a ela um valor tão grande, situando-a quase acima de tudo? Caso se tratasse de um simples “pecado de juventude”, os seus olhos não brilhariam décadas depois, falando do período dadaísta. Este fogo, mal escondido e alegre fervor do velho mestre do tradicionalismo é um convite a reler a sua primeira obra, decifrando a segunda metade do título deste pequeno manifesto artístico e a sua poesia obscura – abstrata.
O Segundo Cume
Evola fala de arte abstrata, mas para ele toda a arte – a arte em si – é abstrata. Diferentemente da filosofia, da metafísica, da religião ou da moral, a arte é, para Evola, um campo abstrato, uma zona do abstrato. Ou a arte é abstrata ou não é. Realmente? Não seria um exagero?
Aqui devemos nos referir a outro. A Martin Heidegger, para sermos mais precisos. Filósofo dos filósofos, príncipe dos filósofos, filósoco por excelência (que, entre outros, Evola não entendeu nem apreciou; todavia, as omissões dos grandes homens demandam estudo e entendimento, nunca condenação), Heidegger acreditava que o espírito possuía dois cumes – a filosofia e a poesia (mais em geral, a arte). São diferentes: as pessoas que neles ascendem veem tudo de maneira diferente, a partir de ângulos diferentes. E, ainda assim, são semelhantes: ambos se colocam muito acima do vale dos homens comuns. A filosofia opera com a razão: independentemente de como se lida com ela, de ser mais ou menos inventiva, é um fato que se ocupa apenas dela. A poesia, por sua vez, tem a ver com outra coisa... Poder-se-ia dizer “loucura”, mas seria prematuro, ainda que não tão distante da verdade... Heidegger acreditava que a filosofia se concentrava no Ser. E a arte? O que é iluminado pelos seus refletores? Heidegger responde: o sagrado (Heilige). Talvez seja um indício.
Evola fala de “arte”, Heidegger do “sagrado” e da “loucura”. Esta definição abarca “Arte Abstrata”? Tenho certeza de que sim. É o máximo que se pode fazer. A arte para Evola é aquele cume, longe dos vales e das pessoas comuns, onde as coisas se percebem de modo suprarracional, diretamente, tal como elas são, no orvalho dourado do amanhecer de uma pura e ativa loucura aristocrática. Uma loucura sobre-humana.
Escolhendo a arte, Evola escolhe o sagrado. O veremos confirmado em todo o seu labor futuro. Na verdade, independentemente das coisas com as quais ele se ocupou, o Barão sempre escreveu sobre o sagrado. Assim como Heidegger, atraído pela poesia, Evola, homem do sagrado, criador de arte sagrada, de arte real, tendia À racionalização e à filosofia. Mas vinha da arte.
Rumo à Dialética da Loucura Imperial
Evola não era realmente insano, então? A palavra “realmente” é discutível. Os verdadeiros insanos são sub-racionais de casta inferior. A sua loucura é torpe e medíocre, é uma desordem dos elementos inferiores, anímicos, corpóreos, desprezíveis em si – seja quando são ordeiros, seja quando fogem ao controle. Em uma pessoa normal, tudo é repugnante: a saúde e a doença, a alegria e o sofrimento, a normalidade e a patologia. O homem comum é repugnante em si mesmo.
Escolhendo a arte, Evola opta pela loucura. Mas é uma loucura aristocrática. É uma loucura elegante. É a loucura de um visionário, de um dândi...de um guerreiro. Similarmente louco é o chefe de exércitos vitoriosos, que guia as suas tropas rumo a novas batalhas. Mesmo quando chega a hora de parar, a vontade de criar arte o empurra sempre mais para dentro do território inimigo, rumo à construção do Grande Império Continental, do Império Interior, do Império da Alma Infinita, altamente organizada e encastelada nos cumes.
Já evocamos o “morrer ativamente” de Iagla. A situação é semelhante: a arte é um convite a enlouquecer ativamente, de modo consciente mas irreversível. Enlouquecer, para então reconquistar a paz e a soberania, alcançando, porém, uma mente completamente distinta.
Aqui podemos recordar a dialética de Hegel, que o jovem Evola estudou com interesse e cujos traços são perceptíveis em “Teoria do Indivíduo Absoluto (1927)[35] e “Fenomenologia do Indivíduo Absoluto” (1930). A famosa tríade hegeliana tese-antítese-síntese (inocência-pecado-virtude) é assaz exemplificativa. A inocência não é virtuosa, sendo apenas ausência de pecado. Uma vez ocorrendo o pecado, a inocência é perdida. Ela se vai como se nunca houvesse existido. A inocência não basta, apenas diante do pecado pode surgir a virtude, entendida como a faculdade de resistir ativamente, eficazmente e conscientemente ao pecado. Para fazê-lo, porém, é necessário antes saber o que é o pecado.
Eis a dialética da arte, entendida como “arte abstrata” (deste ponto de vista, não há outras): mente (tese) – loucura (antítese) – superação da loucura na experiência mesma da loucura (síntese). A essência da arte reside nesta sequência. A filosofia liga a mente, tentando iluminar o céu negro da surpresa (Heráclito, Plotino, Nietzsche). A arte, por sua vez, escolhe a via da loucura, percorrendo-a, de país em país, ao longo de toda a noite sagrada.
Recuperação e Fechamento do Círculo Hermenêutico
Nietzsche escreveu muito sobre a convalescência. A convalescência é o conceito operativo mais importante de todos. Não é a saúde, nem a doença. É a superação da doença, que por sua vez destrói a saúde. A arte não é loucura em estado puro – é uma loucura distante, superada, que, todavia, ainda emana um aroma denso, inquietante.
A loucura na arte ou a arte da loucura é o manto com o qual o observador se envolve, é o seu meio de sustento, a sua irradiação, a sua peculiar “piscina” existencial, cujas águas podem parecer (e são) corrosivas.
Chegamos assim à conclusão lógica daquela que é uma primeira interpretação hermenêutica de “Arte Abstrata”. Recordando ainda Heidegger, podemos falar de uma exploração e reflexão preliminar. Os grandes homens e os seus textos são como espirais abertas para o alto e para o baixo – pode-se percorrer ambas as direções, de forma ilimitada, defrontando-se sempre com grandes surpresas. A sua grandeza é sempre aberta; com rigorosa disciplina, nos ensinam apenas a liberdade, a liberdade de desfraldar uma poderosa vontade solar. Outros círculos hermenêuticos devem ser abertos pelos estudiosos de Julius Evola. Talvez, um dia, eu o farei eu mesmo... Quem sabe? Nos limites de uma primeira aproximação, porém, me parece que eu já disse o suficiente.
Notas
1 - Atualmente em Julius Evola, Teoria e Pratica dell'arte d'Avanguardia, Edizioni Mediterranee, Roma, 2019.
2 - A transcrição das três entrevistas, disponíveis no YouTube e datada do fim dos anos 60, está contida em Julius Evola, Autobiografia spirituale, editado por Andrea Scarabelli, Edizioni Mediterranee, Roma, 2019.
3 – Ultima ed.: Edizioni Mediterranee, Roma 2009.
4 – Julius Evola, Cavalcare la tigre, cit., p. 44.
5 - Celebérrima expressão de Nietzsche (cfr. Umano, Troppo Umano, Adelphi, Milão, 2011) citada várias vezes por Evola em Arte Astratta.
6 - Introdução à Magia foi publicada pela primeira vez em uma tiragem privada de cinquenta exemplares numerados, entre 1927 e 1929 (era a coleção encadernada de fascículos), depois em uma segunda edição, profundamente reelaborada por Julius Evola, para Bocca, entre 1954 e 1955. Finalmente, uma terceira edição foi publicada em 1971 para a Edizioni Mediterranee. Da primeira coletânea existe também uma edição anastática - sem, portanto, as intervenções realizadas pelo diretor de "Ur" e "Krur" - realizada por Massimo Scaligero e publicada no início dos anos 80 pela editora Tilopa.
7 - É o título de um artigo de Gianfranco de Turris lançado em "L'Italiano" de Pino Romualdi, em julho de 1974, um mês depois da morte de Julius Evola.
8 - Ultima ed.: Edizioni Mediterranee, Roma 2004. Esta edição contém também Heidniscer Imperialismus, versão alemã do livro evoliano contendo diferenças significativas.
9 – Cfr. Aleksandr Dugin, La Quarta Teoria Politica, tr. de Camilla Scarpa, NovaEuropa, Milano 2017, pp. 247-249.
10 – Ultima ed.: Edizioni Mediterranee, Roma 1996.
11 - "Separai a Terra do Fogo, o sutil do espesso, docemente, com grande indústria".
12 – Ultima ed.: Edizioni Mediterranee, Roma 1995.
13 – Ultima ed.: Edizioni Mediterranee, Roma 1994. O texto em questão foi pensado por Evola originalmente como um capítulo de Rivolta Contro il Mondo Moderno, mas foi publicado autonomamente através da enorme quantidade de material coletado por seu autor.
14 – Ultima ed.: Edizioni Mediterranee, Roma 1998.
15 - Eis a citação completa de Berdyaev, citada em epígrafe por Aldous Huxley no "Il Mondo Nuovo" (Mondadori, Milão, 1991): "As utopias aparecem hoje muito mais realizáveis do que se poderia crer outrora. E nós nos encontramos atualmente diante de uma questão muito angustiosa: como evitar a sua realização definitiva?".
16 – Ultima ed.: Edizioni Mediterranee, Roma 2008.
17 - Maschera e Volto dello Spiritualismo Contemporaneo desenvolveu principalmente as teses contidas nos livros de René Guénon L'Erreur Spirite (Éditions Traditionnelles, Paris, 1923; ed. it.: Luni, Milão, 1998) e Le Théosophisme (Éditions Traditionnelles, Paris, 1921; ed. it.: Arktos, Carmagnola, 1987).
18 - O ensaio de que Dugin fala foi lançado em 1928 nas páginas de "Ur". Foi inserido, obviamente, em Introduzione alla Magia (Edizioni Mediterranee, Roma, 1971, vol. II). Na sua forma original, o ensaio está inserido - junto a um rico comentário assinado por Alessio de Giglio - em Julius Evola, Autobiografia Spirituale, cit.
19 – As mesmas trevas, sempre no âmbito dadaísta, evocadas por Evola no incipit do seu "poema a quatro vozes" La parole obscure du paysage intérieur, del 1920: «Dans les ports les galères pavoisées et les splendeurs couleront dans les ténèbres extérieurs» (ora em Teoria e pratica dell’arte d’avanguardia, cit., p. 279).
20 – Ultima ed.: Edizioni Mediterranee, Roma 1993.
21 – La Miséricordieuse couronne du Tantra di Jean Parvulesco lançada em 1978 pela Ethos.
22 – Na realidade, trata-se do mesmo texto, revisado e ampliado por Evola, vinte anos depois. Atualmente estão no mercado ambas as versões (a primeira reproduzida em anastática), editada pela Mediterranee, que há décadas publica as obras do filósofo romano em edição crítica.
23 – Julius Evola, Arte astratta, cit., p. 157.
24 – Cfr. principalmente o artigo evoliano Psicanalisi dello Sci, lançado no «Corriere Padano» em 29 de dezembro de 1940 e atualmente coletado, junto aos outros textos dedicados à espiritualidade da montanha e ao alpinismo, em Julius Evola, Meditazioni dalle vette, editado por Renato del Ponte, Edizioni Mediterranee, Roma 2003.
25 – Sobre o argumento cfr. Julius Evola, Da Wagner al jazz. Scritti sulla musica (1936-1971), editado por Piero Chiappano, Jouvence, Milano 2017.
26 – Expressão empregada por Evola na sua "autobiografia espiritual", Il cammino del cinabro, datada da primeira metade dos anos sessenta (ultima ed.: Edizioni Mediterranee, Roma 2018, editado por Gianfranco de Turris, Andrea Scarabelli e Giovanni Sessa; veja-se particularmente o cap. 1).
27 – Tratte dalla Vita di Plotino di Porfirio, estas palavras foram inseridas em 1929 em «Krur», em Massime di saggezza pagana di Plotino, atualmente em Gruppo di Ur (editado por), Introduzione alla magia, cit., vol. III, p. 145.
28 – As quatro primeiras (ou cinco, nas outras interpretações do diálogo platônico Parmênides) hipóstases estão baseadas no reconhecimento do Um. Para os neoplatônicos, elas descrevem o mundo existente - o estado potencial e, ao mesmo tempo, atual. [N.d.A.].
29 – As sucessivas hipóstases do Parmênides (da quinta à sexta, até a oitava e a nona) estão baseadas no reconhecimento da ausência do Uno. Descrevem o mundo não-existente - de forma nem potencial nem atual. [N.d.A.].
30 – Para os neoplatônicos, um mundo que negue o Um e o eterno não pode existir. A modernidade, diante destas observações, é portanto filosoficamente impossível, enquanto a pós-modernidade se baseia no reconhecimento explícito do próprio niilismo. [N.d.A.].
31 – Cfr. Glauco Giuliano, L’immagine del tempo in Henry Corbin. Verso un’idiochronia angelomorfica, Mimesis, Milano 2009 [N.d.A.].
32 – Expressão contida no tratado De Occulta Philosophia, escrito entre 1510 e 1530 (ed. it.: Enrico Cornelio Agrippa, La Filosofia Occulta o la Magia, Edizioni Mediterranee, Roma 1983).
33 – O evento foi realizado em Roma em junho de 1994. Além de Aleksandr Dugin, participaram, entre outros, Vittorio Sgarbi, Emilio Servadio e Gianfranco de Turris.
34 – Dionigi l’Areopagita, Gerarchia celeste. Teologia mistica. Lettere, Città Nuova, Roma 1986, pp. 30-31 [N.d.A.].
35 – Trata-se de um livro único, na verdade, publicado em dois volumes e em dois momentos diversos por razões exclusivamente editoriais. Ambos os volumes foram republicados pela Edizioni Mediterranee, respectivamente em 1998 e 2007.