"O objetivo do livre-comércio global é criar um mercado global de bens, serviços, capital e trabalho. O princípio é que tudo possa ser manufaturado em qualquer lugar do mundo e vendido em qualquer outro lugar. O livre-comércio global se tornou um princípio sacrossanto da teoria econômica moderna, um dogma universal, verdadeira religião cuja premissa não é permitido questionar.
Quase todos os economistas e políticos estão hoje dominados, e para dizer a verdade, verdadeiramente encantados por essa doutrina. Essa doutrina é sustentada diariamente por todas as mídias que controlam mais ou menos abertamente beneficiárias multinacionais do livre-comércio global. Advogados da nova doutrina confundem a lucratividade das multinacionais com uma economia global saudável. Eles chegam à conclusão de que os lucros das grandes multinacionais e o nível do preço de suas ações são um indicador confiável de uma economia e sociedade saudáveis.
Em verdade, o quê nós vemos é que o comércio internacional é dominado pelos interesses de multinacionais e não pelos interesses das Nações como um todo. O quê nós vemos é que a economia global é organizada para o benefício das multinacionais, e não para satisfazer as necessidades básicas e fundamentais das comunidades nacionais.
Hoje existem duas economias distintas: aquela das grandes corporações e aquela das Nações. Seus interesses não são apenas diferentes. Eles são antagônicos. Conforme as multinacionais transferem sua produção para regiões com salários mais baixos, eles destroem empregos em sua própria economia nacional. Nesse sistema, os perdedores não são apenas aqueles que perdem seus empregos por 'offshoring', mas também aqueles que perdem seus empregos porquê o seu empregador não terceirizou, e acabou falindo. Também são perdedores todos aqueles cujos salários são reduzidos pela competição com países de baixo salário.
Os vencedores são aqueles que podem obter lucros imensos usando fontes de trabalho barato virtualmente inexauríveis. Essas são as companhias que se transferem podendo pagar salários menores, e aqueles com capital para investir onde o trabalho é mais barato e onde eles podem garantir um retorno melhor. São os líderes das corporações multinacionais e seus acionistas que são a favor do livre-comércio global. São eles que ficam de fato mais ricos. Em realidade nós devemos distinguir entre os interesses dos grupos que dominam a política, a administração, os negócios públicos dos interesses do povo. As necessidades reais de cada país são de facto subordinadas aos interesses das multinacionais, e realmente aos interesses dos executivos das companhias multinacionais.
Esse sistema insano é mantido apenas por meio da cumplicidade dos líderes políticos. São eles, essencialmente, e apenas eles, que são responsáveis pelas consequências do livre-comércio global porquê são eles, por sua função, que são responsáveis por definir o desenho institucional das economias.
Na França os defensores do livre-comércio global apontam que graças a importações baratas de países com baixos salários, os preços nos supermercados tem se reduzido consideravelmente. Isso é de fato o quê vemos, mas, como Frederic Bastiat uma vez disse, o quê não é visto é o aumento correspondente no número de desempregados que tem que ser subsidiados e cujos benefícios são financiados por impostos cada vez maiores. O quê não é visto, é também a progressiva destruição da indústria nacional."
(Maurice Allais)