A geopolítica há muito tempo tem sido rejeitada pela opinião pública. Após a Segunda Guerra Mundial, ela se tornou a mais impopular das ciências sociais. Ela tem sido acusada de ser uma "ciência alemã" que não significava muito, exceto que devia seu ímpeto inicial aos princípios de geografia política enunciados pelo geógrafo alemão Friedrich Ratzel - o termo "geopolítica" tendo sido usado pela primeira vez pelo geógrafo sueco Rudolf Kjéllen em 1889. Em seu livro "Politische Geographie oder die Geographie der Staaten, des Verkehrs und des Krieges (1897)" Ratzel analisou as interações do Estado, considerado como corpo vivo, em termos de sua geografia e seu espaço. Um de seus discípulos foi o general bávaro Karl Haushofer, fundador da "Zeitschrift für Geopolitik". Foi apenas por uma óbvia confusão entre espaço no sentido geopolítico e "Lebensraum" que uma conexão/proximidade entre Karl Haushofer e o Nacional-Socialismo foi posta em questão. E isso de forma equivocada, e não apenas porque Haushofer nunca foi um ideólogo do Terceiro Reich. Mais importantemente, Hitler tinha muito mais simpatia pelos anglo-saxões do que ele tinha pelos eslavos. Ele travou uma guerra contra a Rússia, uma potência continental, e teria preferido se aliar à Grã-Bretanha, uma potência marítima. Se ele tivesse se subscrito à tese da geopolítica ele teria feito exatamente o oposto.
Ademais, a definição do campo de estudo dessa disciplina ou de seu status jamais deixou de ser um problema. A geopolítica estuda a influência da geografia sobre a política e a história, isto é, a relação entre espaço e poder (político, econômico ou outro). Ainda assim a definição permanece pouco clara, o que explica que a realidade tanto do conceito como da relação com seu objetivo foram disputadas. Ela, portanto, tem sido descrita como uma disciplina objetivando legitimar retrospectivamente eventos históricos ou decisões políticas.
Essas críticas, porém, não chegam ao âmago das coisas: Que podemos identificar através da história, constantes geográficas de ação política é, de fato, indisputável. A geopolítica permanece assim, uma disciplina de grande valor e grande importância. É até mesmo essencial se referir a ela em um mundo em transição, onde todas as cartas estão sendo redistribuídas ao redor do mundo. A geopolítica põe em perspectiva o peso de fatores meramente ideológicos, instáveis por definição, e relembra a existência de grandes constantes que transcendem regimes políticos bem como debates intelectuais.
De todos os conceitos específicos à Geopolítica, um dos mais significativos é indubitavelmente a oposição dialética entre Mar e Terra. "A história mundial", disse Carl Schmitt, "é a história do conflito entre potências marítimas contra potências continentais e de potências continentais contra potências marítimas". Era também a opinião do Almirante Castex bem como o de muitos outros geopolíticos. Halford Mackinder, por exemplo, define o poder da Grã-Bretanha pela dominação dos oceanos e mares. Ele percebe o planeta como uma totalidade composta de um "Oceano Global" e uma "Ilha Global", correspondendo a todo o espaço eurasiano bem como a África, e "ilhas periféricas", América e Austrália. Para dominar o mundo, devemos tomar a ilha global e primariamente o seu "coração", o Coração Continental, o pivô geográfico do mundo real se estendendo da Europa Central à Sibéria Ocidental e na direção do Mediterrâneo, do Oriente Médio e Sul Asiático. Um dos primeiros grandes navegadores ingleses, Sir Walter Raleigh, costumava dizer: "Quem controla os mares controla o comércio mundial; quem controla o comércio mundial tem todos os tesouros do mundo em sua posse, e de fato, todo o mundo".
Na história da humanidade, o confronto entre Terra e Mar é um conflito milenar entre a lógica continental européia e a lógica "insular" representada atualmente pelos EUA. Mas a oposição entre Terra e Mar vai muito além das perspectivas oferecidas pela Geopolítica. A Terra é um espaço formado por territórios diferenciados por fronteiras. Sua lógica é baseada em distinções claras entre guerra e paz, combatentes e não-combatentes, ação política e comércio. É portanto o lugar da política e da história por excelência. "A existência política é pura natureza telúrica" (Adriano Scianca). O mar é uma área/extensão homogênea, a negação de diferenças, limites e fronteiras. É um espaço de indiferenciação, o equivalente líquido do deserto. Sendo desprovido de centro, ele conhece apenas fluxos e refluxos e é assim que ele se relaciona à globalização pós-moderna. O mundo efetivo é de fato um mundo "líquido" (Zygmunt Bauman), que tende a eliminar tudo que é "terreno", estável, sólido, consistente, sustentável e diferenciado. É um mundo de fluxo operado por redes. O comércio em si, bem como sua lógica, é formado à maneira de fluxos e refluxos.
A geopolítica recuperou sua legitimidade com os vários conflitos que emergiram desde a década de 70. A maioria desses conflitos foram iniciados pelos EUA. Marcados desde suas origens puritanas pela convicção de serem "o novo povo eleito", os americanos tem tentado se estabelecer como um modelo universal, que traria ao mundo os benefícios do "american way of life" isto é, um modelo de civilização comercial, baseado na primazia do valor de troca e da lógica do lucro. Essa missão planetária seria seu "Destino Manifesto". A geopolítica é precisamente a disciplina que ajuda a explicar as constantes de sua política externa.
O desmonte da União Soviética, ao mesmo tempo tornou a globalização possível e marcou o desaparecimento de um tremendo competidor para a potência americana que então teve a tentação de moldar um mundo unipolar sob sua hegemonia. (O que tem sido chamado "Nova Ordem Mundial") Após o desmonte soviético os EUA se encontraram como um "Império sem sombra" (Eric Hobsbawm). Confiantes em sua superioridade tecnológica, em seu poderio militar, nos benefícios dados pelo sistema do dólar, eles pensaram que um "século americano" estava por vir. Convencidos a serem desse ponto em diante a única superpotência mundial, eles pretenderam desempenhar o papel de "polícia mundial". Os neoconservadores estiveram na vanguarda desse projeto. Essa foi a época em que Francis Fukuyama pensou que poderia anunciar o "Fim da História", nomeadamente o triunfo do capitalismo liberal e da democracia dos direitos humanos como o horizonte insuperável de nosso tempo.
Ao fim da década de 90, Arbatov, assessor de Gorbachev, declarou aos americanos: "Nós estamos dando a vocês o pior golpe: os estamos privando de seu inimigo". Palavras significativas. O desaparecimento do "Império Maligno" soviético ameaçou erradicar toda legitimidade da hegemonia americana sobre seus aliados. Isso significaria que, daí em diante, os americanos precisavam encontrar um inimigo alternativo, que representasse uma ameaça, real ou imaginária, que lhes permitiria se estabelecerem como mestres da "Nova Ordem Mundial". É o Islã radical, algo que eles constantemente encorajaram em décadas anteriores, que representará esse papel. Mas na realidade, seu objetivo fundamental permanece imutável. E este é impedir, em qualquer lugar do mundo, a emergência de um rival capaz de competir com eles e mais importante controlar o Coração Continental, a "ilha global".
Em seu livro O Grande Tabuleiro de Xadrez, publicado em 1997, Zbigniew Brzezinski enumera explicitamente os "imperativos geoestratégicos" que o EUA devem preencher para preservar sua hegemonia global. Descrevendo um projeto de "gerenciamento global" do mundo, ele alerta contra a "criação ou emergência de uma coalizão eurasiana" que "poderia buscar desafiar a supremacia americana". Em 2001, Henry Kissinger já dizia: "A América deve manter uma presença na Ásia, e seu objetivo geopolítico deve ser continuar a impedir que a Ásia se organize em um bloco não amistoso". Brzezinski relembrou por sua vez: "Quem controla a Eurásia, controla o mundo".
Controlar a Eurásia, significa, em primeiro lugar, adotar uma estratégia de cerco da Rússia e da China. A estratégia do cerco à Rússia inclui a instalação de novas bases militares na Europa Oriental, o estabelecimento de sistemas de defesa anti-mísseis na Polônia, República Tcheca e Romênia, apoiar o ingresso da Ucrânia e da Geórgia na OTAN, e perseguir uma política agressiva objetivando deslocar a influência russa em regiões importantes ao redor do Mar Negro, do Mar Cáspio e do Cáucaso. Em termos de fornecimento de energia, essa estratégia leva ao controle dos dutos da Ásia Central - a Ásia Central sendo transformada em um protetorado americano - encorajando o desenvolvimento de dutos no Mar Cáspio para circundar a Rússia e chegar à Turquia, bem como limitar o máximo possível o acesso de petroleiros russos aos estreitos do Bósforo e dos Dardanelos. É dentro desse contexto que devemos situar as "revoluções coloridas" na Sérvia (2000), Geórgia (2003), Ucrânica (2004) e Quirguizistão. Longe de serem movimentos espontâneos, estes foram organizados e apoiados desde fora com o incentivo do Fundo Nacional para a Democracia, uma fachada conveniente para a CIA.
O estabelecimento de um "arco de crise" para desestabilizar a esfera de influência tradicional russa no Cáucaso, Afeganistão e Ásia Central só pode ser compreendido nesse contexto. Usando a suposta "Guerra ao Terror": no Afeganistão os EUA e seus aliados estabeleceram bases militares nas antigas repúblicas soviéticas, incluindo, Tadjiquistão e Quirguizistão. O objetivo pode ser resumido em três palavras: cercar, desestabilizar, balcanizar.
Em paralelo e simultaneamente, eles tomaram a iniciativa de expandir maciçamente a OTAN na Europa Oriental e nos Balcãs até a fronteira russa, mesmo dentro da antiga URSS. Em 11 de Setembro de 2001, o Presidente George Bush tomou posição em favor de "uma grande OTAN do Mar Báltico ao Mar Negro" para pavimentar o caminho do Mar Cáspio e do Mar Negro. Isso é partir de uma estrutura relativamente estática a um modelo expedicionário de intervenções neocoloniais em todas as direções, centros geoestratégicos globais de gravidade escorregando, assim, na direção do Oriente Médio e da Ásia.
Manter a OTAN possui dois outros objetivos. O primeiro é continuar a dissuadir a União Européia de construir uma força de defesa européia comum e autônoma. Os americanos sempre consideraram que defesa européia significava para eles "o estabelecimento do pilar europeu da OTAN". O segundo objetivo é enfraquecer as relações entre Rússia e Europa Ocidental. A Alemanha é um alvo principal, dada a extensão de suas trocas tecnológicas, energéticas e econômicas com a Rússia. Nesse projeto, a União Européia se torna uma reles cabeça-de-ponte americana na Eurásia.
No Oriente Médio, onde eles confrontam sérios desafios devido a instabilidade da região, o insucesso de suas intervenções militares e o isolamento crescente de seu aliado israelense, os EUA estão desenvolvendo uma estratégia agressiva para responder à ascensão do Irã, que os preocupa por causa de seus recursos energéticos, sua relação privilegiada com China e Rússia, e sua influência crescente no Iraque e nos países do Golfo onde há minorias xiitas significativas. Finalmente, eles estão atualmente engajados em um retorno espetacular à África, por duas razões, para contrabalançear a influência da China e levar em consideração a importância crescente da África em termos de suprimentos energéticos globais.
Para desenvolver essa política agressiva, os EUA não carecem de meios tecnológicos e financeiros. Apesar de suas dificuldades financeiras e seus déficits excepcionais, seu orçamento militar, que cresce cada vez mais, está agora próximo dos 700 bilhões de dólares, uma quantia colossal, e equivalente a mais de 40% de todos os orçamentos militares combinados no mundo.
Porém, levanta-se a questão sobre se os EUA não alcançaram os limites de sua capacidade de expansão imperial. Suas questões domésticas pioram. O sistema do dólar, sobe o qual eles capitalizam, está à beira do colapso. A crise financeira global que começou lá em 2008 os atingiu com força. A sua balança comercial negativa e a dívida pública ultrapassam recordes.
Enquanto isso, na Rússia, Vladimir Putin, que claramente percebeu suas intenções, rompeu claramente com a era catastrófica sob Bóris Yeltsin, que havia santificado a onipotência dos "oligarcas".
Os eventos mais recentes relacionados à guerra civil na Síria ressaltaram novamente a importância da geopolítica. A perspicácia extrema de Vladimir Putin e seu Ministro do Exterior, Sergei Lavrov contra a indecisão de Barack Obama e a ingenuidade de François Hollande foram sintomáticas. Com sua intervenção na questão síria, a Rússia resgatou o seu papel como potência global importante e assim mostrou que ela não é uma parte negligenciável nas questões internacionais, e sim que ela deve ser considerada no futuro.
O "momento unipolar" portanto não durou nem 10 anos. Os americanos, que agora representam apenas 5% da população mundial, superestimaram sua força. O cerco a suas tropas no Iraque e Afeganistão, suas questões domésticas, seus déficits abissais, a instabilidade do sistema dólar e a crise financeira global lhes impôs limites. Torna-se rapidamente aparentem que eles não governarão o mundo inconteste. A História, cujo fim foi anunciado por Fukuyama, já retornou.
Um mundo multipolar está emergindo no esteio da rápida ascensão da China, seguida por Índia, Brasil e até mesmo Irã. Economias emergentes estão crescendo dramaticamente. Sua parte no PIB mundial em termos de paridade de poder de compra foi de 36% para 45% em 2008 e deve alcançar 51% em 2014.
A estratégia eurasiana levou, como reação, a uma reaproximação significativa entre Rússia e China, a qual se materializou na Organização de Cooperação de Xangai, fundada em junho de 2001, que também inclui quatro países da Ásia Central (Cazaquistão, Quirguizistão, Tadjiquistão e Uzbequistão) enquanto Irã, Mongólia, Índia e Afeganistão participam como observadores.
Nós sabemos que em anos recentes, o Irã fortaleceu seus laços com China e Rússia. Essa aliança pragmática se materializa hoje utilizando apoios geopolíticos mútuos que tem levado alguns observadores a considerar a possibilidade de testemunhar, nos anos vindouros, a ascensão de um tipo de "novo Império Mongol". Entre 1206 e 1294, o Império Turco-Mongol de Gengis Khan se estendeu pela Ásia Central antes de se dividir em quatro blocos. Hoje , a OCX, cujo principal objetivo é combater a influência americana na Ásia Central, está associada novamente com Rússia, China e Irã, três diferentes países, que ainda assim formam uma comunidade real de interesses que representam 1.5 bilhões de pessoas. A grande diferença em relação ao antigo Império Mongol, porém, é que o Irã de hoje vê a Turquia como uma potência regional rival.
Desde o fim do sistema soviético, nós entramos em um interregnum - uma Zwischenzeit. O antigo Nomos da Terra já se foi, mas só se pode especular sobre os contornos de um novo Nomos. O atual grande conflito global é um que opõe o poder continental eurasiano à talassocracia americana. A principal questão é se estamos nos dirigindo a um mundo unipolar, um universum, ou a um mundo multipolar, um pluriversum.
O problema é que os europeus raramente tem consciência disso. Os americanos podem ter muitos defeitos, mas há algo que não lhes pode ser negado, e é o fato de que eles tem consciência do que está em jogo no âmbito global e tentam pensar o mundo vindouro. Na Rússia e na China também, eles pensam o mundo vindouro. Os europeus não. Eles se importam apenas com o momento presente. Eles vivem sob um horizonte de destino, com instituições que os condenam à impotência e à paralisia. A Europa vive em um estado de ausência de peso. Encarando uma crise moral sem precedentes, o problema da imigração, uma população cada vez mais velha, offshoring econômico e competição global. Parece que a Europa não pode defender sua posição em um mundo globalizado. Portando uma identidade que ela (Europa) não pode mais definir, assombrada pelo desejo secreto de se retirar da História - assim correndo o risco de se tornar o objeto da história do Outro - os homens pensantes por todo lado são da mesma disposição. A Europa está agora "pobre-no-mundo" (Heidegger). Ela (Europa) parece exausta, acometida pela lassidão que leva a não querer nada. A geopolítica da impotência? A ascensão da insignificância? As notas de euro são como seu reflexo: elas representam apenas o vazio.
No passado, a geopolítica aplicou seus limites principalmente a nível estatal, os mesmos Estados que parecem ter adentrado uma crise irreversível, pelo menos no hemisfério ocidental. Agora, depende da lógica dos continentes que há muito tem estado ocultos sob as condutas desordenadas dos Estados, mas que agora são mais fundamentais do que nunca. Ela (a geopolítica) ajuda a pensar em termos não apenas de países, mas também de continentes (Jordis von Lohausen). O Mar contra a Terra, agora são os EUA contra o "resto do mundo", e primeiro contra o bloco continental eurasiano e europeu. Nesse sentido, o colapso do sistema soviético clarificou as coisas. Há agora apenas duas posições possíveis: ou se está ao lado do poder marítimo americano ou se está ao lado do poder continental europeu. Eu estou com este último.
Para desenvolver essa política agressiva, os EUA não carecem de meios tecnológicos e financeiros. Apesar de suas dificuldades financeiras e seus déficits excepcionais, seu orçamento militar, que cresce cada vez mais, está agora próximo dos 700 bilhões de dólares, uma quantia colossal, e equivalente a mais de 40% de todos os orçamentos militares combinados no mundo.
Porém, levanta-se a questão sobre se os EUA não alcançaram os limites de sua capacidade de expansão imperial. Suas questões domésticas pioram. O sistema do dólar, sobe o qual eles capitalizam, está à beira do colapso. A crise financeira global que começou lá em 2008 os atingiu com força. A sua balança comercial negativa e a dívida pública ultrapassam recordes.
Enquanto isso, na Rússia, Vladimir Putin, que claramente percebeu suas intenções, rompeu claramente com a era catastrófica sob Bóris Yeltsin, que havia santificado a onipotência dos "oligarcas".
Os eventos mais recentes relacionados à guerra civil na Síria ressaltaram novamente a importância da geopolítica. A perspicácia extrema de Vladimir Putin e seu Ministro do Exterior, Sergei Lavrov contra a indecisão de Barack Obama e a ingenuidade de François Hollande foram sintomáticas. Com sua intervenção na questão síria, a Rússia resgatou o seu papel como potência global importante e assim mostrou que ela não é uma parte negligenciável nas questões internacionais, e sim que ela deve ser considerada no futuro.
O "momento unipolar" portanto não durou nem 10 anos. Os americanos, que agora representam apenas 5% da população mundial, superestimaram sua força. O cerco a suas tropas no Iraque e Afeganistão, suas questões domésticas, seus déficits abissais, a instabilidade do sistema dólar e a crise financeira global lhes impôs limites. Torna-se rapidamente aparentem que eles não governarão o mundo inconteste. A História, cujo fim foi anunciado por Fukuyama, já retornou.
Um mundo multipolar está emergindo no esteio da rápida ascensão da China, seguida por Índia, Brasil e até mesmo Irã. Economias emergentes estão crescendo dramaticamente. Sua parte no PIB mundial em termos de paridade de poder de compra foi de 36% para 45% em 2008 e deve alcançar 51% em 2014.
A estratégia eurasiana levou, como reação, a uma reaproximação significativa entre Rússia e China, a qual se materializou na Organização de Cooperação de Xangai, fundada em junho de 2001, que também inclui quatro países da Ásia Central (Cazaquistão, Quirguizistão, Tadjiquistão e Uzbequistão) enquanto Irã, Mongólia, Índia e Afeganistão participam como observadores.
Nós sabemos que em anos recentes, o Irã fortaleceu seus laços com China e Rússia. Essa aliança pragmática se materializa hoje utilizando apoios geopolíticos mútuos que tem levado alguns observadores a considerar a possibilidade de testemunhar, nos anos vindouros, a ascensão de um tipo de "novo Império Mongol". Entre 1206 e 1294, o Império Turco-Mongol de Gengis Khan se estendeu pela Ásia Central antes de se dividir em quatro blocos. Hoje , a OCX, cujo principal objetivo é combater a influência americana na Ásia Central, está associada novamente com Rússia, China e Irã, três diferentes países, que ainda assim formam uma comunidade real de interesses que representam 1.5 bilhões de pessoas. A grande diferença em relação ao antigo Império Mongol, porém, é que o Irã de hoje vê a Turquia como uma potência regional rival.
Desde o fim do sistema soviético, nós entramos em um interregnum - uma Zwischenzeit. O antigo Nomos da Terra já se foi, mas só se pode especular sobre os contornos de um novo Nomos. O atual grande conflito global é um que opõe o poder continental eurasiano à talassocracia americana. A principal questão é se estamos nos dirigindo a um mundo unipolar, um universum, ou a um mundo multipolar, um pluriversum.
O problema é que os europeus raramente tem consciência disso. Os americanos podem ter muitos defeitos, mas há algo que não lhes pode ser negado, e é o fato de que eles tem consciência do que está em jogo no âmbito global e tentam pensar o mundo vindouro. Na Rússia e na China também, eles pensam o mundo vindouro. Os europeus não. Eles se importam apenas com o momento presente. Eles vivem sob um horizonte de destino, com instituições que os condenam à impotência e à paralisia. A Europa vive em um estado de ausência de peso. Encarando uma crise moral sem precedentes, o problema da imigração, uma população cada vez mais velha, offshoring econômico e competição global. Parece que a Europa não pode defender sua posição em um mundo globalizado. Portando uma identidade que ela (Europa) não pode mais definir, assombrada pelo desejo secreto de se retirar da História - assim correndo o risco de se tornar o objeto da história do Outro - os homens pensantes por todo lado são da mesma disposição. A Europa está agora "pobre-no-mundo" (Heidegger). Ela (Europa) parece exausta, acometida pela lassidão que leva a não querer nada. A geopolítica da impotência? A ascensão da insignificância? As notas de euro são como seu reflexo: elas representam apenas o vazio.
No passado, a geopolítica aplicou seus limites principalmente a nível estatal, os mesmos Estados que parecem ter adentrado uma crise irreversível, pelo menos no hemisfério ocidental. Agora, depende da lógica dos continentes que há muito tem estado ocultos sob as condutas desordenadas dos Estados, mas que agora são mais fundamentais do que nunca. Ela (a geopolítica) ajuda a pensar em termos não apenas de países, mas também de continentes (Jordis von Lohausen). O Mar contra a Terra, agora são os EUA contra o "resto do mundo", e primeiro contra o bloco continental eurasiano e europeu. Nesse sentido, o colapso do sistema soviético clarificou as coisas. Há agora apenas duas posições possíveis: ou se está ao lado do poder marítimo americano ou se está ao lado do poder continental europeu. Eu estou com este último.