por Adriano Erriguel
(2023)
Todo empreendimento intelectual que se preze é, entre outras coisas, uma tentativa de decifrar o significado do presente, de entender o momento histórico em que vivemos. É uma tarefa em que é fácil se perder em pistas falsas, confundir causas e consequências, deixar de distinguir o essencial do acessório e se envolver em problemas irrelevantes ou apenas aparentes. Também é muito comum errar os tempos e se apegar a interpretações ultrapassadas. Nem todo mundo é capaz de perceber o sentido do tempo.
Por isso é estranho descobrir alguém para quem essas dificuldades não contam. Alguém com a capacidade de um sismógrafo de captar, com transparência de diamante, as revoluções silenciosas que são sempre as mais eficazes. Que sensação descobrir que tudo – ou quase tudo – o que vemos e pensamos já foi visto, intuído e anunciado por alguém, com a convicção e firmeza de um profeta!
Pasolini viu coisas. E o que ele viu nos dá as chaves para entender a inquietação do homem ocidental no século XXI. Os grandes debates que nos atormentam hoje - os limites do crescimento e a arrogância do capitalismo; o triunfo do virtual e o império do simulacro; os "tempos líquidos" e o "desencantamento do mundo"; a atomização social e o desenraizamento cultural; a montanha-russa da globalização e a dissolução da cultura europeia - já haviam sido levantados por Pier Paolo Pasolini em meados do século passado. Tudo isso estava em Pasolini, o homem que se definia como "uma força do passado" e que, talvez por essa mesma razão, foi quem melhor previu o futuro.