12/11/2025

José Alsina Calvés - Sobre as Obras Biológicas de Aristóteles - Parte I: O Método

 por  José Alsina Calvés

(2024)



Introdução


Os tratados biológicos de Aristóteles constituem um quinto da obra conservada do estagirita. Apesar disso, durante muito tempo não despertaram grande interesse entre os especialistas, mais voltados para a Metafísica e a Lógica. Mas, há já bastante tempo, a crítica voltou a interessar-se pela biologia aristotélica. As causas são diversas.

Em primeiro lugar, alguns autores, como Pellegrin[1] ou Balme[2], demonstraram que as teorias biológicas de Aristóteles se inseriam em seu programa de filosofia geral, de modo que seu estudo não interessava apenas aos historiadores da Biologia, mas também aos analistas da filosofia do estagirita. A teoria das quatro causas, a distinção matéria-forma ou as ideias sobre o movimento parecem concretizar-se de forma clara nos tratados sobre os seres vivos.

Por sua vez, G.E.R. Lloyd[3], sem negar essa relação, moderou um pouco as expectativas e destacou barreiras entre a Metafísica e os tratados biológicos.

Além disso, a interpretação histórica ou biográfica da obra aristotélica, iniciada por Werner Jaëger[4], voltou a dar certa relevância às obras biológicas. Segundo essa interpretação, as contradições que encontramos na filosofia aristotélica explicam-se a partir de sua evolução pessoal, que vai do platonismo de sua fase acadêmica até o empirismo no final de sua vida, passando por uma etapa especulativa e dedutiva.

O fato de obras biológicas importantes, como Partes dos animais (PA) e, sobretudo, Geração dos animais (GA), serem datadas do período final da vida de Aristóteles foi um elemento importante no desenvolvimento dessa interpretação. No entanto, o fato de outra obra relevante, História dos animais (HA), de conteúdo muito mais empírico e descritivo que as anteriores, ser datada de um período inicial da vida de Aristóteles contradiz essa hipótese. De qualquer forma, nas discussões sobre essa interpretação, as obras biológicas tiveram um papel importante.

Na interpretação estrita da obra biológica, é preciso citar a polêmica em torno do suposto projeto taxonômico da zoologia aristotélica. Diversos autores da filosofia e da história da biologia (E. Mayr, M. Ruse)[5] defenderam que a biologia aristotélica é fixista e essencialista e busca uma classificação natural. O conceito tipológico ou essencialista de espécie, derivado das filosofias de Platão e Aristóteles, seria o "precursor" da ideia de espécie de Lineu e seus seguidores.

Essa interpretação foi criticada por Balme[6], que defendeu o caráter não essencialista da biologia aristotélica, e por Pellegrin[7], argumentando que os termos genos (gênero) e eidos (espécie) na obra biológica de Aristóteles não têm um significado taxonômico, mas lógico.

Por sua vez, Marcos[8] fez uma crítica muito interessante ao suposto projeto taxonômico aristotélico. Sustenta que, para um projeto taxonômico, devem ser atendidas as seguintes condições:


  • Categorias fixas ordenadas hierarquicamente.
  • Cada categoria contém uma série de táxons.
  • Cada elemento pertence a um táxon de cada categoria.
  • Há pertencimento hierárquico.


Nenhuma dessas condições está presente na obra de Aristóteles. Os termos genos e eidos não correspondem a categorias taxonômicas fixas, e não há qualquer tipo de ordenação hierárquica. Além disso, afirma que, na realidade, Aristóteles de fato classifica os animais, mas não o faz uma única vez, e sim várias, e não com base em um projeto taxonômico, mas com outros objetivos de pesquisa[9]: estudo de suas partes, formas de reprodução etc. Assim, encontramos os seguintes agrupamentos:


  • Sanguíneos / Não sanguíneos
  • Vivíparos / Ovíparos / Ovovivíparos
  • Sociais / Solitários
  • Selvagens / Domesticados
  • Entre outros.


Por fim, vamos nos referir à questão que este artigo se propõe a tratar. Trata-se de ver se a metodologia real que Aristóteles segue em seus estudos biológicos corresponde de fato à sua teoria da ciência, exposta nos Analíticos Posteriores (AP). Para isso, analisaremos primeiro qual é essa teoria da ciência e a metodologia que dela decorre, e depois examinaremos as obras biológicas, para ver se há essa correspondência.

O conjunto de obras aristotélicas dedicadas à lógica e à metodologia das ciências foi editado sob o nome de Organon: Categorias, Tópicos, Sobre as Refutações Sofísticas, Sobre a Interpretação, Analíticos Primeiros e Analíticos Posteriores.


Nos Analíticos Primeiros, Aristóteles trata da teoria e prática do silogismo, enquanto nos Analíticos Posteriores (AP), da ciência demonstrativa ou apodítica. Inicialmente, o modelo apresentado nos AP é o axiomático-dedutivo. Aristóteles parte de "primeiros princípios", evidentes por si mesmos, a partir dos quais se deduzem as diversas proposições. Parece tomar como modelo a matemática. Demonstra que as cadeias demonstrativas não podem ser infinitas, nem para baixo (em direção à percepção fenomênica), nem para cima (em direção aos primeiros princípios).

Porém, esse modelo é próprio de uma ciência já constituída e pode ser relacionado à atividade pedagógica de Aristóteles. De fato, muitos de seus escritos parecem ser notas para exposição em aula.

A questão é: como se chega a esses primeiros princípios? Na matemática, a resposta pode ser simples: eles são evidentes por si mesmos e não precisam de demonstração. Mas e nas ciências naturais?

Na demonstração axiomático-dedutiva, partimos do universal para chegar ao particular, ou seja, de conceitos teóricos (explanandum) para explicar fenômenos (explanans). Porém, na descoberta desses princípios, partimos do particular, do percebido, para alcançar o princípio universal.

Daí vem a definição do método aristotélico como indutivo-dedutivo. Na fase indutiva (epagoge), parte-se de particulares, mas "a partir da pluralidade de singulares, torna-se evidente o universal"[10]. Em seguida, a partir desses universais, deduzem-se explicações para os fenômenos.

Como assinala Düring[11], no final do Livro II dos AP, Aristóteles descreve como, por meio da indução ou epagoge, é possível chegar aos conceitos universais. Nesse sentido, é interessante a distinção aristotélica entre o "anterior por natureza" e o "anterior para nós", ou, em outras palavras, entre "o mais conhecido" e "o mais conhecido para nós"[12].

Quando fala do "anterior por natureza", refere-se aos princípios a partir dos quais se deduzem as proposições. Em uma ciência constituída, apodítica e demonstrativa, eles são "anteriores", pois a demonstração começa neles. Também pode ser entendido do ponto de vista didático: ao ensinar uma ciência, começamos por esses princípios, por isso são "anteriores por natureza".

No entanto, na elaboração dos conhecimentos da ciência natural, devemos começar pelo "anterior para nós", que é a percepção. Da percepção nasce a memória, e de muitas imagens da memória, a experiência[13]. Dessa acumulação de dados da percepção sensível e por um processo de abstração, surge o universal[14].

Aristóteles insiste que a percepção e a sensação são apenas dos "singulares", e que não é possível adquirir diretamente "ciência deles"[15]. Somente quando a faculdade inteligível (o logos) atua sobre as experiências acumuladas pela sensação e, por um processo de abstração, se chega ao universal, é que podemos falar verdadeiramente de ciência.

Devemos, portanto, distinguir entre o conhecimento dos fatos observados e a explicação das causas desses fatos[16]. Somente quando podemos fornecer essa explicação das causas é que podemos falar de conhecimento científico autêntico. Mas, para isso, precisamos conhecer os princípios, e chegamos a eles por indução a partir dos particulares.

Tudo isso se relaciona com as ideias sobre a percepção defendidas por Aristóteles em seu tratado De Anima. Nesse sentido, e como destacou Düring[17], a tese de que a percepção é uma faculdade passiva é importante, pois serve de fundamento para sua distinção entre pensar e perceber.

Nossa tese é que não há nenhum divórcio entre a metodologia exposta nos Analíticos Posteriores (AP) e a metodologia realmente empregada nos tratados biológicos. Mesmo correndo o risco de certa simplificação, podemos dizer que História dos Animais consiste em uma grande quantidade de observações cuidadosas, que fornecem as experiências que levam aos princípios, enquanto Partes dos Animais e Geração dos Animais (junto com outras obras menores) constituiriam a segunda parte do processo, em que, por dedução, buscam-se as causas.


O Livro I de Partes dos Animais


Há um amplo consenso de que este Livro I foi escrito não como uma introdução metodológica apenas a PA, mas como uma introdução metodológica geral a todos os tratados biológicos[18]. Nele, discutem-se diversas questões, como a rejeição à classificação dicotômica praticada na Academia platônica, ou questões relacionadas à analogia, aos gêneros e às espécies.

Do ponto de vista que nos interessa, há algumas alusões a como o naturalista deve passar do particular para o geral, ou do "que é primeiro para nós ao que é primeiro por natureza". O que ele diz é perfeitamente congruente com o defendido nos AP.

Assim, ele afirma que "é preciso começar primeiro a partir da coleta das características de cada gênero, para depois falar sobre suas causas e sua geração"[19]. Também diz que "o naturalista deve observar primeiro os fenômenos relativos aos animais e as partes próprias de cada um, e depois explicar o porquê e as causas"[20].

O naturalista, portanto, parte da observação dos particulares, ou seja, da sensação. O acúmulo de sensações produz experiência, e o pensamento ou "logos", atuando sobre essa experiência, por abstração, chega aos universais. Em contraste com a sensação, que é passiva, o pensamento é ativo. A partir desses universais, já se pode construir uma ciência apodítica ou demonstrativa e especular sobre as causas.

Vemos, assim, que não há contradição entre as ideias epistemológicas e metodológicas defendidas nos AP e o tratado metodológico sobre como operar no estudo dos animais.

Passaremos agora a analisar as três obras biológicas mais importantes de Aristóteles: História dos Animais (HA), Partes dos Animais (PA) e Geração dos Animais (GA), partindo da hipótese de que HA corresponde basicamente à primeira parte do processo, ou fase indutiva, na qual, a partir da observação dos particulares, chega-se aos princípios (sem prejuízo de que possa haver algum raciocínio dedutivo), enquanto PA e GA correspondem à fase dedutiva, em que se buscam as causas (sem prejuízo de que possam aparecer observações de particulares).


A metodologia em História dos Animais


O tratado História dos Animais contém 10 livros, dos quais os livros I-VI e o VIII são indubitavelmente aristotélicos. Trata-se de um compêndio de observações sobre os animais que, em sua maioria, constituiriam a primeira parte do método aristotélico: passar das observações particulares para as premissas universais. Diferentemente de Partes dos Animais (PA) e Geração dos Animais (GA), raramente encontramos especulações ou busca pelas causas.

Do ponto de vista metodológico, é interessante a citação: "Abarcar, em primeiro lugar, os caracteres distintivos e os atributos comuns; depois, tentar descobrir as causas" [21]. Em HA, basicamente, Aristóteles dedica-se à primeira parte do processo — buscar caracteres distintivos e atributos comuns —, deixando para PA, GA e outros tratados a investigação das causas.

A maioria das contribuições de HA resulta da observação de particulares e sua elevação a princípios gerais, mas raramente encontramos especulações sobre as causas, ao contrário do que ocorre em PA e GA. Assim, por exemplo, ele afirma que tanto os animais voadores com penas (aves) quanto os voadores de asas membranosas (mamíferos voadores, morcegos) são todos animais sanguíneos (vertebrados). Já os voadores de asas membranosas (insetos) são animais sem sangue (invertebrados) [22].

Não é difícil reconstruir o método. Após múltiplas observações de voadores com penas, ele verificou que SEMPRE eram animais sanguíneos e NUNCA eram animais sem sangue: a partir da observação de particulares, o logos abstraiu uma proposição universal, que, por sua vez, poderia ser utilizada de modo dedutivo, à maneira silogística.

  • Os animais voadores com penas são sanguíneos.
  • O pardal é um voador com penas.
  • O pardal é sanguíneo.

O mesmo procedimento se aplica aos voadores de asas dérmicas e aos de asas membranosas.

Da mesma forma, ele afirma que os vivíparos com chifres são bisulcos (artiodáctilos, com casco fendido), como o boi ou o veado, enquanto os solípedes (perissodáctilos), como o cavalo, nunca possuem chifres [23]. Quanto às brânquias dos peixes, ele observa que alguns têm um opérculo, enquanto os seláceos (tubarões e raias) não possuem opérculo e apresentam fendas branquiais expostas [24].


O tratado As Partes dos Animais



Já comentamos que o Livro I desta obra constitui uma introdução metodológica a toda a biologia aristotélica. O restante (Livros II-IV) é o primeiro tratado de anatomia comparada.

No início do Livro II, há uma referência explícita à História dos Animais. Aristóteles afirma que, nessa obra, foram descritas as partes que compõem cada ser vivo, mas que agora, em PA, estudar-se-ão as causas [25]. Ele também ressalta que "é preciso examinar separadamente cada uma das partes mencionadas em HA".

Cada uma dessas partes será estudada em ambos os tratados, mas com abordagens distintas: em HA, parte-se da observação de casos particulares para chegar a afirmações universais, enquanto em PA, partindo desses universais e por via dedutiva (ou especulativa), busca-se conhecer as causas. Só então se alcançará uma verdadeira episteme (conhecimento científico).

Tomemos como exemplo o estudo dos dentes dos animais, abordado no Livro II de HA e no Livro III de PA, mas com enfoques muito diferentes. Em HA, Aristóteles limita-se a constatar regularidades observadas por indução: todos os quadrúpedes vivíparos (mamíferos) têm dentes, mas com variações. Os que possuem chifres carecem de dentes incisivos na mandíbula superior [26]; outros têm presas salientes, como o javali [27], enquanto outros não as possuem.

Já no Livro III de PA, o estilo muda radicalmente, introduzindo explicações fisiológicas e funcionais ausentes em HA. Ele afirma que os dentes, além da função comum de mastigação, podem ter funções específicas conforme o gênero [28]: para ataque e defesa (em muitos carnívoros) ou apenas para defesa (em animais selvagens e domésticos).

Em seguida, analisa os tipos de dentes, usando o ser humano como exemplo: incisivos para cortar, molares para triturar e caninos em posição intermediária [29]. Depois, considera os dentes como instrumentos de defesa/ataque, classificando-os em dois tipos: presas proeminentes (como no javali) ou dentes serrilhados [30]. Observa, porém, que as fêmeas do javali não têm presas salientes.

Até aqui, trata-se de descrições baseadas na observação. Mas então surge um parágrafo que marca uma virada: "Agora é preciso extrair uma conclusão geral, tanto neste assunto como em muitos outros que serão tratados adiante" [31]. Qual é essa conclusão? Que a natureza provê instrumentos de ataque/defesa àqueles que podem usá-los — princípio que se aplica também a ferrões, esporões, chifres, presas etc.

Daí, ele infere que, como os machos são geralmente mais agressivos que as fêmeas, possuem esses elementos de forma exclusiva ou mais desenvolvida. Assim, o javali macho tem presas, mas não a fêmea; e os veados machos têm chifres, ao contrário das fêmeas [32].

Aqui aparece de forma nítida o método completo de Aristóteles. Se em HA ele se limita às observações e à indução de alguns primeiros princípios a partir delas, relativos às semelhanças e diferenças entre os animais, em PA ele vai muito mais além: eleva-se a princípios gerais em chave especulativa, para depois retornar às observações e explicar suas causas.

A observação mostra que, na maioria dos casos, os machos têm estruturas ofensivas/defensivas mais desenvolvidas ou exclusivas. Desse universal (fruto da observação), ele extrai um princípio especulativo: "a natureza dota de instrumentos defensivos aqueles que mais podem usá-los". Com esse princípio, explica a causa: "como os machos são mais agresivos, a natureza lhes dá presas (javali) ou chifres (veados)".

Como observou Pellegrin [33], HA pode ser visto como o estudo da causa material, enquanto PA investiga as causas formal e final.


O Tratado da Geração dos Animais



A Geração dos Animais (GA) é uma continuação de PA, dedicada exclusivamente à reprodução e ao desenvolvimento embrionário. No entanto, em HA, esse tema já é abordado de forma puramente descritiva, enquanto em GA buscam-se as causas gerais e explicita-se toda uma teoria da reprodução e do desenvolvimento embrionário.

Em HA, o tema da reprodução aparece no Livro III, que trata, entre outros assuntos, dos órgãos reprodutivos em vivíparos e ovíparos; no Livro V, dedicado à função reprodutiva de diferentes animais; no Livro VII, que aborda a reprodução humana; e no Livro X, sobre as causas da esterilidade na espécie humana e o papel da mulher na reprodução. É importante destacar que os Livros VII e X não têm autoria claramente atribuída a Aristóteles, embora contenham ideias tipicamente aristotélicas. Por isso, em nosso estudo comparativo, limitar-nos-emos aos Livros III e V.

A primeira parte do Livro III é um estudo detalhado dos órgãos reprodutivos dos animais, feito de forma puramente descritiva, sem qualquer alusão causal ou especulação. Aristóteles afirma que, nas fêmeas, esses órgãos são sempre internos, enquanto nos machos apresentam grande variedade e diferenças notáveis[34].

Ele também menciona que os "animais ápodes não vivíparos" (peixes e serpentes) não possuem testículos, mas apresentam dois ductos ao lado da coluna vertebral que se enchem de líquido seminal durante o acasalamento. Aqui, há uma referência à obra perdida Desenhos Anatômicos[35].

Se o Livro III limita-se a questões anatômicas dos órgãos reprodutivos, o Livro V já aborda as formas de reprodução e, quando aplicável, as formas de cópula. Aqui, ocorre uma mudança curiosa no método descritivo: enquanto em geral Aristóteles toma o ser humano como referência e compara os demais grupos a partir dele, neste caso ele inverte a abordagem, começando pelos animais mais simples e ascendendo até o ser humano—sem, no entanto, justificar essa escolha[36].

GA consiste em cinco livros. Os três primeiros dedicam-se à procriação, enquanto os Livros IV e V tratam de questões relacionadas à hereditariedade. Para nossa comparação com HA, focaremos principalmente nos três primeiros livros.

No Livro I, Aristóteles define macho e fêmea, mas, diferentemente de HA—que se limita à descrição anatômica dos órgãos reprodutivos—, ele vai além, atribuindo à fêmea a causa material e ao macho as causas formal e eficiente[37]. Mais adiante, explica as diferenças anatômicas entre machos e fêmeas em relação às suas funções reprodutivas[38].

Na descrição dos testículos e do útero, ele repete o que foi dito em HA, com uma referência explícita a essa obra[39]. No entanto, em seguida, há um capítulo intitulado Finalidade dos Testículos, que introduz uma explicação em termos de causa final. Segundo Aristóteles, os testículos não são essenciais para a reprodução, já que peixes e serpentes não os possuem, como já explicado em HA. Porém, ele afirma: "Os testículos foram concebidos para isto: tornam mais lento o movimento do resíduo seminal nos vivíparos, como cavalos e outros animais semelhantes, e também nos homens"[40]. Eles não são indispensáveis, mas melhoram o ato reprodutivo. A expressão "foram concebidos" enfatiza a causa final.

Quanto ao útero, ele segue o mesmo procedimento: começa com uma descrição resumida do que foi dito em HA. Vale notar que ele atribui útero a animais ovíparos, confundindo-o com o oviduto. As diferenças entre peixes, por um lado, e quadrúpedes ovíparos e aves, por outro, são relacionadas aos tipos de ovos—"imperfeitos" nos peixes (que aumentam de tamanho após a postura) e "perfeitos" nos outros dois grupos (que não aumentam)[41]. Sobre os vivíparos, ele afirma que todos têm o útero na parte inferior do corpo, pois, caso contrário, os filhotes pressionariam o diafragma ao crescer[42].

A seguir, ele desenvolve sua crítica à panspermia, exposta nos tratados hipocráticos Do Sêmen e Da Natureza da Criança, e apresenta sua teoria epigenética, segundo a qual o sangue menstrual fornece a matéria, e o sêmen masculino, a forma e a causa eficiente.

No Livro II, ele estabelece a diferenciação sexual e desenvolve toda a sua teoria da herença. Aqui, não há mais referências a HA (História dos Animais) nem a qualquer tipo de processo descritivo, mas sim uma via especulativa em busca das causas. Sobre a formação do embrião, ele afirma que "É necessário que o que está se formando se forme a partir de algo, por meio de algo e se torne algo"[43], numa clara aplicação de sua ideia de causa.

O Livro III tem menor importância do ponto de vista da nossa análise, pois é dedicado a questões muito específicas dos animais ovíparos.

CONCLUSÃO


O método científico descrito por Aristóteles em AP (Analíticos Posteriores) é, basicamente, dedutivo e demonstrativo, partindo de "princípios primeiros" dos quais se deduzem proposições. Na matemática, esses princípios primeiros ou axiomas são evidentes por si mesmos, mas nas ciências naturais, eles são alcançados pela observação dos particulares e pela atuação do logos sobre essas observações.

No Livro I de PA (Partes dos Animais), esse princípio metodológico é aplicado ao estudo dos animais. A observação e a atuação do logos sobre esses particulares permitem ascender aos princípios universais. Posteriormente, esses princípios permitirão explicar as causas, e então teremos um conhecimento autêntico, ou episteme.

Em HA (História dos Animais), são reunidas inúmeras observações, de modo que podemos dizer que essa obra constitui a primeira parte (fase indutiva) desse processo. Já em PA e GA (Geração dos Animais), entre outros tratados, encontramos a segunda parte do processo: a explicação das causas.
 

Notas

 
 [1] Pellegrin, P. (1982) La classification des animaux chez Aristote. Statut de la biologie et unité de l’aristotélisme. Paris, Société d’édition « Les Belles Lettres ».
[2] Balme, D. (1987) “Aristotle’s Biology was not essentialist”, en Gotthelf y Lennox (ed.) Philosophical Issues in Aristotle’s Biology. Cambridge, Cambridge University Press.
[3] Lloyd, G.E.R. (1970) Early Greek Science: Thales to Aristóteles.
[4] Jaëger, W. (1946) Aristóteles. México, Fondo de Cultura Económica. Ver también Alsina Clota, J. (1986) Aristóteles, de la filosofía a la ciencia. Barcelona, Ed. Montesinos.
[5] Ereshefsky, M. (ed.) (1992) The Units of Evolution. Massachusset, MIT Pres.
[6] Balme, obra citada, pp. 291-312.
[7] Pellegrin, obra citada.
[8] Marcos, A. (1996) Aristóteles y otros animales. Una lectura filosófica de la Biología aristotélica. Barcelona, Promociones y Publicaciones Universitarias, pp. 44-52. (1998) Invitación a la biología de Aristóteles, Los filósofos y la biología. Themata, nº 20, pp. 25-48.
[9] Marcos, (1996), p. 45.
[10] AP 88a, 5.
[11] Düring, I. (2005) Aristóteles. Méjico, UNAM, p. 165.
[12] AP 72a
[13] Tópicos, 125b 7.
[14] Düring, obra citada, p. 177.
[15] AP, 81b 5.
[16] Boylan, M (1983) Method and practice in Aristotle’s biology. Boston, London, University Press of America.
[17] Obra citada, p. 887.
[18] Jiménez, E. (2000) Introducción a Las Partes de los animales. Madrid, Editorial Gredos, p. 22 y p. 27.
[19] PA 640a-15.
[20] PA 639b-5-10.
[21] HA 491 10. Uma afirmação muito parecida encontramos em PA, I, 5, 645b e seg.
[22] HA, 480a 5-10.
[23] HA, 499b 15-20
[24] HA, 505a
[25] PA, 646a 10.
[26] HA, 501a 10
[27] HA, 501a 14
[28] PA, 661b
[29] PA, 661b 5-10.
[30] PA, 661b 15-25
[31] PA 661b 25-30
[32] PA 661b 30-35 y 662a.
[33] Obra citada, p. 178.
[34] HA 509a 30-35.
[35] HA 509b 5 y 15-20
[36] HA 559a 5
[37] GA, 716a 5-10
[38] GA 716a 25-30
[39] GA 716b 30
[40] GA 717a 30-35.
[41] GA 718b 10-20
[42] GA 719a 15.
[43]GA 733b 25.