05/03/2020

Israel Lira - Arqueofuturismo: Um Dinamismo Vitalista

por Israel Lira

(2019)



“...as formas políticas e sociais da modernidade se fragilizam; as formas arcaicas ressurgem em todos os domínios, o renascimento de um Islã conquistador, é um exemplo perfeito. Por fim, as alterações futuras da tecnociência – principalmente na genética – assim como o retorno trágico à realidade que o século XXI prepara, exigirão o retorno a uma mentalidade arcaica. É o modernismo que é um passadismo. Não se tem que voltar ao ‘tradicionalismo’ clássico, impregnado de folclorismo e sonhador de um retorno ao passado. A modernidade já está obsoleta. O futuro tem que ser ‘arcaico’, ou seja, nem moderno, nem passadista” (Faye, 1998:15)

Após a citação de Faye fica muito claro que este sempre foi diáfano no estabelecimento dos princípios consubstanciais de seu sistema teórico, para evitar com isso, precisamente, que este pudesse se confundir com outras teorias que também tem dentro de suas considerações a tecnociência. No caso particular de Faye, a aproximação universal de sua proposição se entende sob a categoria de construtivismo vitalista[1], enquanto que sua conceituação específica sob a forma do neologismo arqueofuturismo[2]. Esta nova doutrina influenciou diversas correntes teóricas até hoje[3], dentro do marco de propostas antiglobalistas, anti-individualistas e antiliberais, frente a um mundo pós-moderno que se apresenta a nós sob a narrativa do niilismo cultural, cujas principais expressões fenomênicas as temos no secularismo niilista, na globalização neoliberal, no narcisismo hiperindividualista e no relativismo cultural extremo[4].


A Tricotomia Central do Arqueofuturismo (TCAf)

O arqueofuturismo tem três teses principais que devem ser ressaltadas, na medida em que a partir destas se pode deduzir seu mais absoluto rechaço a posturas tecnofóbicas (tradicionalismo e conservadorismo clássicos) e tecnofílicas acríticas (tecnicismo e transumanismo):

Primeira tese (T1): A civilização contemporânea que é filha da modernidade e do igualitarismo já está fechando seu ciclo histórico, e assim, “a antiga crença nos milagres do igualitarismo e da filosofia do progresso, que afirmava que era possível obter sempre mais, morreu. Esta ideologia angelical criou um mundo cada vez menos viável” (Faye, 1998:2-3).

Segunda tese (T2): Como fato sintomático do retorno das estruturas psicobiossociais a um estado pré-moderno, as ideologias contemporâneas que surgem se caracterizam por um rechaço ao individualismo e ao igualitarismo, estas últimas como máximas expressões do niilismo cultural. “Para confrontar o futuro, se deverá recorrer a uma mentalidade arcaica, ou seja, pré-moderna, não-igualitária e não-humanista[5], que restaurará os valores ancestrais das sociedades de ordem. Agora, os descobrimentos da tecnociência, particularmente em temas de biologia e informática, não podem ser administrados por meio de valores e de mentalidades humanistas modernas; agora os acontecimentos geopolíticos e sociais estão dominados por questões religiosas, étnicas, alimentícias e epidêmicas. Volta às questões primordiais. Eu proponho, portanto, uma nova noção, o arqueofuturismo, que permite romper com a obsoleta filosofia do progresso e com os dogmas igualitários, humanistas e individualistas da modernidade, inadaptados para pensar o futuro, e nos permitir sobreviver no século do ferro e do fogo vindouro” (Faye, 1998:4-5).

Terceira tese (T3): O advento de um novo cenário sob um marco totalmente diferente ao mundo igualitário reinante e vigente, estando claro que, “temos que projetar e imaginar o mundo para depois do caos, o mundo de depois da catástrofe, um mundo arqueofuturista, com critérios radicalmente diferentes dos da modernidade igualitária” (Faye, 1998:5-6).

Estas três teses conformam o núcleo duro do arqueofuturismo, configurando sua Tricotomia Central (TCAf) como sistema teórico, o qual se expressa da seguinte forma:

Af = <T1,T2,T3>

Onde,

Af = Arqueofuturismo como proposta teórica
T1 = Tese da morte dos mitemas do progresso
T2 = Tese do eterno retorno e iluminismo escuro[6]
T3 = Tese do novo paradigma existencial

Para o exposto, não é menos importante mencionar que, uma parte da narrativa de Faye se deve entender dentro dos marcos literários que este dá a sua obra para efeito de exemplifica-la e/ou elaborar um tipo de projeção hipotética, sob o gênero da utopia e da distopia, algo que se vê reafirmado em sua obra “Arqueofuturismo 2.0” (2016).

Arqueofuturismo e Transumanismo: Um Antagonismo Irreconciliável

Nas antípocas da TCAf se apresenta o Transumanismo (H+), pelo que se deduz de forma clara e explícita da obra de Max More e Anders Sandberg, e das próprias declarações da World Transhumanist Association[7], que reafirmam a sistematização efetuada pelos autores citados:

“O transumanismo é um tipo de filosofia que busca nos guiar a uma condição pós-humana. O transumanismo compartilha de muitos elementos do humanismo, incluindo o respeito pela razão e pela ciência, o compromisso com o progresso e a valoração da existência humana (ou transumana) nesta vida ao invés de em uma ‘vida futura’ sobrenatural. O transumanismo difere do humanismo ao reconhecer e antecipar as alterações radicais na natureza e nas possibilidades de nossas vidas como resultado de diversas ciências e tecnologias como a neurociência e a neurofarmacologia, a extensão da vida, a nanotecnologia, a ultrainteligência artificial e a habitação espacial, combinadas com uma filosofia e um sistema de valores racionais” (More, 1990).

Da mesma forma: “Filosofias da vida que buscam a continuação e a aceleração da evolução humana através da ciência e da tecnologia, guiados por princípios e valores que promovem a vida” (More em Sandberg, 2001).

Do mencionado se expõe, clara, literal e explicitamente que, o transumanismo se encontra na lógica narrativa da modernidade, na medida em que significa a continuação e expansão da filosofia do progresso linear compreendida como perfectibilidade indefinida do gênero humano que não admite qualquer regressão (Canguilhem, 1999:669), é este o princípio nevrálgico do transumanismo e sobre ele que se constrói toda a sua proposta, quid que a própria história da ciência rebateu[8] e que se mostra antagônico à Tricotomia Central do Arqueofuturismo (TCAf).

Muito contrariamente à ideia do progresso linear da modernidade, o arqueofuturismo antepõe uma ideia de movimento sinérgico, que é mais integral, um dinamismo vitalista, “enquanto o arqueofuturismo rechaça toda ideia de progresso. Porque tudo que procede da visão de mundo de um povo tem que se enraizar em bases imemoriais (ainda que as formas e as formulações variem), e porque já há 50 mil anos o homo sapiens mudou muito pouco, e também porque os modelos arcaicos e pré-modernos de organização social deram prova de sua eficiência. À ideia falsa de progresso temos que opor a de movimento” (Faye, 1998:89).

Do exposto se reafirma o fato de que, o arqueofuturismo não tem qualquer flerte com o sistema teórico do transumanismo contemporâneo, como o vê de forma mínima Michael O’Meara[9] (2013) e de forma mais explícita Roberto Manzooco[10] (2019), e tampouco se pode considerar este sistema de pensamento como um ramo conservador do transumanismo (transumanismo conservador), o que é pior. Afirmar este último só pode encontrar explicação em uma pretensão totalitária do transumanismo internacional de monopolizar todo projeto que faça alusão ao uso de tecnologias para o melhoramento da qualidade de vida e da condição humana, iniciativas que tem estado presentes desde a Revolução Industrial, já que como todo sistema teórico se pode rastrear as ideias que lhe serviram de base assim como as primeiras proposições conexas, tal qual como se desenha na obra de Hughes (2002) e Bostrom (2005). Mas disso não se pode inferir que toda ideia que defenda o uso das tecnociências para o melhoramento da qualidade de vida e da condição humana, seja per se, transumanista, como assim referendam, novamente, os próprios transumanistas, na medida em que este – o H+ - tem particularidades que o diferenciam enquanto filosofia e proposta teórica, precisamente, do pensamento futurista (artístico e tecnológico) e do utopismo tecnocientífico.

O termo transumanismo não aparece senão até 1957 das mãos do biólogo Julian Huxley, assim como o termo “transumano” no ano de 1966 nas bocas do futurista norteamericano F.M. Esfandiary, não sendo senão até a sistematização estabelecida pela World Transhumanista Association (WTA) fundada por Nick Bostrom que podemos falar em transumanismo propriamente dito para não cair em uma anarquia semântica e metodológica, do contrário o transumanismo se diluiria na imprecisão, na medida em que “...a afirmação de que é ético e desejável empregar meios tecnocientíficos para melhorar fundamentalmente a condição humana (...) é apenas o denominador comum mais baixo do transumanismo e pode ser adotado, e adaptado às próprias necessidades, pela maioria das ideologias políticas, com exceção das bioconservadoras e neoludistas. (...) Os fundadores do transumanismo moderno, conscientes destes riscos, tentaram ancorar o Eixo Central do Transumanismo em conceitos como o respeito pelo indivíduo, a liberdade, a tolerância e a democracia, ressaltando que as raízes do transumanismo se encontram no iluminismo, no humanismo e no liberalismo. Os extropianos foram mais longe, tratando de ancorar o ECT em conceitos como a ordem espontânea no início e a sociedade aberta mais tarde...” (Estropico, 2009). Não obstante, na práxis, é claro que esta ancoragem não foi de todo exitosa, na medida em que até esta data, e como se viu, não é necessário comungar com o transumanismo para sustentar que mediante a tecnociência se pode melhorar a qualidade de vida e a condição humana. Esta imperativa precisão teleológica e categórica é compartilhada pela WTA para efeito de não cair naquilo que eles chamam de futurismos racialistas e eugênicos dos fascismos [11] ou nos utopismos tecnocientíficos do socialismo clássico. 

É claro, pois, que o transumanismo e suas correntes marginais (extropianismo, tecnoprogressismo, singularitanismo, transfigurismo, etc.), no dia de hoje, se configuram na antítese da proposta arqueofuturista. Se há alguma semelhança entre transumanismo e arqueofuturismo é nesse denominador tão débil que como se expôs, não é exclusivo do transumanismo e que pode se manifestar também em correntes precaucionistas [12] que são antagônicas ao H+, como é no presente caso.

O Mitema da Quarta Revolução Industrial

O próprio Faye é quem referenda tudo que foi exposto ao longo do presente, em um ensaio curto publicado em seu próprio blog em 23 de maio de 2016[13], que guarda muita semelhança com os comentários recentes que Mario Bunge[14] fez sobre o tema[15], dado que engloba o transumanismo dentro do quadro de reações quase-religiosas, produto da fé na ideia de progresso e desenvolvimento lineares, como fato sintomático de um colapso econômico mundial que jaz próximo:

“O otimismo forçado, bastante irracional, sobre a ‘nova economia numérica’, com o big data, o blockchain, a impressão 3D, o ‘transumanismo’, etc. Que prefiguram uma ‘quarta revolução industrial’ e um novo paradigma (e paraíso) econômico mundial, demonstra provavelmente apenas utopia e autoconvencimento. E crença em milagres”.

Da mesma maneira, sentencia Faye que a Quarta Revolução Industrial é um mitema derivado mais de um pensamento mágico do que de um racional[16]:

“A primeira revolução industrial, no início do século XIX, se organizou ao redor da máquina a vapor, a segunda (no final do século XIX) ao redor da eletricidade, a terceira ao redor do computador (meados do século XX). A quarta revolução (início do século XXI), resultante das duas últimas, a elétrica e a eletrônica, se referiria à generalização da internet e das conexões digitais universais através da rede. O conceito de ‘quarta revolução industrial’ nasceu depois da Feira de Hannover em 2011, onde se celebrou o nascimento da ‘fábrica conectada’; esta última, totalmente ‘conectada à rede’ e conectada diretamente com os clientes, é robótica e emprega cada vez menos pessoas. Criou-se a expressão abstrata ‘Indústria 4.0’. Este é um conceito bastante vazio: Quando virá a ‘Indústria 5.0’? Um dos gurus neorromânticos desta ‘Quarta Revolução Industrial’ é – como se assinalou anteriormente – o professor Klaus Schwab, fundador e líder do Fórum Econômico Mundial em Davos. A conferência de janeiro de 2016 se dedica à Quarta Revolução Industrial. Na agenda: inteligência artificial, robótica, objetos conectados, nanotecnologias, inovações ‘revolucionárias’. Por que não? O que é interessante, mas ao mesmo tempo cômico, é que todos os meios midiáticos, sem retrocesso, tomaram a sua palavra sobre as conclusões (ideológicas mais do que científicas) deste fórum de Davos. Ninguém se perguntou que melhoras concretas trouxe essa milagrosa economia digital paralela à deterioração da situação mundial. A invasão migratória desestabilizou a Europa, o aumento da jihad islâmica, o colapso dos preços do petróleo, a aceleração global de todos os tipos de contaminação, não foram discutidos. Pressupõe-se que a ‘revolução digital’ vai resolver todos os problemas. É a crença nos milagres, que é mais um pensamento mágico do que um reflexo racional.

(...)

As profecias sobre a revolução da economia digital, com suas palavras favoritas, nuvem, big data, transumanismo, etc., pertencem a uma ideologia neocientífica que corre o risco de levar a desilusões terríveis. Agora, este neocientificismo sem retroceder como o do final do século XIX, convive, curiosamente, nele mesmo, com um progressismo antiecológico. É tão estúpido quanto as teorias do decrescimento: é o mesmo extremismo”.

Arqueofuturismo e Crisolismo

O arqueofuturismo, segundo o que já vimos, é uma postura equilibrada que integra dialeticamente duas categorias: Arcaísmo e Futurismo. É uma teoria crítica da modernidade, mas também da tradição.

O legado fayeano é a base de um arqueofuturismo peruano no marco da teoria crisolista, que prevê a harmonia entre a visão tradicional das diversas etnidas que conformam a peruanidade e a ideia de um movimento sinérgico tecnocientífico e socioeconômico harmônico, se mafetação aos espaços existenciais de comunidade amazônicas e andinas, por exemplo, frente aos perigos de um ideal de progresso ilimitado plasmado em uma visão instrumentalista da natureza, que até hoje só legou: mineração ilegal em Madre de Dios, o colapso dos resíduos minerais em Ancash, derramamentos de petróleo no Amazonas, a depredação de reservas ecológicas como as de Chaparrí, aumentando o risco de extinção de espécies em perigo, e o desmatamento exacerbado que determinou a perda de 164.662 hectares de bosques úmidos amazônicos em 2016, que põe em risco um ambiente sadio e equilibrado.

O arqueofuturismo não é, portanto, a misantropia oculta no transumanismo, alimentado pela ideia de progresso ilimitado, que odeia o ser humano comum, prisioneiro de suas debilidades biológicas. O arqueofuturismo tampouco é, nem poderia ser nunca, transumanismo conservador. O arqueofuturismo é a reafirmação de um autêntico amor pela potencialidade originária humana enquanto tal, na medida em que é consciente de que, a ideia de progresso moderna, como denunciava Rousseau (1750), gera seres materialmente ricos e tecnicamente poderosos, mas moralmente desprezíveis.

Notas

[1] - "...que é um quadro de pensamento global que alia a concepção orgânica e hipotética da vida com as visões de mundo complementares da vontade de poder nietzscheana, da ordem romana e da sabedoria realista helênica. Leitmotiv: 'um pensamento voluntarista concreto, criador de ordem'." (Faye, 1998:25)
[2] - "Pensar conjuntos, para as sociedades do futuro, os descobrimentos da tecnociência e o retorno às soluções tradicionais e imemoriais. Tal é, talvez, o nome verdadeiro da pós-modernidade, longe do passadismo e do culto estúpido do 'atual'. Reunir, segundo a lógica do 'e', e não do 'ou', a memória mais antiga e a alma faustiana, pois podem se combinar perfeitamente. O tradicionalismo inteligente é o futurismo mais potente, e vice-versa. Reconciliar Evola e Marinetti. É o conceito de 'modernidade', nascido da ideologia do Aufklärung, que deve ser descartado. Não se deve associar os antigos aos modernos, mas os antigos aos futuristas" (Faye, 1998:25-26).
[3] - "A contribuição do neoeurasianismo é precisamente esta: a de se situar na reação mundial à globalização. O neoeurasianismo transforma a especificidade russa em 'um modelo universal da cultura, em uma alternativa ao globalismo atlantista, em uma visão também global do mundo'. O neoeurasianismo retoma, assim, um dos traços mais genuínos do pensamento tradicional russo: seu caráter escatológico e messiânico. O eurasianismo se torna um arqueofuturismo, uma 'apologia da barbárie' que não duvida em afirmar que, diante dos estragos do desenvolvimentismo ocidental e do futuro pós-industrial de nossas sociedades, o 'arcaísmo' da Rússia constitui, na verdade, uma vantagem. Diante dos obstáculos insuperáveis, os bárbaros preferem sempre cortar o nó górdio. Talvez seja nas estepes da Eurásia que o destino da modernidade se resolva. No Heartland dos geógrafos, no coração da Ilha Mundial" (Erriguel, 2015:5). Disponível em https://4tpes.wordpress.com/2015/11/02/rusia-metapolitica-del-otro-mundo-y-ii/#_ftnref90
[4] - Em termos metapolíticos, o trabalho de Jorjani representa mais uma - muito substancial - quebra no discurso ideológico pós-moderno dominante de niilismo cultural, caracterizado pelo niilismo secular, pelo neoliberalismo globalista, pelo hiperindividualismo narcisista e pelo relativismo cultural extremo. Metapoliticamente, a obra de Jorjani pode ser localizada no espectro - reconhecidamente bastante vago - do 'Arqueo-Futurismo', uma escola filosófica historicamente relacionada ao que é mais ironicamente chamado de 'Iluminismo Escuro'. Ambos os termos são essencialmente equívocos, mais frequentemente aplicados de forma depreciativa por críticos ideológicos dos pensadores e movimentos supostamente ‘antidemocráticos’ e ‘reacionários’ que se destinam a cobrir - mas estes termos são, no entanto, úteis como marcadores provisórios. De uma perspectiva tradicionalista, ambos os movimentos são - inevitavelmente, dado o seu subsolo pós-moderno - híbridos ideológicos. Eles tendem a se envolver com aspectos particulares da modernidade (conquista tecnológica, exploração científica, estética futurista) enquanto rejeitam suas ideologias e atitudes niilistas, materialistas e relativistas. Seria mais correto dizer que estes movimentos tendem a se interessar por alternativas 'atemporais', em vez de alternativas 'arcaicas' a estas ideologias e atitudes. Eles tendem a rejeitar as premissas iluministas da modernidade precisamente porque associam essas premissas às trevas espirituais e intelectuais, e não à luz. A este respeito, o Arqueo-Futurismo e o Iluminismo Escuro partilham um terreno considerável com o pensamento tradicionalista, que vê a Idade Moderna como o equivalente a uma Idade Escura cósmica (o "Fim dos Tempos" cristão, o "Kali Yuga" hindu, o "Tempo Invernal" spengleriano). Eles diferem do tradicionalismo, porém, na medida em que seu discurso metapolítico tende a ser operacional: ele fornece uma base não só para a quebra de consenso ativista, mas também para a política revolucionária. Em outras palavras, o Arqueo-Futurismo e o Iluminismo Escuro têm o potencial de se expandir para ideologias sociopolíticas plenamente operacionais e para programas políticos eficazes. Este potencial é visível nos múltiplos cruzamentos do pensamento Arqueo-Futurista e do Iluminismo Escuro com o movimento identitário ocidental. Disponível em: https://www.geopolitica.ru/en/article/archaeo-futurist-revolution
[5] - Quando Faye se refere a uma rejeição do humanismo, ele não se refere a um humanismo qualquer, mas especificamente ao que surgiu no final da Idade Antiga e do resto da Idade Moderna, aquele que difere do humanismo helênico clássico com o qual ele concorda: 'Esta filiação helênica é evidentemente oposta aos preceitos evangélicos impraticáveis de 'todos os homens são meus irmãos'. A filiação helênica é humanista, porque é desigual, hierárquica, em conformidade com a natureza. Prefiro meu irmão de sangue ao estrangeiro, mas nunca vou querer fazer mal ao estrangeiro pacífico. E ele vai agir da mesma forma que eu ajo, na sua própria comunidade, no seu país. O humanismo desigual respeita a ordem natural; não mente. O humanitarismo utópico e igualitário mente. Leva à tirania, a este inferno pavimentado com boas intenções". (Faye, 2001)
[6] - Categoria antitética do Iluminismo antropocêntrico. Se o Iluminismo do século XVIII significou o estabelecimento da fé no progresso infinito e na razão instrumental como único critério de aproximação à realidade, o Iluminismo Escuro representa a rejeição da idéia de progresso linear, colocando antepondo a idéia de movimento sinérgico e da visibilização do caráter multívoco do conhecimento humano, onde sua forma racional conceitual é apenas uma de suas manifestações finais e a mais complexa, certamente, mas não a única, sob a teoria das três grandes racionalidades que sustenta que a racionalidade é universal, como uma aptidão inata da raça humana que transcende o tempo e que se manifesta em todas as épocas da humanidade, através de 3 grandes manifestações, a empiriocrática (baseada no sensível), a mitocrática (baseada no mítico) e a logocrática (baseada nos conceitos). Dado que a racionalidade na forma do logos é apenas uma das manifestações da psique humana, é por isso que até hoje a racionalidade do substrato mítico assim como a racionalidade do substrato sensível subsiste e coexiste, o logos não substituiu o sensível, o mito não substituiu oslogos. O homem, em vez de reduzir a sua racionalidade, apenas a ampliou e aperfeiçoou. "Se se procura as origens do mito, sempre se descobre apenas fases de diferentes formas de afirmação racional do ser e da vida. Não há nenhum mito pré-racional arcaico e, consequentemente, nenhum caminho que leve do mito ao Logos: 'existe apenas - como diz Hans Blumenberg - uma racionalidade e uma simbolização que muda com o tempo. O que muda é apenas a percepção da realidade através do homem' " (Peña Cabrera, 1994). O Iluminismo configura, portanto, um reducionismo logocrático e antropocêntrico enquanto o Iluminismo Escuro – semântica reacionária ao século das luzes – propõe um holismo gnoseológico mais integral e sistêmico.
[7] - "O transumanismo é uma forma de pensar o futuro que se baseia na premissa de que a espécie humana na sua forma atual não representa o fim do nosso desenvolvimento, mas sim uma fase comparativamente precoce.

O transumanismo é um movimento vagamente definido que se desenvolveu gradualmente ao longo das últimas duas décadas. "O transumanismo é uma classe de filosofias da vida que busca a continuação e aceleração da evolução da vida inteligente para além da sua forma humana atual e das limitações humanas por meio da ciência e da tecnologia, guiada por princípios e valores promotores da vida". (Max Mais 1990)

A Humanidade+ define formalmente com base na definição original de Max More como se segue:

(1) O movimento intelectual e cultural que afirma a possibilidade e a conveniência de melhorar fundamentalmente a condição humana através da razão aplicada, especialmente através do desenvolvimento e da disponibilização de tecnologias para eliminar o envelhecimento e para melhorar muito as capacidades intelectuais, físicas e psicológicas humanas.

(2) O estudo das ramificações, promessas e perigos potenciais das tecnologias que nos permitirão superar limitações humanas fundamentais, e o estudo relacionado das questões éticas envolvidas no desenvolvimento e uso de tais tecnologias.

O transumanismo pode ser visto como uma extensão do humanismo, do qual ele deriva parcialmente. Os humanistas acreditam que os seres humanos são importantes, que os indivíduos são importantes. Nós podemos não ser perfeitos, mas podemos melhorar as coisas promovendo o pensamento racional, a liberdade, a tolerância, a democracia e a preocupação com os nossos semelhantes. Os transumanistas concordam com isso, mas também enfatizam o que temos potencial de nos tornar. Assim como usamos meios racionais para melhorar a condição humana e o mundo externo, também podemos usar tais meios para melhorar a nós mesmos, o organismo humano. Ao fazê-lo, não estamos limitados aos métodos humanistas tradicionais, tais como a educação e o desenvolvimento cultural. Também podemos usar meios tecnológicos que nos permitirão, eventualmente, ir além do que alguns pensariam como "humano". Disponível em: https://humanityplus.org/philosophy/transhumanist-faq/
[8] - "Mas é ainda mais irônico que a história da ciência tenha destruído a imagem linear do progresso científico através da reproposição dessa propriedade postulada para a linha reta de não admitir mais do que um paralela traçada por qualquer ponto fora dela. Dado que as simulações de revolução na geometria euclidiana, testadas por Saccheri e Lambert, foram ignoradas pelos seus contemporâneos matemáticos, os filósofos do século XVIII desconheciam a ideia, agora banal, da fecundidade teórica do Não. Ainda mais do que a geometria não euclidiana, a mecânica não newtoniana contribuiu para introduzir na história da ciência a ideia da retificação dialéctica. O progresso contínuo é um conceito de epistemologia conservadora. Aquele que anuncia o progresso faz de hoje um amanhã. Agora, é só amanhã que podemos falar do dia anterior. Quanto à crise das noções fundamentais de geometria e análise no início do século XIX e ao uso de números complexos e séries infinitas, Jean Cavaillès escreveu, "os resultados obtidos graças aos novos instrumentos são aqueles que levam à transformação de todo o sistema matemático: modelos não euclidianos e geometria projetiva construída com a ajuda de números complexos, teorias de funções arbitrárias representadas por séries trigonométricas"...., a matemática real inicial é apenas um caso particular, situado dentro da nova matemática e explicado por si mesmo" (Canguilhem, 1999:675).
[9] - "Quais são os problemas na visão da Faye? Do meu ponto de vista reconhecidamente paroquial ('Eu deveria estar insatisfeito no Céu'), há quatro grandes. O primeiro tem a ver com a sua compreensão do arqueofuturismo, que tende a enfatizar o futurista em detrimento do arcaico. Desprezando (às vezes desdenhando) as reservas tradicionalistas e heideggerianas em relação à tecnologia, Faye favorece numerosas tendências tecnocientíficas que ele considera necessárias para a sobrevivência européia. A principal delas é a energia nuclear, a engenharia genética e uma inclinação mais geral para o que é chamado de 'transhumanismo'. Este 'ismo' favorece a transformação da condição humana através do desenvolvimento de tecnologias que melhorem as capacidades humanas e superem as limitações humanas. Acho este 'transumanismo' potencialmente niilista, não só da perspectiva de uma 'racionalidade cristã-europeia', que desconfia da capacidade do homem de melhorar a natureza (pois 'o sono da razão produz monstros'), mas também de uma perspectiva meta-histórica que vê a base tecnocientífica da nossa cultura sensível como tendo-se fixado em teorias da verdade que apreendem apenas um aspecto estreito da realidade humana e, consequentemente, descartam as coisas mais importantes" (O'Meara, 2013: 18).
[10] - "Já dissemos antes que o transumanismo pode ser misturado com qualquer tipo de ideologia que aceite seus princípios; isto se aplica, acima de tudo, às ideologias progressistas, mas não de forma exclusiva. É o caso, por exemplo, dos 'super-humanistas' italianos, que se referem à Nouvelle Droite de Alain De Benoist, ao pensamento de Giorgio Locchi e ao Arqueofuturismo de Guillaume Faye - essencialmente à direita radical" (Manzocco, 2019:45).
[11] - "DECLARAÇÃO DA WTA SOBRE RACIALISMO

Toda e qualquer doutrina de supremacia/inferioridade racial ou étnica é incompatível com a tolerância fundamental e as raízes humanistas do transhumanismo. As organizações que defendem tais doutrinas ou crenças não são transhumanistas e não são bem-vindas como afiliadas da WTA. (adotado em 25/02/2002)".
[12] - "A política futura será estruturada de acordo com a atitude de cada pessoa em relação às antropotecnias. Os tradicionais eixos esquerda-direita ou liberal-conservador tornar-se-ão obsoletos e serão substituídos pelo eixo precaucionista-proacionista (Fuller e Lipinska, 2014), quaisquer que sejam os neologismos. Alguns defenderão o uso restrito ou nenhum da antropotecnia, enquanto outros defenderão a sua implementação sem restrições, ou quase. E o TH já tomou uma posição no debate: ele lidera o caminho nas propostas mais favoráveis à antropotecnia, ou seja, à intervenção técnica profunda sobre o próprio ser humano. O objetivo declarado desta intervenção é alcançar o chamado aprimoramento humano" (Marcos, 2018:109).
[13] - «L’optimisme forcé, assez irrationnel, sur la "nouvelle économie numérique", avec le big data, la blockchain, l’impression 3D, le "transhumanisme", etc. qui préfigureraient une "quatrième révolution industrielle" et un nouveau paradigme (et paradis) économique mondial, relève probablement de l’utopie et de l’auto persuasion. Et de la croyance aux miracles» (Faye, 2016). Disponível em: http://www.gfaye.com/vers-un-crash-economique-mondial/
[14] - Físico, epistemólogo e filósofo da ciência argentina. Seus trabalhos são reconhecidos internacionalmente no mundo da ciência. Ele lançou as bases de seu próprio sistema teórico sob o nome de hylerrealismo ou realismo científico, ele também tem sido um dos principais promotores da luta contra as pseudociências e modas intelectuais, dentro destas últimas, o transumanismo.
[15] - "O transumanismo é um conto, e talvez uma religião solapada" (Bunge, 2019).
[16] - "Le mythe de la ”quatrième révolution industrielle"

La première révolution industrielle – début du XIXe siècle– s’organisait autour de la machine à vapeur, la deuxième (fin du XIXe) autour de l’électricité, la troisième autour de l’informatique (milieu XXe). La quatrième révolution (début XXIe), issue des deux dernières, l’électrique et l’électronique, concernerait la généralisation d’Internet et des connections universelles numériques par le web. Le concept de « 4e révolution industrielle » est né après la foire de Hanovre en 2011, où l’on a célébré la naissance de l’ ”usine connectée” ; cette dernière, entièrement ”webisée” et branchée directement sur les clients, est robotisée et emploie de moins en moins de salariés. On a créé l’expression abstraite d’ ” industrie 4.0”. C’est un concept assez creux : à quand, l’ ”industrie 5.0” ?

Un des gourous néo-romantiques de cette « 4e révolution industrielle » est – comme indiqué plus haut – le Pr. Klaus Schwab, fondateur et animateur du forum économique mondial de Davos. Le colloque de janvier 2016 a été consacré à la 4e révolution industrielle. Au programme : l’intelligence artificielle, la robotique, les objets connectés, les nanotechnologies, des innovations « révolutionnaires ». Pourquoi pas ? Ce qui est à la fois intéressant  mais par ailleurs comique, c’est que tous les médias, sans aucun recul, ont cru sur parole les conclusions (idéologiques plus que scientifiques) de ce forum de Davos. Personne ne s’est posé la question de savoir quelles améliorations concrètes apportait cette miraculeuse économie numérique qui est pourtant parallèle d’une dégradation de la situation mondiale.  L’invasion migratoire qui déstabilise l’Europe, la montée du djihad islamique, l’effondrement des cours du pétrole, l’accélération planétaire de tous les types de pollution ne furent pas des sujets abordés. La ”révolution numérique” est censée résoudre tous les problèmes. C’est la croyance aux miracles, qui relève plus de la pensée magique que de la réflexion rationnelle.

Le néo–scientisme et l’écologisme

Les prophéties sur la révolution de l’économie numérique, avec ses mots fétiches, cloud, big data, transhumanisme, etc, appartiennent à une idéologie néo–scientiste qui risque de déboucher sur des désillusions terribles. Or, ce néo-scientisme sans prise de recul, comme celui de la fin du XIXe siècle, cohabite curieusement, chez les mêmes, avec un anti–progressisme écologiste. Il est aussi stupide que les théories de la ”décroissance : il relève du même extrémisme.

Ce romantisme néo-scientiste est l’exact pendant de celui de la fin du XIXe siècle – relisez Jules Vernes et Victor Hugo –  où l’on s’imaginait l’avenir en rose sous l’influence du concept magique et au fond peu rationnel de ”Progrès”. À la fin de son poème La légende des siècles, Victor Hugo brossait une vision idyllique du XXe siècle.

Les erreurs des pronostics technologiques sont une habitude. Jules Vernes prévoyait qu’en 1960, les habitants des villes se déplaceraient en engins volants individuels. Mais il n’avait pas prévu l’automobile.  Et, dans les années 60, on pronostiquait des bases humaines nombreuses sur la Lune et sur Mars, astronomiques et d’extraction minière,  la généralisation des transports aériens supersoniques et hypersoniques stratosphériques ainsi que la diffusion de l’énergie de fusion nucléaire. Bien des pronostics sur le futur de la ”révolution numérique” relèvent probablement des mêmes erreurs utopiques de jugement.

L’utilité marginale déclinante de l’économie numérique

Le téléphone, l’électrification, le chemin de fer et l’automobile, l’aviation comme la radio et la télévision, la pénicilline, l’anesthésie, etc. ont été des bonds technologiques énormes, de par leurs conséquences, bien plus qu’Internet ou l’économie numérique. Le binôme numérique/ informatique offre moins de facilités qu’on ne croit ; parce qu’il complique les processus autant qu’il ne les simplifie. Les innovations technologiques de la ”révolution numérique” ne répondent pas dans la pratique quotidienne, à leurs promesses. Elles sont inférieures en terme d’avantages marginaux aux innovations des précédentes mutations techno–industrielles".   (Faye, 2016). Disponível em: http://www.gfaye.com/revolution-numerique-miracle-ou-imposture-1ere-partie/

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