02/02/2012

A Face Oculta da Globalização

por Elena Atxaga
 


Desde que o mundo gira, a melhor forma de ocultar o poder é dissimulá-lo. Sem grandes escândalos e com uma estrutura não muito orgânica, ao invés de hierárquica ou piramidal, o poder desliza pelas rachaduras de toda sociedade, com suas cabeças visíveis aos seus líderes midiáticos. A história do grupo Bilderberg e da Comissão Trilateral é a história de dois grupos, aparentemente inofensivos e dedicados ao estudo e ao intercâmbio de opiniões, cujas conclusões, interesses e gostos coincidem surpreendentemente com as tendências políticas do mundo nos últimos cinqüenta anos. Seus líderes já falavam há trinta anos dos benefícios da “globalização” e da “economia globalizada” e até utilizavam a terminologia extremista do “governo mundial”, quando ninguém se dava conta do que já era evidente: a construção de um mundo único em que, acima de toda diferença, não tivessem lugar barreiras nacionais de nenhum tipo.

Como pode um grupo assim influenciar tanto? É evidente que não desde a ação direta sobre os governos, embora o fato de que numerosos presidentes pertençam a estes foros não descarte tal possibilidade. Pois eles fazem uso da chave que abre todas as portas: o prestígio. Um tipo de prestígio que impõe linhas de pensamento nos centros nevrálgicos nos quais se formam os futuros dirigentes do planeta. O sistema de subvenções privadas a universidade é uma boa estratégia para eles e, outra similar, a ajuda a fundações e aos meios de comunicação ou a criação dos mesmos. Portanto, o ato de compartilhar ideias e conquistar o consenso sobre as questões chave pode ter enorme importância na política mundial dependendo de quem alcance ditos acordos. Não é o mesmo que o presidente de Castela-Leão, por exemplo, oponha suas opiniões com as de seus colegas, que em uma reunião de reitores das universidades mais prestigiadas do mundo, três conselheiros de presidentes de países importantes, seis fundações bilionárias e uma dúzia de presidentes de multinacionais, cheguem a uma linha de pensamento básica sobre como devem ir as coisas na política internacional. As reuniões deste tipo de grupo constituem, mais que a desculpa da “necessidade histórica” apresentada por nossos governos, o motor do processo de globalização no planeta.

Se além das ideias e do prestígio existem fabulosas quantidades de dinheiro, então este tipo de reunião necessariamente resultará no poder em estado puro, embora nem mesmo seus membros tomem consciência disso. Tal acontecimento é similar à lei da gravidade, na qual não existe nenhuma ação voluntária por parte de ninguém, mas somente ocorre se são proporcionadas as condições favoráveis.

O coquetel explosivo de fortes ideias, disseminadas desde os centros de maior prestígio no mundo, se constitui em um tremendo poder que permeia os resquícios mais negligenciados pelos governos e pelas estruturas de poder de todos os Estados. Com o tempo, tanto a Trilateral quanto o grupo Bilderberg o terão de sobra, surge uma sutil, porém sólida teia de ideias, de influências, de prestígios, de opiniões e de recursos econômicos, que se apoiam uns nos outros e que os novos governantes ou os que se formam para eles, recebem como algo já dado, como uma série de ideias pré-concebidas que não se pode duvidar. A poderosa teia é também um poderoso filtro que se assegura que os que chegam ao topo não são “outsiders”, ou seja, que não sejam pessoas “de fora”, que não sustentem opiniões marginais contra o que já foi estabelecido.

Tal ação de campo, que se reforça a cada dia, destaca a importância de ideias como fonte e origem do poder e nega o tópico, incentivado por setores da esquerda e até mesmo de extrema direita, de que o processo de globalização nasceu da necessidade econômica para crescer sempre.

Ao invés de algo puramente econômico, a globalização surge como uma tendência cultural, uma visão de mundo conscientemente incentivado por pessoas com nomes e sobrenomes, que mantêm uma concepção subvertida de qual deveria ser a organização do poder e da sociedade. Em suma, está acontecendo em todos os lugares uma polarização de ideias: trabalho contra o domínio, o respeito pelo planeta contra a exploração econômica de seus "recursos", economia popular contra a economia transnacional, os políticos a serviço do povo contra os grupos de pressão, afirmação das identidades dos povos frente à dissolução globalizante.

A conclusão disso tudo é que cada vez mais fica claro que o poder de decisão está onde ninguém quer vê-lo, em todo caso, não onde nos dizem.