30/12/2020

Nicolas Gauthier - Entrevista com Alain de Benoist: Mesmo na Idade Média o Confinamento dos Sadios Nunca Acabou com Qualquer Pandemia

 por Nicolas Gauthier e Alain de Benoist

(2020)


Agora que as coisas parecem estar em vias de apaziguamento, podemos dizer que o governo, mesmo tendo obviamente sido pego com as calas nas mãos, fez em excesso ou não fez o suficiente diante da epidemia, ou fez apenas o que podia?

Não há outra palavra para isso: a resposta do governo ao Covid-19 foi verdadeiramente calamitosa. Cinco meses após a epidemia, ainda não atingimos a capacidade de triagem que deveríamos ter tido quando ocorreram as primeiras mortes. O governo primeiro se refugiou na negação (não chegará nós, é uma gripezinha), após o que assistimos a um desfile interminável de confusões, de instruções contraditórias e mentiras de Estado. Nada havia sido previsto, apesar de muitas vozes terem se levantado nos últimos anos para prever uma nova pandemia vinda da Ásia. A causa principal está na incapacidade dos poderes públicos de pensar além do curto prazo. Mas a causa mais fundamental é que, para se conformar às regras da ideologia liberal, o setor de saúde pública tem sido submetido aos princípios de rentabilidade, da concorrência e da gestão just-in-time, o que tem levado ao fechamento de milhares de leitos, à destruição dos estoques de reserva e à crescente precarização do pessoal já mal pago. Em outras palavras, integramos ao sistema de mercado uma área que, por definição, está fora do mercado. O resultado tem sido um colapso generalizado da capacidade hospitalar pública.

25/12/2020

Julius Evola - Natalis Invicti

por Julius Evola

(1933)


É sempre interessante trazer à tona o significado primordial mantido em símbolos e tradições que se tornaram ao longo do tempo costumes quase sempre ignaros de suas raízes originais. É o caso, por exemplo, das duas grandes festas desses dias, o Natal e o início do Ano Novo. Muito poucos suspeitam que com a celebração desses festivais significativos hoje, em meio ao século das multidões cosmopolitas, dos arranha-céus, do rádio, se continua uma tradição que pode muito bem ser chamada de primordial e cósmica, uma vez que seus traços nos levam de volta aos mesmos tempos que viram a aurora da humanidade e nela se refletia não tanto uma crença dos homens, quanto a grande voz das coisas mesmas.

Antes de tudo, deve-se notar que originalmente o Natal e o Ano Novo coincidiam: em todo um ciclo de civilizações antigas, o início do ano novo caía no solstício de inverno, que tem precisamente a data do Natal: 25 de dezembro. Tal data em Roma era uma data solar: era a da ressurreição do Deus Sol Invictus: Natalis Solis Invicti. Com ele, enquanto dia do "Sol novo" - Sol Novus - começava na era imperial o novo ciclo anual. Mas o Natal solar romano, por sua vez, remete a uma tradição muito mais antiga. Afinal, Sol, o sol, já aparecia entre os dii indigetes, ou seja, entre as divindades das origens, que vieram aos romanos de uma antiguidade anterior e misteriosa.

23/12/2020

Aleksandr Dugin - Introdução à Noomaquia (Lição VI) - A Civilização Européia

ÍNDICE

Lição I: Noologia
Lição II: Geosofia
Lição III: O Logos da Civilização Indo-Europeia
Lição IV: O Logos de Cibele
Lição V: O Logos de Dioniso
Lição VI: A Civilização Européia


por Aleksandr Dugin

(2018)


Vamos agora deixar de lado as outras sociedades indo-europeias, para nos concentrarmos na análise da história e cultura europeias. Agora está claro que a civilização européia se baseia na superposição de dois horizontes existenciais e na existência de um centro com o problema de Dioniso e sua interpretação. A história européia é caracterizada por uma Titanomaquia contínua ou Noomaquia, e a condição básica dessa Titanomaquia é a descida da cultura indo-europeia turânica no campo da civilização da Grande Mãe. Na lição anterior [1], também identificamos Dioniso como o principal problema desta civilização, representando o próprio terreno do confronto em que essa titanomaquia se desenvolve.


O Urheimat dos Bálcãs


Para iniciar a análise noológica da civilização européia, é aconselhável partir de um de seus principais pólos, constituindo o verdadeiro Urheimat das tradições agrícolas europeias, que é o Leste Europeu, erroneamente considerado periférico.

O primeiro povo indo-europeu a emergir historicamente foi o trácio. Os trácios desceram aos Bálcãs antes dos eslavos, por volta de 1200 a.C, estabelecendo uma espécie de império tribal, inicialmente nos Bálcãs do norte, para então ocupar aproximadamente a grande área da Europa Oriental. O que é importante notar é que os territórios nos quais a civilização trácia se expandiu eram os centros ou pólos da civilização da Grande Mãe – Lepenski Vir,  a cultura de Vinča, a cultura Karanavo-Gumelnita e a cultura de Cucuteni-Tripiliana, etc. – que passaram a constituir o substrato do horizonte existencial trácio. Aliás, não podemos dizer com certeza que os trácios foram os primeiros povos indo-europeus a aparecer nesses territórios, mas eles são os mais antigos dos quais temos conhecimento.

15/12/2020

Dwight Longenecker - “A Terra Desolada” de T.S. Eliot e a Pandemia do Coronavírus

por Dwight Longenecker

(2020)


Escrito há cem anos, o amargo poema de T.S.Eliot A Terra Desolada poderia ter sido escrito nesta primavera. Abril de 2020 foi certamente o mês mais cruel. O coronavírus era real. As cabeças estavam fora da areia, e as negações ecoavam vazias na boca dos homens que as fizeram.

A história pode não ter se repetido, mas com certeza estava rimando. Em 1918 a humanidade estava apenas cambaleando para fora dos horrores de uma guerra mundial, quando foi atingida pela gripe espanhola. Em 1920, 500 milhões de pessoas haviam sido infectadas e 50 milhões morreram. Mais soldados norte-americanos pereceram devido à gripe do que foram mortos na guerra.

Publicado em 1922, o retrato sombrio de Eliot da Europa pós-guerra e pós-pandemia possui tom apocalíptico. Sua obra-prima pessimista foi saudada como o hino de uma geração desiludida. O poema, como a sociedade que ele refletia, era “um amontoado de imagens quebradas”. Fragmentos visionários em italiano, latim, alemão e francês tombavam como um caleidoscópio quebrado com gírias americanas, vozes cockney e poetas ingleses. Alusões ao mito grego, a Wagner, a Dante, a canções pop e a recortes dos jornais de ontem se confundiam em uma mistura desconcertante de miséria.

10/12/2020

Claudio Mutti - Estranhas Reconciliações e Antifascisteria

 por Claudio Mutti

(2004)



"O século 20 não vai acabar sem testemunhar estranhas reconciliações". - Pierre Drieu La Rochelle


No dia 27 de dezembro de 1942, enquanto em Stalingrado se desenrola a batalha que marcará o início da derrota do Eixo, Drieu La Rochelle observa em seu Diário: "Morrerei de alegria selvagem com a ideia de que Stálin será o mestre do mundo. Um mestre, finalmente. É bom que os homens tenham um mestre que os faça sentir a feroz onipotência de Deus, a voz inexorável da lei”.

Um mês depois, em 24 de fevereiro de 1943, Drieu esperava: "Ah, que todos esses burgueses morram também, eles merecem. Stálin vai lhes cortar a garganta, e depois deles a garganta dos judeus...talvez. Uma vez eliminados os fascistas, os democratas ficarão sozinhos diante dos comunistas: estou antecipando a ideia desse tête-à-tête. Exultarei na tumba."

Em 3 de março, ele esperava a vitória dos russos, e não a dos americanos: "Os russos têm uma forma, enquanto os americanos não a têm. Eles são uma raça, um povo; os americanos são um acólito de híbridos".

06/12/2020

Aleksandr Dugin - Introdução à Noomaquia (Lição V) - O Logos de Dioniso

ÍNDICE

Lição I: Noologia
Lição II: Geosofia
Lição III: O Logos da Civilização Indo-Europeia
Lição IV: O Logos de Cibele
Lição V: O Logos de Dioniso
Lição VI: A Civilização Européia


por Aleksandr Dugin

(2018)




Na lição anterior [1] identificamos e analisamos um momento muito importante na história da Europa [2], que define a estrutura principal do modelo de Noomaquia europeu. A estrutura do momento de Noomaquia é a chave para entender nosso ser histórico, para entender quem somos. Vimos como a chave para interpretar a história européia em sua dimensão ontológica e existencial consiste em seguir e observar como o processo de interação conflituosa de dois horizontes existenciais opostos se desenvolve em períodos diferentes. Também observamos que esse conflito se baseia na reinterpretação mútua das mesmas estruturas simbólicas, mitológicas e religiosas de duas perspectivas opostas – nisto se manifesta precisamente a Noomaquia no seu sentido mais autêntico, que é como um conflito semântico. O Logos de Cibele procura reinterpretar as mesmas figuras ou impor suas próprias no contexto da mistura cultural resultante da sobreposição dos dois Logoi apolíneo e cibelino.


O Reino de Dioniso


O “campo de batalha” dos dois espaços existenciais – paleo-europeu e turânico – cria um novo tipo de estrutura, um ponto de encontro, uma terceira estrutura para sermos precisos. No sentido mais autêntico, o Logos de Apolo é representado pela sociedade nômade turaniana; Da mesma forma, o Logos de Cibele, na sua forma mais pura, é representado pela sociedade agrícola, sedentária e matriarcal da “Velha Europa”. Mas, a partir do encontro desses dois espaços existenciais, cria-se uma nova dimensão, que constitui precisamente o campo de Dioniso, onde o conceito patriarcal do homem desce às profundezas da matéria. O que pertence ao céu desce à terra e alcança o centro da terra. Dioniso torna-se assim senhor do Inferno como Zagreus.