por Ernesto Milà
(2010)
O pequeno estudo que dedicamos ao "cosmismo" despertou nossa curiosidade para trabalhar em outro tema pouco estudado, mas que frequentemente surgiu nos bastidores. Referimo-nos à Loja Anael, à qual pertenceram alguns destacados líderes peronistas, e às conexões dessa loja com sua homóloga italiana, a Loja Propaganda 2. Perón foi iniciado por Licio Gelli na Loja P-2, e este contou com o apoio de López Rega e da Loja Anael para estabelecer bases na Argentina. Se a isso acrescentarmos que a Loja Anael já mencionava a Tríplice A em alguns de seus escritos mais de vinte anos antes do início da repressão contra os grupos terroristas argentinos, liderada por López Rega à frente do Ministério do Bem-Estar Social, e que ele soube mexer com a consciência da antiga espiritista que foi Isabel Martínez de Perón, teremos um quadro extremamente rico em nuances ocultistas que permeou os últimos anos de vida do general.
Na medida do possível, tentaremos fornecer a origem das fontes utilizadas para o estudo, que demonstra que, com demasiada frequência, o pior do ocultismo interfere na política, gerando as piores políticas possíveis.
Introdução
Tomamos conhecimento da existência da Loja Anael há mais de 20 anos, através de um de seus membros. Tratava-se de um antigo nacionalista argentino que havia passado primeiro pela febre católica dentro da Guarda Restauradora Nacional, depois pelo Movimento Nacionalista Revolucionário Tacuara, para chegar no final dos anos 60 ao peronismo e integrar-se como líder das 62 organizações que era, na Loja Anael. Depois veio o refluxo e o afastamento, o que facilitou algumas confidências. Ele nos confirmou, por exemplo, que López Rega havia pertencido à Ordem dos Cavaleiros do Fogo, da qual se separou para integrar-se na Loja Anael. Ele nos explicou, por exemplo, que López Rega controlava a vida de Perón através de sua esposa e foi assim que estabeleceu a data exata do retorno de Perón à Argentina três anos antes de acontecer, manipulando tabelas astrológicas.
Conhecemos também um súdito chileno que acabou envolvido em alguns escândalos de corrupção que afetaram o felipismo e que, em sua juventude, havia passado pelo Movimento Humanista liderado por "Silo", o chamado "Messias dos Andes". O "siloísmo" havia se configurado desde o início dos anos 70 como uma "opção de esquerda", humanista e universalista. Essa pessoa nos confirmou que "Silo" (com quem mantinha uma boa amizade) considerava a Loja Anael como seu principal inimigo pessoal e que até temia ser assassinado por seus sicários.
Durante muito tempo, mantivemos as anotações sobre a Loja Anael em pousio, sem dispor de tempo para dedicar-lhe algumas horas. No entanto, uma série de felizes coincidências nos permitiu resgatar as anotações que fizemos há mais de vinte anos, completando-as com alguns testemunhos obtidos nos últimos dias. O resultado são estas páginas que esperamos, na medida do possível, esclareçam a verdadeira natureza de um dos episódios em que o pior do ocultismo se une à pior das práticas políticas.
A "componente egípcia"
Existe um texto perturbador, datado de Buenos Aires em agosto de 1964 e intitulado: Loja Anael - A Razão do 3º Mundo - A Programática Anaelina Perón - Adhemar de Barros. Trata-se de um texto de 70 páginas, escrito com máquina elétrica, provavelmente uma das primeiras IBM "de bolas". Neste documento – de veracidade inquestionável – encontram-se algumas das chaves da política argentina que se desenvolverá nos próximos 10 anos sob a liderança de José López Rega, também conhecido como "El Brujo" e "Lopecito". Nele, aparece pela primeira vez mencionada a "Tríplice A", embora em um contexto muito diferente daquele que teria a partir de 1974. O documento é, em qualquer caso, não apenas uma prova incontestável da existência da Loja Anael, mas também e principalmente o único documento dessa organização em que se faz referência a seus princípios doutrinários. A difusão desta obra foi, na época, muito reservada, e o exemplar que chegou ao conhecimento público (e que foi divulgado em PDF na Internet) provém da biblioteca pessoal do próprio López Rega. O documento, como veremos, pode ser considerado uma espécie de "protocolo" do que poderíamos chamar de "peronismo ocultista". A contracapa está adornada com o símbolo de uma pirâmide egípcia... o que remete às palavras pronunciadas por López Rega no momento exato em que Perón faleceu. Ele, como é sabido (entre outras fontes, veja o documentário de Román Letjman, Lopez Rega, el brujo de Perón, da série argentina Documenta), ao ser informado de que Perón havia acabado de falecer, apressou-se a fazer alguns "passes mágicos" e uma massagem nos pés, enquanto gritava: "Não vá, faraó, volte"...
Por que “Anael”? Nos ambientes maçônicos do final do século XVIII, emergiu a figura enigmática de Giuseppe Balsamo, chamado “Conde de Cagliostro”, fundador da chamada “maçonaria egípcia”. A partir de Cagliostro, a moda “egípcia” se instalou nos meios maçônicos e ocultistas. Ao longo do século XIX, foram configurados dois novos ritos “egípcios” inspirados em Cagliostro: o rito de Memphis e o rito de Misraïm que, mais tarde, com os irmãos Bedarride, deveriam convergir. É importante destacar que a maior parte dos “heterodoxos” maçônicos que tiveram relações com os meios ocultistas, tanto no século XIX quanto no XX, pertenceram a este rito, desde Blavatsky até Robert Ambelain, passando por Licio Gelli, o venerável da loja Propaganda 2. O que podemos chamar de “componente egípcia” foi o que deu legitimidade à Loja Anael. O próprio nome da loja foi extraído do Catecismo da Maçonaria Egípcia redigido pelo próprio Cagliostro, que em sua primeira página diz:
P: A quem se deve dirigir para ser iluminado?
R: Salomão soube de nós que é necessário recorrer aos eleitos superiores que rodeiam o trono do Sublime Arquiteto do universo. Esses seres são os sete Anjos que dirigem os planetas.
Em seguida, explica que o primeiro dos “sete anjos eleitos” é precisamente “Anael, o Sol”. Assim, não temos a menor dúvida de que a Loja Anael era uma das muitas derivações da chamada “maçonaria egípcia”, com a característica específica de ser composta por peronistas e de buscar obter o máximo de influência no entorno de Perón.
Nos dois anos anteriores à publicação da obra “A Razão do 3º Mundo”, López Rega havia publicado duas obras de alto teor ocultista: Alpha e Omega (1962) e um tratado de astrologia esotérica (1963).
Jorge Taiana explica em seu artigo “Anael e o astrólogo” que, em 1966, “no centro de Madrid, foi aberta uma loja de venda de bonecas e outros artigos. O comércio, localizado na rua Quintana 16, era na verdade um local da seita Anael que tinha como objetivo se instalar na Espanha”. Se a seita conseguiu se instalar, certamente não chamou a atenção. Diferente de outras seitas vindas da Argentina (como o “siloísmo”, que irrompeu nos últimos anos sessenta na Espanha), não existem dados em nosso país sobre a atividade da Loja Anael. Mas também é possível que ela simplesmente tenha se limitado a estabelecer uma base na Espanha, apenas para “trabalhar” os meios do exílio peronista e o próprio general exilado em Puerta de Hierro, sem aspirar a fazer adeptos em nosso país.
A Loja Anael, uma estranha estrutura espiritista-ocultista
A Loja, inicialmente implantada no Brasil, havia sido criada em Buenos Aires em 1957 por Julio César Urien, um juiz de paz. Às vezes, Urien foi identificado com “Anael”, mas, como veremos, são duas pessoas distintas. Urien era peronista, e o documento que temos dessa Loja a define como um grupo esotérico que aspirava à liberação do terceiro mundo e que explicava suas posturas anti-imperialistas graças a complexas reflexões ocultistas. Se for verdade o estabelecimento de uma filial da Loja em Madrid em 1966, poderia ser melhor compreendido o irresistível ascenso que teve dentro da cúpula peronista um indivíduo singular, devoto do ocultismo e membro dessa Loja, José López Rega. Essa é a tese do jornalista argentino Jorge Taiana: “A seita Anael considerava que Perón e sua esposa, apesar das visitas de amigos leais e consequentes, viviam em grande solidão e supuseram que poderiam impor ali um de seus membros: José López Rega, alias ‘Daniel’ o ‘Bruxo’”.
Oficialmente, Isabel Martínez de Perón e López Rega se conheceram na viagem que a primeira realizou à República Argentina em 1965, quando detectou a infidelidade do chefe do sindicalismo peronista da época, Augusto Timoteo Vandor. Vandor tinha a veleidade de um peronismo sem Perón, algo intolerável para o general exilado. Isabel Martínez de Perón foi enviada para eliminar as divergências entre a cúpula peronista. Desde sua chegada, foi custodiada pelo tenente-coronel Jorge Manuel Osinde (que mais tarde seria considerado o responsável pelo massacre de Ezeiza no dia em que Perón retornou definitivamente à Argentina). As gestões de “Isabelita” tiveram pouco sucesso, e ela voltou à Espanha em julho de 1966. Osinde acompanhou “Isabelita” em todo momento, junto com um de seus homens, López Rega, que voltou a Madrid com ela, convertido em seu secretário pessoal. Alguns meses depois, passou a residir no luxuoso chalé de Puerta de Hierro. Mais tarde, veremos por que “Isabelita” se sentiu irresistivelmente atraída por López Rega.
Perón não levava López Rega totalmente a sério e frequentemente o tratava com desdém. O general havia conhecido muitos arrivistas, solícitos ao ponto do servilismo, para se impressionar com o polifacetismo daquele a quem chamava de “Lopecito”, que era ao mesmo tempo assistente, motorista, guarda-costas, secretário particular, amanuense, massagista e confidente. Seis anos depois, em 1972, López Rega, de comum acordo com “Isabelita”, havia se tornado uma espécie de filtro que regulava a presença de visitas ao general.
A questão é se, naquele momento, López Rega ainda se considerava membro da Loja Anael e se esta ainda existia. Seja como for, em 1972, López Rega conhece Licio Gelli, o Grão-Mestre da Loja Propaganda 2. Este tinha interesse em ampliar seu raio de ação para a Argentina, especialmente devido aos seus negócios de venda de armamentos. Ele se apresenta a López Rega como líder de uma loja maçônica (a Loja Anael era ocultista, mas não pertencia a nenhuma obediência regular, nem mesmo era considerada como a P-2, uma loja maçônica “selvagem”) com profundas ramificações na administração, nos serviços de inteligência, nas forças armadas e nos diversos partidos italianos. Gelli impressiona López Rega, que sempre sonhou em dispor de uma estrutura semelhante. Pouco depois, ele viajará com Perón a Roma, viagem durante a qual Licio Gelli iniciará Perón na maçonaria e, concretamente, o investirá como membro de sua loja. A partir daí, como veremos mais adiante, as relações de Gelli na Argentina, especialmente seus vínculos com o Almirante Massera, se tornarão muito estreitas, atingindo o clímax em 1977-79. Subsiste a dúvida, naquele momento, se a Loja Anael ainda existia e qual era seu raio de ação.
Os trabalhos de “Anael” e Urien, e especialmente o documento que citamos, "A Razão do Terceiro Mundo", aludem a uma loja criada em 1954 e na qual teriam participado Perón e o então presidente brasileiro Getúlio Vargas, a Loja Anael. O texto difunde, de maneira esotérica, as doutrinas de libertação nacional em voga na época. É um discurso contra o imperialismo americano, uma defesa ferrenha da revolução castrista, do maoísmo e da revolução argelina. No fundo, o documento tem muito a ver com a “terceira posição peronista”, à qual simplesmente se acrescentou uma vertente ocultista, sobre a qual insistiremos mais adiante. Urien explica que a loja foi criada com a permissão de Perón e até sugere que o general fez parte dela. Às vezes, o texto se torna excessivamente messiânico, especialmente quando afirma que Perón voltará à Argentina quando a Loja indicar. O surpreendente é que, de fato, o retorno ocorrerá na data anunciada antecipadamente por López Rega e considerada “astrologicamente” como a mais favorável.
A sensação que Urien transmite é a típica de alguém versado em ocultismo, que provavelmente teve relações com alguma seita da época (poderia ser com a então poderosa Sociedade Teosófica Argentina ou também com a Sociedade dos Cavaleiros do Fogo). O fato é que Urien realizava certas práticas ocultistas: circulava o rumor de que bastava tocar alguém com a ponta dos dedos para perceber a “carga magnética” que essa pessoa transmitia (se isso for verdade, Urien conhecia a doutrina do magnetismo animal elaborada por Franz Anton Mesmer no início do século XIX). Também se conta que ele era capaz de assimilar o conteúdo de um livro simplesmente colocando-o sob a axila.
Em 1963, certamente, Urien e López Rega já se conheciam há muito tempo, prova disso é o aparecimento dos livros que comentamos e o relato de uma reunião da Loja da qual conhecemos os nomes, sobrenomes e o conteúdo das discussões (que não foram poucas). Pouco depois (1965), ocorre a viagem de “Isabelita” à Argentina, o retorno à Espanha com López Rega e o estabelecimento da loja de “apoio” em Madrid. López Rega se identifica imediatamente com as doutrinas de Urien e de “Anael”: ambos têm uma concepção essencialmente pragmática do ocultismo, não se trata de uma concepção baseada em grandes princípios teóricos, mas de uma série de indicativos, deduzidos especialmente da astrologia e muito alinhados com a magia renascentista derivada da leitura do Picatrix e dos outros textos que compõem o Corpus Hermeticum. É possível que Urien, “Anael” e, especialmente López Rega, tivessem acesso a esses textos alexandrinos, redescobertos na Idade Média, diretamente ou através de algum comentarista (possivelmente Santiago Bovisio, como veremos), porque as ideias que Rega inclui nas 775 páginas de seu livro Astrologia Esotérica, subtitulado “Segredos Revelados”, estão muito influenciadas por essa concepção sintética própria da magia renascentista.
Indica-se na página 3 que todos os exemplares estão numerados e assinados pelo autor. Na página 17, López Rega inclui duas frases que situam sua obra: alude à “palavra perdida” (um conceito tipicamente maçônico) e aos “alvores da nova Era de Aquário” (era astrológica que substituiria a de Peixes, um tema recorrente no ocultismo). A leitura da introdução não deixa dúvidas sobre a intenção de criar uma espécie de “maçonaria peronista”, ou seja, um grupo de influência oculta que permitiria o advento de um novo ciclo histórico. Diz López Rega: “Eu confio nos POVOS e nos SERES HUMILDES como depositários da FORÇA DAS RAÇAS em seu próprio sangue; e é a eles que entrego a custódia deste trabalho com o objetivo de que, no futuro não muito distante, possamos, em esforço comum, ampliar o CONHECIMENTO, vivendo uma etapa de maior felicidade e compreensão entre aqueles que presumimos ser realizados à imagem e semelhança de DEUS!”. Respeitamos as maiúsculas com as quais Rega enfatiza os conceitos que para ele têm maior interesse. Em seguida, ele indica, confirmando que conhece a “magia natural” renascentista, o sentido de seu LIVRO (que também coloca em maiúsculas…) “… que no início da NOVA ERA se inicia como precursor de um estilo diferente de literatura a ser colocado na órbita das verdades da NATUREZA; aos herdeiros da ÉPOCA PISCIANA que abrem seus olhos para a ERA DE AQUÁRIO sob a UNIDADE com o NOVO CRISTO CÓSMICO!”. Em seguida, todo o livro é composto por tabelas que indicam, para cada hora e para cada signo, quais cores devem ser usadas, quais flores e aromas são os mais adequados, quais notas musicais, etc. Pode surpreender os não versados em ocultismo e magia, mas são tabelas e temas muito utilizados desde o Renascimento pelos adeptos da “magia natural” (que contam com nomes tão ilustres como Giordano Bruno, Pico della Mirandola, Marsilio Ficino, etc.). As últimas 300 páginas do livro constituem um sistema para levantar horóscopos e interpretá-los e, nesse sentido, esta obra não é nem melhor nem pior que qualquer outra similar, demonstrando, em todo caso, que López Rega e os membros da Loja Anael estavam familiarizados com todos esses temas.
A importância de “Astrologia Esotérica” reside no fato de ser o manual de astrologia da Loja Anael. Trata-se de um livro técnico de leitura árdua. Mas há outro livro que constitui uma espécie de “manifesto” da Loja e do próprio López Rega. “Alpha e Omega” tem como data de edição 1963. É subtitulado “Romance iniciático” e “Uma mensagem à Humanidade”. Também aqui se indica que os exemplares estão numerados e assinados pelo autor. Na verdade, não se trata de um dos romances ocultistas habituais, com um enredo que serve como desculpa para veicular ideias morais ou abordagens teóricas. É propriamente um manifesto composto por 12 capítulos mais uma conclusão intitulada “Omega”. O surpreendente é que encontramos nas 233 páginas da obra ideias que poderiam muito bem ter sido extraídas do patrimônio dos cosmistas russos, dos cosmistas ocidentais como Max Théon ou do próprio Teilhard de Chardin. É certo que naqueles anos (início dos anos 60), a obra de Teilhard gozava de seu momento de máxima difusão e que López Rega parece interpretar a ideia do “ponto Omega” e da evolução da humanidade para o “Cristo Cósmico” de uma maneira muito sui generis, mas não excessivamente distante de Teilhard. Ele escreve, por exemplo: “VOCÊ É DEUS! TUDO É UNIDADE E TUDO É DEUS MANIFESTADO! Estude, querido amigo, com atenção, a transição que você realizou em busca de um OMEGA ou final para este trabalho, e certamente se surpreenderá ao descobrir que o que você já viveu se apresenta com uma nova roupagem! Continua sendo sempre o mesmo na ESSÊNCIA, mas muda na FORMA de interpretação!”. As ideias de “unidade”, inter-relação entre as partes que compõem a unidade e a evolução de todo o cosmos para formas cada vez mais perfeitas (“crísticas”) são as dominantes deste “manifesto”.
A terceira obra (impressa na mesma oficina que as outras duas) é a de “Anael” corrigida e ampliada por Urien, “A Razão do Terceiro Mundo”, com data de impressão de 1964. Na dedicatória da obra pode-se ler: “Dedicamos este trabalho aos homens novos, com visão de futuro, que são os chamados a engrandecer o Universo”. O espírito é o mesmo que nas duas obras de López Rega, e a ideia básica é que a evolução do cosmos gera um tempo novo que iluminará um “homem novo”… que se identifica explicitamente com o peronismo.
Nas primeiras páginas da obra, são fornecidos alguns dados sobre a história da Loja Anael. Diz-se, por exemplo, que “no ano de 1956, em São Paulo, Brasil, reuniu-se a Loja ANAEL. Participaram dessa reunião todos os delegados continentais da América Latina e dois delegados afro-asiáticos, que se limitaram a ouvir. Nessa reunião, foram traçadas as linhas gerais da programática ANELINA, calculando-se o início de sua materialização para a década de 1960-70”. Sobre os membros da Loja, aponta-se apenas: “Só diremos que a integram o doutor Anael e um grupo de homens profundamente conhecedores dos problemas sociais, políticos, econômicos do nosso tempo e de tempos passados, e muitos outros, que sem serem cabeça, constituem as diferentes partes de seu organismo. Somos homens novos que nos renovamos sempre. Ou seja, somos contemporâneos do futuro”. E quanto ao “projeto”, aponta: “Precisamos de uma Nova sociedade dirigida pelo humanismo e pela razão. Por isso, nos colocamos em marcha juntamente com as massas humanas de todas as cores. A alma do mundo subdesenvolvido desperta para uma nova civilização! A Comunidade Cooperativista! Os fundamentos da Civilização atual, capitalista-imperialista, estão corrompidos e gastos. Começam épocas novas”. Isso leva à consideração sobre o papel do documento em questão: ANAEL elaborou uma programática: “A divulgamos porque entendemos que os acontecimentos presentes e próximos o aconselham. Razões táticas em função da estratégia. Mas, como os icebergs, só mostramos uma parte. O resto, a massa mais volumosa, permanece submersa. Portanto, este trabalho deve ser pensado, analisado, para deduzir e definir”.
A loja reuniu-se em 2 de dezembro de 1956 e em março de 1957, em São Paulo e Rio de Janeiro, respectivamente. No curso dessas reuniões, traçaram uma estratégia continental que tinha no Brasil e na Argentina seus eixos regionais na “América Latina”. Viam nos regimes de Perón na Argentina e de Getúlio Vargas no Brasil sintomas da “nova era” (ambos não haviam enfatizado a ajuda aos “descamisados” e aos “deserdados”, isto é, à “humanidade”, leit-motiv da Era de Aquário?). Depois, apoiaram no Brasil a figura de Adhemar de Barros e previram o retorno de Perón, expulso após a chamada “revolução libertadora” de 1956. Sobre as reuniões de 1956 e 1957, sabe-se apenas isso. Não existem mais fontes documentais. No entanto, na referida obra, alude-se a uma nova reunião que deveria ocorrer em 14 de julho de 1964 em Buenos Aires. O seguinte parágrafo resume o conteúdo global do resto do documento e, novamente, de forma surpreendente, remete às ideias fundamentais do cosmismo russo: “A história humana – diz-se em A Razão do Terceiro Mundo – é um processo semelhante ao processo cósmico. Ambos são regidos pela lei da evolução. Se há um dinamismo de mundos, também há um dinamismo de nações e povos. E os povos querem e precisam de mudança. Querem uma nova esperança. Estão cansados de viver em uma sociedade reacionária, técnica, mas anti-humana e anticientífica. Portanto, é histórico pensar que, se os povos desejam a mudança, a mudança surgirá através de doutrinas revolucionárias e científicas, sendo inevitável a reagrupação de forças. As nações reacionárias lutarão para impedir a ascensão dos países subdesenvolvidos. E dentro de cada nação, a riqueza se oporá a que desapareça a pobreza”.
A Loja Anael configura-se, portanto, como um centro anti-imperialista e anti-oligárquico, que prepara o advento de um tempo novo e que, portanto, ao favorecer a liberação dos povos e a eliminação da pobreza, abre as portas para a “era da humanidade”, a era de Aquário. As ideias também coincidem exatamente com as posições do peronismo da época, ao qual pertencem todos os membros conhecidos da Loja.
López Rega é, nesse momento, funcionário público na gráfica do Estado. Lá é possível que tenham sido impressos os três “manifestos” da Loja Anael. As obras de López Rega constam como publicadas pela editora “Rosa de Livros”, mas carecem de pé de impressão, por isso é de se supor que ele “desviava” resmas e horas de trabalho dos pedidos oficiais para imprimir o que realmente lhe interessava. Além disso, os escritórios dos Suprimentos Gráficos do Estado são usados naquela época para realizar reuniões da Loja Anael. Consta o ocorrido em uma dessas reuniões através do testemunho de Bernardo Alberte.
Como em qualquer loja maçônica, na entrada da mesma e no dia da reunião, posicionava-se um dos dignitários da loja pedindo a senha. Nesse caso, o encarregado é José Vanni, funcionário da gráfica e certamente um dos homens de confiança de Rega. A convocação partiu de Urien, que oficia como Grão-Mestre. Nem todos os presentes se conhecem. A reunião ocorre justamente quando se inicia a visita de “Isabelita” à Argentina.
Assiste uma vintena de membros. A vida de alguns se separará dramaticamente do resto nos anos vindouros. De fato, também a orientação da Loja variará conforme mudarem as expectativas e os interesses de López Rega. Um dos presentes na reunião, por exemplo, é Julio Troxler. Ele havia sobrevivido aos fuzilamentos que se seguiram à tentativa golpista do general Valle em 1956, que buscava acelerar o retorno de Perón, exilado pela Revolução Libertadora de Leonardi, o almirante Isaac Rojas e o general Aramburu. Levado com outra vintena de detidos aos lixões de José León Suárez, milagrosamente conseguiu escapar, assumindo, após o retorno de Perón, o cargo de Chefe de Polícia de Buenos Aires, até que, após o atentado a um quartel militar, foi destituído pelo próprio general. O Coronel Arturo Gay e sua esposa foram executados, e o Coronel Ibarzábal, assassinado. Eduardo Zamorano, em seu livro: “Peronistas revolucionários”, revelou que Troxler ministrava treinamento militar aos Montoneros. Naquela época, os Montoneros começaram “a oferecer instrução militar massiva a todos os seus quadros. Isso se estendeu até mesmo aos ‘aspirantes’. Nos grupos políticos, a formação militar incluía o ‘ordem fechado’ e a organização em pelotões de cinco pessoas. O manual militar tinha como guia a instrução que recebiam as tropas de infantaria das forças armadas regulares, incorporando elementos de acordo com a especificidade da situação. Os acampamentos e as atividades desenvolvidas neles, embora buscassem certa discrição, não eram clandestinos; na província de Buenos Aires, o Sub-Chefe da Polícia – Troxler – conhecia e facilitava esses empreendimentos”. Pouco depois, em plena rua, um Peugeot 504 preto o sequestrou. Em seguida, apareceu metralhado com as mãos amarradas às costas. Um comunicado emitido pela Tríplice A dizia: "A lista continua. Morreu Troxler e o próximo, para rimar, será Sandler". Troxler mantinha as mesmas posições anti-imperialistas anunciadas dez anos antes no documento “A Razão do Terceiro Mundo”. Rega, por outro lado, não.
Também estiveram presentes na reunião da Loja o capitão Jorge Morgantini, López Rega e sua filha Norma, o suboficial Héctor Sampayo, Rubén Sosa, Bernardo Alberte, um suboficial reformado (um tal Munarriz), Urien e, já adiantada a reunião, incorporou-se a própria “Isabelita”, cuja presença é a prova inequívoca de que o grupo ocultista já desfrutava, naquele momento, de influência no entorno de Perón. Antes da incorporação de “a senhora”, Urien pede aos presentes um juramento de lealdade, mas Rubén Sosa discorda. Depois, conversará com Bernardo Alberte e mais tarde deixará a reunião acompanhado por Troxler. Alberte, por sua vez, também terá um destino trágico. Seu filho foi uma das fontes de informação sobre a Loja Anael.
Alberte havia sido preso quando Perón foi detido em 1945, e ele era apenas um subtenente recém-saído da academia. Em 1954, Perón recompensou essa fidelidade nomeando-o seu ajudante-de-campo. Resistiu aos bombardeios da Casa Rosada em junho de 1955 e foi partidário de resistir até o fim à Revolução Libertadora. Foi preso até 1956 e depois se exilou no Brasil. Em 1958, retornou ao país. Durante a viagem de “Isabelita” à Argentina em 1965, a casa de Alberte seria sua residência, e lá ela receberia muitos líderes do movimento. Perón, no início de 1967, o nomeia Secretário Geral do Movimento Justicialista, demonstrando sua eficácia, especialmente na reorganização do sindicalismo com a criação da CGT dos Argentinos, à qual deu um tom radical e esquerdista, e a partir desse momento seu nome se identifica com as posições mais esquerdistas do movimento: primeiro com John Willian Cooke e depois com as Forças Armadas Peronistas após os incidentes de Taco Ralo em 1968, e mais tarde com as Forças Armadas Revolucionárias em 1971. Quando Perón retornou, Alberte não ocupou nenhum cargo oficial, mas assumiu a liderança da Corrente Peronista 26 de Julho, acompanhado, entre outros, por Susana Valle, denunciando o golpismo… na figura de López Rega. Poucos dias antes do golpe militar de 1976, houve uma tentativa de sequestrar Alberte que fracassou. Poucas horas após o levante do general Videla, a residência de Alberte foi invadida por militares, e ele foi jogado ao vazio. É considerado “a primeira vítima” do golpe de 1976.
A importância de Alberte reside no fato de que foi ele quem apresentou López Rega a “Isabelita”. Seu filho explica: “Um dia ligaram os ‘comandos civis’ ou algo assim, dizendo que iam invadir a casa e que era preciso tirar Isabelita de lá de qualquer jeito. Papai sugeriu que descessem com uma corda pelo muro dos fundos (que tinha uns doze metros de altura) e fugissem pelos trilhos do trem. Isabel olhava para ele como quem diz ‘esse cara está louco’. E o plano de fuga foi mudado. Isabel foi tirada de lá com uma jogada de novela: minha irmã colocou uma peruca loira e saiu pela porta com toda a escolta. E todos os policiais e jornalistas foram atrás dela, permitindo que, pouco depois, Isabel desaparecesse sem chamar atenção. E foi nesses dias, de fato, que o Bruxo López Rega apareceu em casa. Ele tinha então uma gráfica, Suministros Gráficos, e fazia trabalhos para o movimento”. E continua: “A questão é que um dia cheguei da escola e encontrei um cara bastante excêntrico sentado na sala, que me fez perguntas estranhas, de maluco. E era, claro, López Rega. Que conheceu Isabel em minha casa e, a partir daquele momento, grudou nela para sempre, com as consequências que todos conhecemos”.
E como Rega se relacionou com o grupo? Aparentemente, foi através de Jorge Morganti. A todos, exceto a Urien e seu círculo, chamou a atenção seus conhecimentos de ocultismo e magia prática, e nem todos o receberam bem. A rejeição que Troxler sentiu desde o primeiro momento foi instintiva. Além disso, Rega ofereceu a Alberte imprimir panfletos e cartazes gratuitamente na gráfica que controlava, uma oferta valiosa naqueles momentos em que se realizariam eleições para governador em Jujuy e Mendoza. Quando Rega pede a Alberte “conhecer a senhora”, ele não tem escolha senão aceitar de bom grado. A partir daquele momento, “Isabelita” ficará literalmente “capturada” pelo Bruxo. Antes de partir, “a senhora” estabelecerá uma nova direção nacional do peronismo, que contará com um representante da Loja Anael, Héctor Sampayo. E “Isabelita” faz algo mais: transmite que Perón precisa de um colaborador da Loja que se instale em Madri. É possível que a ideia tenha partido da própria Isabelita. O certo é que, ao se reunir novamente com representantes da Loja na casa de Alberte, eles propõem Morganti, mas sua esposa não está disposta a se mudar para Madri. Então Urien propõe Munárriz, o suboficial reformado. Mas quando “a senhora” chega e conhece a decisão, recusa a nomeação e indica que “prefere Daniel”. “Daniel” é López Rega.
Até aquele momento, Rega havia permanecido em silêncio na reunião (certamente havia “trabalhado” “Isabelita” em reuniões anteriores), e aceita. Urien, certamente, fica contrariado. Junto a Alberte, Morganti e Sampayo, decidem que lhe ordenarão retornar três meses depois e tentam transmitir a ordem… mas López Rega nunca comparecerá à reunião e desaparecerá completamente das reuniões da Loja Anael. Esta, apenas terá servido como meio para introduzi-lo no topo do peronismo e instalá-lo em Puerta de Hierro. A partir daquele momento, Rega pode agir sozinho. E sua ideia é completamente diferente da de Urien, que continua a dar importância ao sentimento anti-imperialista da Loja, na linha do primeiro Perón expulso pela Revolução Libertadora. Rega não poderá evitar, antes de embarcar no avião que o levará a Madri junto com “Isabelita”, a bronca que Bernardo Alberte lhe deu no próprio aeroporto e que, sem dúvida, será um dos motivos que lhe custará a vida dez anos depois.
O verdadeiro rosto de "Anael": Menotti Carnicelli
Vale a pena perguntar como foi possível que Rega conseguisse se aproximar desses círculos. Em 1946, López Rega era um desempregado que não tinha muito claro para onde direcionar sua vida. Entrou na polícia federal, servindo em diversos centros oficiais, entre outros na residência presidencial. Parece que – pelo menos existe a foto – em uma ocasião, faltou um dos guardas presidenciais e ordenaram a López Rega que subisse no estribo do veículo de Perón para completar o serviço de segurança. Esse foi o primeiro “contato” entre ambos. A partir dessa proximidade, ele percebe “algo” em Perón que o atrai e que vincula intimamente sua vida à do presidente, que se tornará uma verdadeira obsessão. Antes de entrar na polícia, havia sido um cantor de ópera clássica frustrado, autor de textos e previsões astrológicas inspiradas em leituras ocultistas muito comuns na época. Apesar de não haver dados conclusivos a esse respeito, é possível intuir que López Rega “passou” por diferentes escolas esotéricas. Em suas obras, há elementos que remetem ao teosofismo e especialmente à Ordem dos Cavaleiros do Fogo (à qual nos referiremos mais adiante). De qualquer forma, a leitura de seus textos indica claramente que ele mergulhou literalmente nesse tipo de literatura desde muito jovem e de maneira autodidata, embora com uma marcada tendência ao espiritismo. Isso facilitou as coisas para ele.
De fato, o elemento de sintonia que ele soube explorar ao conhecer “Isabelita” foi precisamente esse espiritismo que ela havia literalmente absorvido na infância, quando seus pais se dedicavam a esse tipo de práticas que sempre a interessaram. Depois, a vida a chamou por outros caminhos, mas sempre existiu nela um fundo espírita latente que reviveu ao conhecer Rega. Por outro lado, o fundador da Loja Anael era um conhecido espírita brasileiro, a ele se devia a redação do documento intitulado A Razão do Terceiro Mundo, que Urien se limitou a retocar levemente e ampliar. De fato, “Anael” era o médium brasileiro, bem conhecido na Argentina, Menotti Carnicelli.
Horacio Verbitsky, em seu livro sobre o massacre de Ezeiza (Editorial Contrapunto, Tucumán, 1985, Coleção Memória e Presente), faz uma descrição do casal Rega-Isabelita: “Em 1955, ele cantava boleros. Ela tocava piano e dançava. José López tinha 39 anos, María Martínez 24. Eles se veriam pela primeira vez apenas onze anos depois. Juan D. Perón, de 59 anos, começava seu longo exílio. Passou alguns meses no Paraguai e seguiu para o Panamá. Lá conheceu Martínez, que abandonou sua companhia em turnê e ficou com ele como secretária. Depois se casaram, na Espanha. Antes desse encontro, só há lembranças anódinas de província: seu nascimento em La Rioja, filha de um alto funcionário de um banco oficial, suas boas notas na escola primária, seus estudos de música, teatro e dança (…). [quanto a López Rega] Sua biografia não era menos desbotada. Filho de um imigrante espanhol, jogou futebol, cantou nos bailes de um clube do bairro de Saavedra, trabalhou como operário em uma fábrica têxtil, foi cabo da polícia, militou em um comitê radical, casou-se, teve uma filha. Os dois haviam seguido linhas semelhantes de fuga para regiões fantásticas, ela em um templo espírita de Mataderos, ele por meio da magia branca de Umbanda e da loja Anael”.
Verbitsky lembra que Perón havia conhecido pessoalmente o chefe da loja Anael, o brasileiro Menotti Carnicelli, e seu representante argentino Héctor Caviglia, quando em 1950 solicitaram seu apoio para recolocar Getúlio Vargas no governo. A partir daí, explica-se o conteúdo do opúsculo da Loja Anael, A Razão do Terceiro Mundo. No entanto, as relações parecem ser mais amplas do que Verbitsky suspeitava. Na obra de Alejandro Parra, História da Parapsicologia na Argentina (Buenos Aires 1990), diz-se: “Mas este comentário ficaria incompleto se omitíssemos referências a acontecimentos que na época evidenciaram um interesse contagiante pelo misterioso ou desconhecido em todos os níveis sociais, e que em alguns casos foram vividos com beneplácito por alguns setores e em outros com resultados inegáveis, como ocorreu com a chegada do médium Menotti Carnicelli, e do controverso Pastor Teodoro Hicks, ambos recebidos na Casa de Governo, caracterizando-se este último por suas constantes proclamações de cura em nome da divindade no lotado estádio esportivo de Atlanta em 1954 e maio de 1955.”. Não foi em uma ocasião, mas em várias que “Anael”, Menotti Carnicelli, se entrevistou com Perón.
É fácil, portanto, intuir o que aconteceu: Perón considerava Carnicelli um homem influente no Brasil e, ao mesmo tempo, teve a sensação de que a Loja Anael estava muito difundida nas fileiras do Partido Justicialista. Isso era relativamente verdadeiro. Embora alguns grandes nomes do justicialismo pareçam indubitavelmente vinculados às atividades da Loja, é difícil dizer a influência efetiva que possuíam sobre o conjunto do movimento. Não parece que fosse excessiva. O grupo, aliás, apesar do nome, não é, na realidade, uma loja maçônica, mas um grupo ocultista. Se teve rituais – além do juramento – não há registro deles. Além disso, o que se sabe de Menotti Carnicelli nos dá dele a descrição de um médium espírita, militante nesses círculos brasileiros. O espiritismo nunca teve rituais particularmente densos. Nesses círculos, a formação ocultista de Rega é bem apreciada por alguns membros. Seus favores ao peronismo desde a gráfica estatal que dirige naqueles momentos o reforçam nesse círculo, e é assim que ele pode conhecer Isabelita para sonhar em se aproximar do “faraó”, o general exilado na Espanha. A partir desse momento, Rega começa a agir por conta própria e, nos últimos anos da década de 60, os nomes ilustres da Loja se inclinam majoritariamente para o peronismo de esquerda. Isso os separa progressivamente de López Rega, que, a partir de 1966, literalmente manipula “Isabelita” a seu bel-prazer, utilizando os recursos de velho bruxo ocultista e espírita que ressoam com as lembranças da infância e o ambiente paterno de “a senhora”. À medida que o general envelhece, o cerco “Isabelita”-“Lopecito” se fecha cada vez mais sobre o general, cada vez mais dependente do casal de espíritas convictos. Pouco depois, quando Héctor Cámpora vence as eleições de 1973, Rega será nomeado Ministro do Bem-Estar Social, cargo a partir do qual, organizando o massacre de Ezeiza justo no momento em que Perón retornava à Argentina (ignora-se o número de mortos, mas supõe-se que deve ter sido entre 300 e 500), ele desgasta até o desmonte o governo Cámpora, que convoca novas eleições com a opção Perón-Isabelita. Quando Perón vence, é apenas uma sombra do que foi: envelhecido e doente, será Isabelita quem governará… e ela, por sua vez, será dirigida por López Rega. Quase imediatamente, aparecerá a Tríplice A, que eliminará, entre outros, antigos membros da Loja Anael. O próprio Urien passará na prisão até o final da ditadura militar. O nome Tríplice A respondia às sugestões ocultistas de Carnicelli e Urien. Vejam por quê.