por Alex Kurtagic
É um clichê em nossa sociedade liberal de tendências esquerdistas que nós devamos permanecer vigilantes contra qualquer ideologia que rejeite a igualdade como um objetivo moralmente desejável, porque, caso essa ideologia alcança poder político, nós nos encontraremos novamente na ladeira escorregadia que começa por uma justificação do racismo e culmina com as câmaras de gás em Auschwitz-Birkenau.
Tanto liberais como seus críticos marxistas se apresentam como forças de liberação e emancipação, e sua historiografia retrata o tempo antes de seu advento como um de privilégio, opressão e desumanidade.
Porém, a história dos últimos cem anos demonstrou que, contrariamente ao preconceito dos liberais e da esquerda, e contrariamente à bela retórica que emana de seu campo, a lógica moral do igualitarismo também justifica privilégios, opressões e desumanidade, exatamente os mesmos males que ela afirma ter combatido.
Privilégio
Uma hipótese fundamental entre igualitaristas é a de que a igualdade de oportunidade deve produzir igualdade de resultados, e que, quando resultados são desiguais, é porque um indivíduo ou grupo de indivíduos tem desfrutado de alguma vantagem injusta. Os igualitaristas possuem uma visão-de-mundo materialista, de modo que essas vantagens injustas são sempre redutíveis a condições materiais, o que, em sua visão, e no sentido mais amplo possível, é o principal determinante de resultados. Essa vantagem injusta é chamada "privilégio". Para combater privilégios, a estratégia fundamental do igualitarismo é a redistribuição: aqueles que se pensa terem desfrutado de vantagens injustas são sujeitos à extração, e o "excesso" extraído é transferido para aqueles que se pensa terem sofrido com desvantagens injustas.
É obviamente verdadeiro que indivíduos ou grupos de indivíduos às vezes desfrutam de vantagens injustas, mas resultados desiguais nem sempre são resultado de oportunidades desiguais resultantes de "privilégio". Oportunidades iguais podem e de fato resultam - o tempo todo - em resultados desiguais. Os igualitaristas resistem à causa (a desigualdade humana inata) porque eles acreditam que uma sociedade desigual é imoral. A desigualdade é para eles sempre e necessariamente uma injustiça.
O problema é que eles efetivamente "corrigem" uma injustiça percebia com uma injustiça de fato. Onde não houve vantagem injusta, mas apenas resultado desigual, a redistribuição toma dos merecedores de modo a dar aos não-merecedores. Isso, de fato, cria uma classe de indivíduos privilegiados que desfrutam de vantagens não-merecidas, e portanto injustas, às custas daqueles que adquiriram, de modo justo, aquilo que foi deles tomado. O igualitarismo, portanto, simplesmente transfere privilégios de um grupo para outro - ele não os elimina.
Opressão
Alguns críticos na Direita tem dito que devemos distinguir "igualdade boa" de "igualdade ruim", citando a igualdade perante a lei como um exemplo de "igualdade boa".
A igualdade pode fazer sentido em certos contextos, desde que ela seja tratada como uma questão prática. Quando ela é tratada como um imperativo moral, porém, se torna impossível justificar a oposição às sociedades multirraciais que temos agora no Ocidente, onde os indígenas não devem ser considerados como especiais, onde os níveis de imigrantes geneticamente distantes são determinados puramente por considerações econômicas.
As sociedades multirraciais resultantes são inerentemente instáveis, porque elas não mais podem ser governadas sob um conjunto partilhado de pressupostos, valores e costumes, e porque a identificação racial e étnica entre vários grupos os coloca em competição mútua por poder e recursos. É desnecessário dizer que a competição entre grupos diferentes também ocorre em sociedades racialmente homogêneas, mas o multirracialismo acrescenta camadas de complexidade totalmente desnecessárias, demandando níveis inteiramente novos de envolvimento estatal. Conforme o experimento multicultural tem demonstrado no Ocidente, o crescimento do multiculturalismo contra um pano-de-fundo de moralidade igualitária fomenta o crescimento de políticas de igualdade, regulamentos, legislações, policiamentos, imposições, burocracias e programas sociais, construídos para impedir que os nativos desenvolvam estratégias de exclusão contra os grupos exógenos cada vez maiores. A garantia liberal da liberdade de expressão é progressivamente limitada de modo a evitar ofender algum grupo ou outro. A liberdade de associação é progressivamente limitada para garantir que nenhum grupo será excluído com base em sua diferença. A liberdade de representação é progressivamente limitada para impedir que os nativos organizem uma oposição política. A liberdade econômica é progressivamente limitada - por exemplo, pela taxação - de modo a igualar resultados e financiar o aparato estatal de igualdade. Este, obviamente, cresce continuamente, se tornando cada vez mais intrusivo, invasivo, caro e opressivo. No Ocidente nós chegamos a uma fase em que expressar uma opinião no Twitter, com menos de 140 caracteres, pode resultar em uma condenação a prisão.
Também há outros efeitos que contribuem para uma atmosfera opressiva. Sociedades multirraciais sofrem de níveis mais elevados de criminalidade e níveis menores de confiança, ambos os quais destroem o espírito comunitário, reduzem a qualidade de vida e encorajam cidadãos a recuarem em casas cheias de alarmes com janelas gradeadas, às vezes por trás de condomínios fechados com patrulhas de segurança armada. Mesmo isso não oferece garantias, de modo que os cidadãos vivem em constante estado de medo: medo de ofender alguém; medo de expressar certas opiniões; medo de espaços públicos; medo de outros cidadãos; medo de ser associado a certos partidos políticos; e, no caso dos nativos, também medo de se opor à própria despossessão, mesmo que no fim não haja para onde fugir. Novamente, com exceção do último elemento, tudo o descrito acima existe em sociedades homogêneas, porém sob o multiculturalismo igualitário as fontes de medo se multiplicam, porque as variáveis se multiplicam.
Desumanidade
Como eu demonstrei em um outro artigo, a crença no bem moral da igualdade rouba da vida seu sentido, porque o sentido vem da diferença ou desigualdade. No processo, ela arranca tudo que faz da vida boa a digna de ser vivida, pois isso depende de sentido e de várias formas de diferença. Associada à moralidade igualitária é a noção de direitos humanos. Na ideologia liberal, se considera que os humanos possuem valor igual em dignidade e direitos. Porém, este não é realmente o caso, pois isso se aplica somente àqueles que acreditam na bondade moral da igualdade.
Se considera que humanos possuem direitos pela simples virtude de serem humanos. Ao mesmo tempo, é considerado um indicativo da própria humanidade reconhecer os direitos humanos. O tratamento de outros humanos que desconsidere abertamente os direitos humanos é descrito como "inumano", "bestial" ou "demoníaco". Uma descrição mais suave é "bárbaro", o que conota uma humanidade inferior.
Mas não é necessário praticar tortura ou algum homicídio cruel ou um extermínio em massa para se tornar, pelo menos pelo ponto de vista liberal, uma besta ou um demônio, porque simplesmente rejeitar a noção de que a igualdade é um bem moral absoluto possui o mesmo efeito. O racismo, por exemplo, implica essa rejeição. Portanto, basta apenas que alguém seja considerado "racista" para que ele seja tratado como alguém dotado de uma humanidade inferior. A animalização e demonização do recém identificado "racista" marca sua mudança em status.
A razão é simples: se o igualitarismo é moral, e se uma capacidade para a moralidade é o que nos faz humanos, o anti-igualitário é automaticamente inumano, e portanto uma besta ou um demônio.
Não obstante, a observação confirma que a regra não é aplicada de modo uniforme: a acusação de "racismo" é muito mais desumanizante para brancos do que para outros. Um negro no Ocidente pode se engajar em um comportamento gritantemente racista sem ter sua humanidade questionada. Por outro lado, um homem branco no Ocidente é julgada segundo parâmetros bem mais rigorosos: custa muito menos ele ser categorizado de "racista" e os efeitos do rótulo são para ele muito mais severos. Isso poderia potencialmente indicar uma pressuposição tácita entre liberais de que os negros já possuiriam de partida uma humanidade menor, e que os brancos possuiriam uma maior, pois isso explicaria a indulgência para com os primeiros e a severidade para com os segundos, mas isso está fora do escopo desse ensaio. Permanece verdadeiro porém, que uma vez considerado "racista", o diabo branco não mais desfruta dos mesmos direitos e privilégios que o "não-racista". Sua liberdade de expressão e associação podem ser pervertidas, restringidas ou negadas; sua propriedade e criações artísticas podem ser vandalizadas, confiscadas ou destruídas; e sua liberdade e meios de sobrevivência podem ser arrancados dele, às vezes sem uma explicação - tudo com total impunidade e aprovação universal. Pior ainda, aos olhos de amigos e parentes, aquele que é rotulado como "racista" deixa de ser uma pessoa, e qualquer tipo de abuso dirigido contra ele é possível. É, na verdade, visto como correto e plenamente justificado.
Essa pode ser uma das várias razões pelas quais sociedades comunistas, que viveram sob um sistema de igualitarismo radical, viram o pior tratamento e os piores extermínios em massa de seres humanos na história. Também pode ser por isso que tantos perderam as cabeças sob o estandarte de "liberdade, igualdade e fraternidade". Como eu afirmei algures, a busca da igualdade implica a destruição do valor, e torna toda vida humana equivalente e substituível. Se, ainda por cima, nós acrescentarmos uma lógica moral que desumaniza aqueles que rejeitam aquela lógica, nós culminamos em uma situação que começa com chamar alguém de "racista", "reacionário" ou "burguês" e termina na guilhotina ou em um gulag siberiano.