(2020)
A história está sempre aberta, como todos sabem, e isso a torna imprevisível. Mas, em certas circunstâncias, é mais fácil ver o médio e longo prazo do que o curto prazo, como mostra bem a pandemia do coronavírus. No curto prazo, certamente se imagina o pior: sistemas de saúde saturados, centenas de milhares, até milhões de mortos, rupturas de cadeias de suprimentos, tumultos, caos e tudo o que se seguirá. Na realidade, estamos sendo levados por uma onda e ninguém sabe aonde ela vai levar ou quando vai acabar. Mas, se olharmos mais além, certas questões se tornam evidentes.
Já foi dito, mas vale repetir: a crise de saúde está soando (provisoriamente?) o toque de morte da globalização e da ideologia hegemônica do progresso. Com certeza, as grandes epidemias da Antiguidade e da Idade Média não precisavam da globalização para produzir dezenas de milhões de mortos, mas é claro que a generalização dos transportes, das trocas e das comunicações no mundo contemporâneo só poderia agravar as coisas. Na “sociedade aberta”, o vírus é muito conformista: age como todo mundo, circula – e agora nós não estamos mais circulando. Em outras palavras, estamos rompendo com o princípio da livre circulação de pessoas, bens e capitais, que se resumia no slogan “laissez faire”, ou seja, deixe ir, deixe passar. Isto não é o fim do mundo, mas é o fim de um mundo.