por Alain de Benoist
A Nova Direita obviamente não teve que introduzir o nome de Ernst Jünger na França. Quando a Nova Direita apareceu ao fim da década de 60, o autor de Nos Penhascos de Mármore já era bem conhecido para o público francês. De fato, Jünger era certamente o escritor alemão mais famoso e mais lido desse lado do Reno. Essa situação, que sempre assombra os alemães, é explicada de múltiplas maneiras.
Jünger, em primeiro lugar, foi traduzido relativamente cedo: suas principais obras sobre a Primeira Guerra Mundial apareceram no início da década de 30, e elas imediatamente o tornaram famoso. Mas acima de tudo, a França desempenhou um papel importante na carreira de Jünger, bem como em sua vida e sua formação espiritual e literária. Desde sua escapada juvenil na Legião Estrangeira, desde a terrível experiências das trincheiras, a França jamais deixou de ocupar um lugar significativo no coração de Jünger, evidente nas muitas relações que ele manteve com pessoas francesas, sua leitura de Barrès ou Léon Bloy, mas também as traduções que ele próprio fez das Maxims de Rivarol ou textos de Guy de Maupassant e Paul Léautaud.
Finalmente, Jünger teve a boa sorte de sempre encontrar tradutores franceses de grande talento, desde Henri Thomas e Henri Plard a Julien Hervier de François Poncet, agudamente sensíveis a seu estilo e a seu pensamento para retrarar todas as suas nuances.
"Eu penso", disse Jünger em 1973, "que os franceses podem apreciar quando um alemão se apresenta enquanto tal ao invés de buscar a todo custo assumir uma face que não é a sua".
Essa celebridade, porém, foi conquistada durante um longo tempo somente às custas de certa ambiguidade. Pelo menos até por volta de 1975, o francês percebia Ernst Jünger como uma figura pertencendo exclusivamente ao mundo literário. É claro que o background político-histórico de sua obra era conhecido, mas ele não parecia ser um ator nesse período, e em relação a sua estadia em Paris sob a Ocupação, na maior parte, apenas suas relações literárias eram lembradas (Jean Cocteau, Paul Morand, Pierre Drieu La Rochelle, Sacha Guitry, Jean Giraudoux, Henry de Montherlant, Jean Schlumberger, etc.), em sua maior parte conectados ao salão de Florence Gould. Não tinha o próprio Jünger descrito Paris como "a grande cidade dos livros"? Seus escritos políticos juvenis eram completamente ignorados, ao menos pelo público geral. Os nomes de Franz Schauwecker, Hugo Fischer, Ernst Niekisch, Friedrich Hielscher, e mesmo Carl Schmitt eram também desconhecidos. Em resumo, Jünger era visto como escritor e nada mais. Ademais, o próprio Jünger estava aparentemente não só bastante satisfeito com essa situação mas contribuiu para ela à sua própria maneira, já que ele por muito tempo se recusou a permitir uma tradução francesa de seu grande livro de 1932, Der Arbeiter.
Porém, foram precisamente seus livros não traduzidos - que como consequência possuíam uma aura mítica - que rapidamente atraíram o interesse da Nova Direita. Desde o início da década de 60, eu mesmo só conhecia os livros de Jünger que já haviam sido publicados em francês. Eu havia lido, é claro, seus relatos da Primeira Guerra Mundial, mas - talvez diferentemente de alguns de meus amigos - eles não haviam me impressionado, certamente por causa de minha falta de interesse por questões militares! Nos Penhascos de Mármore (Auf den Marmorklippen) e Jogos Africanos (Afrikanische Spiele) haviam me interessado mais, bem como Heliopolis e especialmente o Tratado sobre o Rebelde ou o Recuo às Florestas (Der Waldgang). O Estado Universal (Der Weltstaat), por outro lado, me repeliu consideravelmente.
Obviamente, eu devo a descoberta do "outro Jünger" a meu amigo Armin Mohler. Seu Handbuch der Konservative Revolution, que eu tentei decifrar com meu então rudimentar alemão, foi uma revelação. Nesse vasto movimento com suas inúmeras ramificações, eu de modo algum vi uma corrente de pensamento que era meramente uma Wegbereiter do Nacional-Socialismo, como às vezes tem sido dito, mas ao contrário, um curso alternativo cujo desenvolvimento e uma melhor estruturação poderia ter talvez salvo o mundo do desastre hitlerista.
Em nossas conversas, Armin Mohler muitas vezes falava sobre Jünger, de quem ele havia sido secretário particular por muitos anos após a guerra e por quem, com base em sua própria experiência, ele nutria sentimentos um tanto quanto ambivalentes. Enquanto eu considerava o jovem movimento conservador o mais interessantes, politicamente e intelectualmente, ele não ocultava sua predileção pela corrente nacional-revolucionária. Eu era mais reservado do que ele no valor intrínseco dos conceitos de "nação" e "movimento", mas a ideia de revolução inegavelmente me seduzia.
Graças a Mohler, eu descobri que Jünger havia colaborado em publicações "neonacionalistas" ou bündisch como Arminius, Die Standarte ou Die Kommenden, que ele havia publicado Der Arbeiter e Die total Mobilmachung, que ele estava conectado ao "Nacional-Bolchevique" Ernst Niekisch. Eu descobri também os desenhos de A. Paul Weber, que me causaram grande impressão. Tudo que é bem conhecido hoje, mas à época foi, ao menos para mim, completamente novo.
Eu me apressei a comunicar minhas descobertas. Eu voltei repetidamente ao Handbuch der Konservative Revolution, ao mesmo tempo prometendo a mim mesmo publicar uma tradução. O primeiro resultado desses esforços foi a republicação pelo GRECE (Groupement d'études et de recherche pour la civilisation européenne, a principal associação do que ainda não se chamava ainda a Nova Direita) na forma de um pequeno livreto de um dos raros textos já publicados na França sobre Der Arbeiter: Marcel Decombis, Ernst Jünger et la "Konservative Revolution". Une analyse de "Der Arbeiter" (GRECE, Paris 1973). A obra de um falecido germanista, este texto foi ampliado por uma curta bibliografia e um prefácio original escrito por Armin Mohler, que apresentou a obra de Jünger como "um dos raros grandes livros desse século", mas também como um "bloco errático" entre suas obras, e qualificou sua publicação em 1932 como um "evento extraordinário". Falando de O Trabalhador e da primeira versão de O Coração Aventuroso (Das Abenteuerliche Herz), ele também disse: "Hoje ainda minha mãe não pode tocar essas obras sem começar a tremer".
Em seu Prefácio, Mohler também disse - com três repetições - que Der Arbeiter era uma obra "intraduzível". Ela, porém, acabou sendo traduzida em 1989 por Julien Hervier, sem, ademais, realmente atiçar a polêmica que Jünger havia temido por algum tempo.
Nessa época, eu ainda não havia conhecido Jünger pessoalmente. Porém, em 15 de maio de 1977, enquanto eu participava do Festival Internacional do Livro em Nice tanto pela Figaro-Magazine como pelas Éditions Copernic que tinham um stand ali (eu havia acabado de receber o Grand Essay Prize da Académie Française por meu livro Vu de Droite), eu pretendia me apresentar. Eu me virei e vi um homem de altura mediana, bastante ereto, com um elmo de cabelo branco, que vestia uma jaqueta de cotelê sobre um belo sweater de gola rolê. Eu não o reconheci de modo algum. "Olá", ele disse, "Eu sou Ernst Jünger". Eu fiquei sem palavras. Naquele dia conversamos por mais de uma hora. Fotografias foram tiradas. Uma grande e bela memória.
Enquanto isso, quase dez anos após a publicação do livreto de Marcel Decombis, eu havia reunido documentos suficientes sobre o período "político" juvenil de Jünger para escrever meu próprio estudo sobre Der Arbeiter. A primeira versão foi publicada ao fim de 1981 em Eléments, então outra, mais longa apareceu dois anos depois em Nouvelle Ecole. A segunda, que foi seguida por uma tradução de um artigo por Ernst Niekisch publicado em Widerstand em outubro de 1932 ("Zu Ernst Jüngers neuem Buche"), era na verdade uma autêntica monografia que foi depois publicada como livro em traduções espanholas e italianas. Eu fiz um esforço não só de apresentar os principais conceitos de Der Arbeiter e de traçar o desenvolvimento do autor nas décadas de 20 e 30 discutindo alguns dos marcos na história do movimento nacional-revolucionário, mas também para mostrar como o "problema do Trabalhador" continuou a reaparecer nas obras posteriores de Jünger, obviamente de diferentes formas, particularmente a evolução de suas ideias sobre a tecnologia sob a influência de seu irmão, Friedrich Georg Jünger. Eu apresentei Der Arbeiter como indispensável para a compreensão do período transicional definido como um "interregnum" entre o reino dos Titãs e o dos Deuses. Eu também fiz muitas referências ao pensamento de Carl Schmitt e à filosofia de Martin Heidegger, com os quais eu já havia então me familiarizado.
Em 29 de março de 1985, aniversário de 90 anos de Jünger, eu lhe enviei um telegrama pouco após um encontro público no qual eu havia tomado parte em Saint-Etienne. Ele me agradeceu com uma curta carta manuscrita à qual uma fotografia estava anexada. Dez anos depois, em 25 de março de 1995, eu lhe enviei uma carta que continha somente estas palavras: "Obrigado por estar vivo". Para celebrar seu centenário, o Club des Mille (a associação de apoio financeiro da Nova Direita) organizou uma tarde em sua honra em 21 de junho em Paris.
Em 1996, eu decidi devotar toda uma edição do Nouvelle Ecole a Jünger. O editorial que eu assinei ali começava com estas palavras: "O século XX é o século em que o Prêmio Nobel não foi dado a Ernst Jünger. É uma maneira tão boa de defini-lo como qualquer outra". A edição incluía uma entrevista com Jünger por seu tradutor espanhol, Andrés Sánchez Pascual; ensaios de Armin Mohler, Gerd-Klaus Kaltenbrunner, Werner Bräuninger, Marcus Beckman, Serge Mangin e Pierre Wanghen; e também a tradução de documentos de Friedrich Hielscher, Albrecht Erich Günther, Ernst Niekisch e Friedrich Sieburg.
Jünger parecia ter se tornado imortal! Ao fim de 1997, eu publiquei uma bibliografia de sua obra com um editor suficientemente corajoso (ou ignorante) para lançar esse tipo de obra, que por definição sempre encontra um público bastante restrito. Essa bibliografia, com a qual eu não estava inteiramente satisfeito, deveria ter recebido uma edição nova e bem maior, na qual eu trabalhei por anos, mas eu finalmente desisti quando Nicolai Riedel, o digno sucessor de Hans Peter des Coudres e Horst Mühleisen, publicou sua bibliografia em 2003. (Desde então meu trabalho como bibliógrafo tem ao invés se concentrado em Carl Schmitt!). No início, eu revisei as principais fases da vida de Jünger. Chegando a 1997, eu escrevi: "Tendo entrado em seu 103º ano, ele continua a escrever". Infelizmente, poucos meses depois, em 17 de fevereiro de 1998, ele faleceu. Eu prestei homenagem a ele em 7 de março em um programa da Radio-Courtoisie.
Desde então, Jünger tem sido estudado mais do que nunca. Em 7 de novembro de 1995 eu já havia tomado parte em uma conferência sobre Jünger organizada na Universidade La Sapienza em Roma sob o título "Duas Vezes o Cometa" (aludindo ao fato de que Jünger vive para ver dois aparecimentos do Cometa Halley). Eu também tomei parte em uma longa conferência sobre Jünger realizada em Milão de 20-24 de outubro de 2000, onde em particular eu tive a ocasião de conhecer o jovem filho de Nicolai Riedel, no dia antes de um concerto de Ricardo Mutti no La Scala. Ao fim de uma "peregrinação" ao Chemin des Dames, eu também fui a uma conferência sobre Jünger e a Primeira Guerra Mundial em Laon, em 8 de novembro de 1998. Danièle Beltran-Vidal, François Poncet, Isabelle Rozet, Olivier Aubertin, Manuela Alessio, e alguns outros também participaram.
Minha admiração por Jünger - pelo homem e sua obra - jamais desapareceu. Mas talvez ela tenha mudado um pouco de direção. Trinta anos atrás, eu estava repleto de entusiasmo pelo "primeiro" Jünger das décadas de 20 e 30. Com o tempo, e assim com a idade, eu indubitavelmente me tornei mais apreciador do "segundo" Jünger - do Anarca e mais ainda do Rebelde, do pensador "atemporal" que, tendo se erguido mais alto, também vê mais longe.
Eu gostaria de acrescentar aqui uma memória bastante pessoal. Em 6 de fevereiro de 1993, tendo sido convidado a participar de um debate em Berlim, eu tive a desagradável experiência de ser fisicamente atacado por um grupo de jovens militantes "autônomos" defendendo um arcaico "antifascismo" que nem ao menos sabiam que eu havia vindo falar contra a xenofobia! Retornando a Paris após uma noite gasta olhando para fotografia policiais tentando identificar meus atacantes, eu recebi um telefonema de Armin Mohler. Ele me contou que Jünger, que havia ficado sabendo do incidente, imediatamente quis saber de minha condição. Esse gesto me tocou em demasia.
Ernst Jünger provavelmente não foi um dos autores mais frequentemente citados pela Nova Direita francesa, mas não há dúvidas, como vimos, de que ele foi bastante discutido. Hoje, não há mais a necessidade de uma imagem "completa" de Jünger na França. Os vários aspectos de sua obra são agora bem conhecidos. Como Schmitt e Heidegger, ou Mircea Eliade, Jünger foi também, em um momento ou outro, o objeto de críticas na forma de denúncias. Elas emanam de espíritos sectários que não só são anacrônicos, mas somente lidam com Jünger para chegar a conclusões em conformidade com os preconceitos que eles já possuíam no início. Essas abordagens permanecem bastante minoritárias. Admissivelmente, Jünger ainda é raramente citado por intelectuais populares. É necessário ir à Itália para encontrar intelectuais de todas as opiniões, esquerda ou direita, citando Jünger constantemente (assim como eles também constantemente citam Schmitt e Heidegger). Mas os leitores do autor de Eumeswil e Caçadas Sutis (Subtile Jagden) permanecem numerosos.
Hoje, praticamente todos os livros de Jünger foram traduzidos ao francês; eles são publicados pelas maiores casas; e a maioria é constantemente reimpressa. Os Diários de Guerra (Strahlungen) foram republicados por Gallimard em suas prestigiosas séries "Pléiade", com um importante aparato crítico por Julien Hervier, a quem nós também devemos uma coleção de conversações com Jünger. A pesquisa acadêmica é coordenada pelo Centre de Recherche et de Documentation Ernst Jünger (CERDEJ), chefiado pelo Danièle Beltran-Vidal, que desde dezembro de 1996 publicou um volume anual de Carnets Ernst Jünger. O que ainda é necessário é uma tradução completa dos artigos políticos de sua juventude (eles recentemente apareceram na Itália, em três volumes) e da correspondência (especialmente a correspondência com Schmitt, Heidegger, Hielscher, Gottfriend Benn, e Gerhard Nebel), mas também uma grande biografia "definitiva" comparável à de Heimo Schwilk recentemente publicada na Alemanha.
É bastante curioso que nenhum livro de Friedrich Georg Jünger já foi completamente traduzido ao francês. Levando em consideração suas muitas conexões no mundo editorial, parece que Jünger poderia facilmente ter conseguido que algumas das obras de seu irmão publicadas na França. De minha parte, foi um erro que eu nunca fiz nada. E eu às vezes me pergunto o motivo.
Ernst Jünger teria 110 anos hoje. "As revoluções silenciosas são as mais efetivas", ele disse. Ele deve ser lido em silêncio.