por Adriano Scianca
(2019)
Com o falecimento de Guillaume Faye, morto à noite entre 6 e 7 de março, desaparece da cena metapolítica europeia um dos poucos intelectuais que verdadeiramente mudou o modo pelo qual todos nós pensamos, mesmo em relação aos que nunca o leram, mesmo em relação aos que o leram pensando de maneira diferente sobre tantos temas. Gravemente doente for algum tempo, cuidado por um punhado de camaradas devotados, Faye demonstrou até o fim mais interesse pelo mundo das ideias do que por si mesmo, mesmo às custas de negligenciar a própria saúde para poder continuar a escrever. Apesar de nunca o ter conhecido, nos últimos tempos eu tentei contatá-lo diversas vezes, escrevendo ao e-mail de seu sítio. Ele me respondeu uma primeira vez, concordando com uma entrevista. Mas, quando o havia enviado as perguntas por e-mail, havia declarado não ter recebido nada, pedindo que as enviasse novamente...por carta. Algo bastante singular para um profeta da tecnociência. Fiz uma segunda tentativa, com o fim de cooptá-lo para o Primato Nazionale, onde uma coluna fixa sua teria sido mais do que bem vinda. Não me respondeu mais, provavelmente porque já estava doente.
A Nova Direita Francesa
Faye nasceu em 7 de novembro de 1949 em Angoulême, capital do departamento da Charente, situado na região da Nova Aquitânia. Em uma entrevista disse: "Fui criado no culto do nacionalismo francês, de tendência bonapartista, e o resultado paradoxal foi um patriotismo europeu. O meu ambiente social de origem é aquele da grande burguesia parisiense, que conheço perfeitamente por dentro e com a qual eu jamais partilhei os ideais conformistas e materialistas". Diplomado no Institut d'Études Politiques de Paris e titular de um doutorado em ciências políticas, foi um dos principais teóricos do Groupement de Recherches et Etudes pour la Civilisation Européenne (GRECE), e do ambiente mais tarde conhecido como Nova Direita francesa, no período que vai de 1970 a 1986. Faye se aproxima do GRECE a convite de Dominique Venner, sem um pedigree pregresso particularmente ligado à direita. Entre as figuras que o haviam influenciado até então estão o marxista e situacionista Henri Lefebvre. Nesta fase, Faye propõe um pensamento voluntarista, faustiano, marcadamente nietzscheano e portador de um paganismo pós-moderno. A sua visão do mundo exalta a tecnociência visionária do espírito europeu. Não são raras as provocações, especialmente em temas éticos e sexuais.
Em um artigo de poucos anos atrás, Stefano Vaj, amigo de longa data do francês, descreve assim o primeiro impacto com o personagem Faye, no âmbito de uma conferência do GRECE: "Orador excepcional, hipnótico mesmo ao ler um discurso escrito na atmosfera abafada de uma conferência de estudos em um palácio do governo, Guillaume Faye parecia um pouco fisicamente e nos movimentos com o jovem Feddersen, interpretado por Gustav Froelich, protagonista de "Metropolis" de Fritz Lang; e era já indiscutivelmente o astro nascente do movimento. [...] Faye deixava uma impressão de 'fanatismo lúcido' em que se mesclavam reminiscências de Che Guevara, D'Annunzio, Inácio de Loyola e Goebbels, um tanto distante do material humano sectário e arrivista, conformista e reacionário, que dominava a minha experiência política italiana da época. As noites passadas discutindo questões fundamentais da nossa época e do futuro da Europa no campo provençal da Universidade d'Eté do GRECE se tornaram logo um necessário sopro de oxigênio".
O Sistema para Matar os Povos
Filho desta fase é o excepcional "Le Système à tuer les Peuples", diagnóstico pontual da globalização escrito em 1981, quando a agenda política do Ocidente era inteiramente ocupada pela Guerra Fria. Em um mundo dividido em dois, com as várias direitas usualmente preocupadas com representar com o zelo devido o papel de sentinelas do Ocidente, Faye se preocupava com a uniformidade do planeta sob o estandarte de uma única ideologia consumista, desmobilizante, burguesa, universalista. Livro profético como nunca se viu, "O Sistema para Matar os Povos" - do qual existe uma tradução em italiano, realizada pelo próprio Vaj, foi repetidamente reimpresso em várias edições, a última recentemente da Editora Aga - teve também o mérito de propôr uma leitura do poder totalente alheia aos esquemas conspiracionistas e a simplificações sectárias. A características principal do Sistema descrito por Faye era precisamente o fato de "funcionar" de modo mecânico, impessoal, acéfalo. Uma lição a ser repassada, especialmente hoje quando os espectros das megaconspirações voltam a domianr a cene daqueles que gostariam de se opôr ao Sistema.
Defnido como o "antipapa da Nouvelle Droite", em relação ao "pontífice" reconhecido do ambiente, Alain de Benoist, Faye não poderia ter uma personalidade mais diversa da do autor de "Visto a partir da Direita": tanto meticuloso, enciclopédico, "intelectual" de Benoist, quanto estrepitoso, polêmico, "militante" o segundo. Características que comportam, em ambos os casos, tantas vantagens quanto desvantagens. Em 1986, Faye rompe com o ambiente do GRECE, paralelamente a outros ilustres expoentes do mesmo ambiente, como o historiador Jean-Claude Valla. Por dez anos, Faye fica longe da política e da cultura: participa de programas de rádio, faz provocações midiáticas, participa até mesmo, segundo uma lenda metropolitana que ele mesmo alimentava, de um filme pornô como ator.
Arqueofuturismo
Em 1998, o grande retorno à batalha das ideias com "Arqueofuturismo", um dos textos mais importantes dos últimos 30 anos. No último março, por ocasião da reedição do texto, novamente pela Aga, eu escrevi que a obra "influenciou fortemente o imaginário das duas décadas seguintes, não perdendo substancialmente a sua atualidade. [...] A tese do livro é conhecida, mesmo que apenas por ser repetida lá e cá: é necessário unir Evola e Marinetti, o sagrado e a tecnociência, o poder do arcaico e as sugestões futuristas. [...] Mas era principalmente o discurso sobre o Islã que estava destinado a perturbar os velhos admiradores de Faye e a gerar discussão em seu público natural. O velho cantor da 'causa dos povos' contra o sistema americanocêntrico reemergia do nada clamando por guerra contra os muçulmanos. Heresia, traição, mão da Cia ou do Mossad? Sobre o tema, como de costume, a visão de Faye tendia a levar os conceitos ao extremo, com não poucas forçações de barra e argumentos mal acabados.
Precisamente no número de fevereiro de 2019 do Primato Nazionale há uma entrevista com Guillaume Faye de caráter semitestamentário.
Com o passar dos anos, os argumentos foram se tornando cada vez mais afiados, ainda que o ápice visionário, original, mobilizador de "Arqueofuturismo" não fosse mais alcançado. Entre as suas obras deste segundo período, merecem menção o pouco conhecido "Pourquoi nous combattons?", obra menor, espécie de breviário militante realmente rico em ideias. Entre os livros que mais geraram discussão e discussão sobre ele mesmo está o "La Nouvelle Question Juive", pelo qual ele foi obviamente categorizado como agente do sionismo internacional. O último ensaio, lançado há poucos dias, dava testemunho de um ulterior e controverso passo rumo a uma radicalidade sempre mais acentuada, começando pelo título: "Guerra Civil Racial". Um texto sobre o qual teria sido interessante discutir talvez até mesmo brigar. Não houve tempo.