Em um Ocidente que declina tão certamente como o curso do sol, opositores do embrião de Estado Global frequentemente definem a situação moderna como uma luta dialética entre o coletivismo de um lado e o individualismo de outro. Não raramente, ''coletivismo'' é usado para definir qualquer manifestação de poder do estado, seja esse fascista, comunista, liberal ou globalista tecnocrático, ainda que muitos expandiriam a classificação para incluir instituições de religiões tradicionais e até mesmo a família.
O que é menos claramente definido é o ''individualismo'', um termo escorregadio que significa muitas coisas diferentes para pessoas diferentes. O senso comum crê que ''individualismo'' é a habilidade de escolher e seguir seus próprios desejos de expressão, seja gastando o dinheiro da forma que bem entender, ou algo mais trivial, como tingir os cabelos de azul.
Quando visto pela perspectiva de um embate dialético com o coletivismo, especialmente o estado, a noção de individualidade ganha um peso bem maior do que em suas manifestações triviais, por exemplo, o estudante universitário que faz uma tatuagem para rebelar-se contra seu pai. De certa forma, o indivíduo como tal é muitas vezes deliberadamente desvalorizado pelas forças dominantes. Não apenas através de várias formas de reducionismo econômico, mas também na ideologia dominante que enxerga a humanidade como uma coleção de unidades intercambiáveis, atomísticas, de consumo, ou nas mais sinistras formas de trans-humanismo de homens como como Ray Kurzweil, que vê os humanos como nada além de androides biológicos, ou mesmo ''formigas''.
Muito frequentemente, os autoproclamados campeões do individualismo propõem um modelo não tão diferente de seus opositores ''coletivistas'': o indivíduo permanece uma entidade desconectada, atomística, indefinida por qualquer referência externa. Para o individualista absoluto, coisas como religião, etnia, linhagem familiar e nação são no máximo afiliações secundárias, e não componentes essenciais da identidade de cada um. A suposta alternativa ao absolutismo coletivista é uma concepção puramente dessacralizada e empobrecida do homem, uma derivação do humanismo renascentista e do Iluminismo.
Encontrando essa origem problemática, nós chegamos perto do beco-sem-saída metafísico da modernidade. Como o filósofo alemão e crítico do globalismo Rüdiger Safranski observou:
''... individualismo é um produto da secularização, pois pressupõe que declarações religiosas perderam sua validade no que se refere o significado e o propósito do todo. O individualismo investe significados em indivíduos, e não mais em totalidades como Deus, humanidade, nação ou estado."
O metafísico francês René Guénon, que viu no reinado de quantidade a dissolução do homem e do mundo, articulou um posicionamento semelhante. Ele identificou o individualismo como '' a negação de qualquer princípio superior'' e ''a consequente redução da civilização, em todos os seus ramos, a elementos puramente humanos.'' Em uma era de tirania mecanizada, Guénon soube que a suposta alternativa para o totalitarismo era também uma de suas fontes. O homem moderno e individualista, ''ao invés de tentar de elevar-se à verdade, pretende arrastar a verdade para o seu próprio nível .''
O individualismo, não pode ser negado, contém um reconhecimento positivo da dignidade do homem e seus dotes criativos. Ainda assim, tal ideia sistematizada e aplicada à sociedade é inteiramente inadequada e por vezes, destrutiva para a cultura e sua base sacra. Em seu trabalho ''Solidão e Sociedade'', o filósofo russo Nicolas Berdyaev apresentou algumas respostas na busca pelo equilíbrio entre individual e coletivo. Ao invés de um individualismo meramente horizontal e atomístico, ele enxergou a personalidade como a verdadeira identidade de um homem. Enquanto a individualidade denota mera quantidade, a personalidade floresce da esfera da qualidade. Assim, como Berdyaev enxergou e como a ideologia consumista comprova, '' o individualismo extremo leva à negação da personalidade.'' Personalidade, ao invés, é a unidade ''feita de corpo, mente e alma." Ela está fundada não apenas em fundamentos biológicos, naturalistas ou sociais, mas na própria natureza e origens supra-naturais do homem.
Berdyaev viu o ataque à personalidade presente igualmente tanto no individualismo quanto nas variadas formas de sistemas coletivistas, os quais ele interpretou como ''anti-personalistas''. Ele reconheceu:
''A exploração do homem pelo homem, assim como a exploração do homem pelo Estado, é uma forma de converter o homem em um objeto.''
Mas nenhum mero individualismo seria suficiente para conter a objetificação do homem; Berdyaev desconsidera o individualismo burguês como apenas outra forma de ''impersonalismo''. Por outro lado, a realização da personalidade é um empreendimento espiritual e aristocrático. "A luta para reconhecer a personalidade é heróica'', ele comenta. ''Heroísmo é, acima de tudo, um ato pessoal.'' Se a personalidade é formada de forma heróica, não há maior heroísmo que amor sacrificante - sua essência- :
"O personalismo se situa pelo amor de um indivíduo para com seus próximos, de personalidade única, da Divina humanidade..."
E, assim, personalidade nunca poderá ser equiparada com o indivíduo à deriva na sociedade, o ''free thinker'' que não faz nada além de tentar evitar o bote do coletivismo. O verdadeiro homem é vertical em sua orientação, e não busca riquezas materiais ou prestígio social, mas sim, ascender às alturas, uma liberdade genuína no reino do espírito.
Nos anos 50, um etologista americano chamado John Calhoun criou um experimento para testar os efeitos da superpopulação no comportamento de animais sociais. Os animais que Calhoun escolheu para estes experimentos foram camundongos (e mais tarde, ratos). Ele escolheu roedores pois estes se reproduzem rapidamente, assim permitindo a ele observar o desenvolvimento de várias gerações de ratos em um espaço de tempo relativamente curto.
Calhoun e seus pesquisadores descobriram que em um ambiente de espaço limitado e recursos ilimitados, a população de camundongos explode; Chega a um auge e depois cai até a extinção. Esses testes foi replicado várias vezes e se descobriu que os resultados são sempre os mesmos. A razão para esse fenômeno foi atribuída à degeneração social que piorou a cada geração. A degeneração levou a distúrbios no ambiente, que por sua sua vez levaram à fertilidade abaixo da taxa de reposição. Se concluiu que a Natureza tem um limite para qual os animais sociais podem interagir.
Os experimentos de John Calhoun ganharam reconhecimento internacional e seu conselho foi procurado por agências governamentais como a NASA. Eles apresentaram um insight ameaçador, porém útil do que pode ser nosso próprio futuro, pois não importa quantas vezes Calhoun repetiu o experimento, os resultados levaram para a mesma conclusão inevitável: extinção.
O Experimento
Sua equipe criou um ambiente confortável, ideal aos camundongos. Isso foi conseguido pela montagem de uma gaiola com comida e água ilimitada. A sala tinha espaço para até três mil ratos. Ela foi fechada, para que nem os camundongos pudessem sair ou predadores pudessem entrar. Removendo o risco da predação, os camundongos poderiam crescer em um ambiente livre de stress externo. O ambiente foi então dividido em diferentes unidades, o que permitiu a Calhoun identificar como os diferentes grupos sociais se formariam.
Quatro casais de camundongos tiveram a saúde investigada. Após verificar que eles estavam saudáveis, foram introduzidos na gaiola.
Calhoun observou a população de camundongos ao longo do experimento. Ele anotou mudanças comportamentais e números populacionais. Descobriu assim que haviam quatro fazes de mudanças populacionais observadas ao longo do experimento. O primeiro estágio, apelidado de “ambição” era a fase em que os roedores exploravam e se ajustavam ao novo habitat, decidiam seus territórios e faziam ninhos.
O segundo estágio foi chamado de “período da exploração”. Durante esse estágio a população de camundongos explodiu. Calhoun observou que alguns compartimentos se tornaram mais populosos que outros, e portanto algumas unidades usavam mais recursos. Também se notou que algumas delas começaram a ficar lotadas.
A terceira fase foi chamada de “Fase do Equilíbrio”. Durante essa fase, a população de camundongos atingiu o auge de 2200 indivíduos, apesar de haver espaço para 3000. Durante a terceira fase Calhoun observou o colapso da civilização de ratos. Ele notou que as novas gerações foram inibidas, já que a maior parte do espaço já havia sido socialmente definido.
Os camundongos mostraram diferentes tipos de disfunções sociais. Alguns se tornaram violentos. Os machos lutaram uns com os outros por aceitação, aqueles derrotados desistiam. Alguns machos se tornaram alvos repetitivos de ataques.
Calhoun anotou durante os experimentos:
“Muitas [camondongos fêmea] foram incapazes de suportarem toda a gravidez, ou de sobreviverem ao parto se fossem capazes. Um número ainda maior, após conseguir dar à luz com sucesso, estiveram aquém de suas funções maternais. Entre os machos as perturbações comportamentais variavam de afastamento sexual para canibalismo e de superatividade frenética para um afastamento patológico do qual os indivíduos apenas sairiam para comer, beber e se mover quando os membros da comunidade estivessem dormindo. A organização social dos animais demonstrou igual ruptura...”
[..]
“A fonte comum dessas perturbações se tornou mais dramaticamente aparente nas populações da nossa primeira série de três experimentos, nas quais observamos o desenvolvimento do que chamamos de ralo comportamental. Os animais se amontoariam em maior quantidade em uma das quatro gaiolas interconectadas nas quais a colônia era mantida. Cerca de 60 dos 80 ratos em cada população experimental se assentaria em uma das gaiolas durante os períodos de alimentação. Camundongos solitários raramente comiam sem a companhia de outros camundongos. Como resultado, densidades populacionais extremas se desenvolveram na gaiola adotada para comer, deixando as outras com populações esparsas.”
[…]
“...Nos experimentos nos quais o ralo comportamental se desenvolveu, a mortalidade infantil chegou até 96% entre os grupos mais desorientados na população.” – John Calhoun
Novas gerações nascidas na agora disfuncional utopia de camundongos se tornaram reclusas, passando seus dias se arrumando obsessivamente e dedicando seu tempo somente a comer, beber e dormir. Essa geração, apesar de toda a ênfase que colocavam na arrumação, não se reproduziriam. Além disso, esses camundongos foram percebidos como menos inteligentes que as gerações predecessoras.
“...o limite que Calhoun impôs na sua população era o espaço – e conforme a população crescia, isso se tornava progressivamente problemático. Enquanto as gaiolas ganhavam peso com os animais, um de seus assistentes descreveu como a utopia dos roedores havia se tornado o inferno.”
A quarta fase era o declínio. Nessa fase a população despencou. O último rato morreu 600 dias após o experimento começar.
O que os humanos podem aprender com os camundongos?
O fator limitante do experimento de Calhoun era o espaço. Conforme o tempo passava, os animais passavam as atitudes comportamentais negativas para a nova geração, com a adição de novas atitudes antissociais. O que faz o espaço, e portanto sua falta, um fator tão decisivo no desenvolvimento de animais sociais? E quais são as consequências da condensação da população?
Note como a evolução dos comportamentos apresentados pelos camundongos é paralela àqueles do povo da Ilha de Páscoa, como explorado por Quintus Curtius no seu artigo do Return of Kings, The Power of Choice. O povo da Ilha de Páscoa são um exemplo histórico de uma versão humana do experimento da utopia dos camundongos.
“Quanto os humanos chegaram lá pela primeira vez, por volta de 900 d.C., ela [a Ilha de Páscoa] era densamente florestada, e era capaz de sustentar numerosas tribos e uma população relativamente alta.”
As condições dos ilhéus eram similar às dos roedores de Calhoun. Numa ilha isolada, com um ambiente verdejante, um grupo de colonos humanos chegaram em barcos na Ilha de Páscoa. Os colonizadores podiam prosperar com recursos quase infinitos sem predadores naturais ou fatores externos de dificuldade.
Com o tempo, a ilha se tornou superpopulada. Quintos explica o que houve aos ilhéus:
“Os ilhéus então começaram a competir entre si cada vez mais por um volume sempre declinante de recursos naturais; Vinganças se multiplicaram, guerras intertribos se multiplicavam e uma mortalha de hostilidade e medo caiu sobre a ilha. Como as árvores haviam sumido, os ilhéus se tornaram incapazes de construir barcos e fugir para outras ilhas. Eles ficaram presos no próprio inferno, condenados a lutar uns contra os outros pelas últimas migalhas que a terra estéril poderia oferecer. Finalmente, eles começaram a passar fome, e se alimentar—literalmente—uns dos outros. Já que as carnes selvagens se tornaram indisponíveis, e a escapada da ilha se tornou impossível, as consequências naturais se seguiram. Canibalismo assolou a ilha, animando seu folclore e infectando seus sítios arqueológicos. Talvez os ilhéus compensassem seu sofrimento focando mais e mais no ritual vazio de construir e levantar estátuas, já que seus meios de amparo haviam derretido.”
Isso é comparável ao “ralo comportamental” observado na utopia de ratos. Também nos lembra como comportamentos detestáveis observados nos experimentos de Calhoun se parecem com diversas histórias chocantes dos tempos recentes. É possível que foi a decadência social em vez de uma falta de alimentos que levou o povo da Ilha de Páscoa até sua quase-extinção?
Há limites naturais dos graus de interação social com que podemos lidar numa base diária, assim como com os ratos. Entre humanos, isso é referido como o “Número de Dunbar”, e foi observado ser verdade em sites de mídia social. Enquanto pode se argumentar que isso não aconteceria com humanos, já que temos enormes porções de terra não populada, deve ser notado que na população de pico apenas metade do espaço da colônia estava sendo usado. Os camundongos tinham uma tendência de congregar e superpopular certos setores de espaço, algo comparável às cidades modernas.
CASOS MODERNOS DE RALOS COMPORTAMENTAIS EM HUMANOS
É difícil comparar a utopia de ratos com o mundo humano porque, por motivos óbvios, não há versão humana do experimento. Experiências são feitas sob condições controladas para mitigar fontes de erro. Porém nós podemos comparar tendências adversas modernas na sociedade com o ralo comportamental observado no experimento da utopia de roedores. Abaixo, alguns exemplos de ralos comportamentais em humanos comparados com aqueles da utopia de ratos.
Condensação da População
Caso estudado: Alemanha (também aplicável a: Espanha, Japão)
O primeiro sinal de problema nas gaiolas era a aglomeração observada em algumas das unidades.
Na Alemanha, os relatórios da Spiegel de um problema crescente de condensação populacional em suas cidades grandes e de vilarejos fantasma em áreas rurais. Aluguéis estão sempre em alta em Munique e Hamburgo enquanto em outras cidades apartamentos ficam abandonados.
Enquanto esse exemplo não é uma representação perfeita da utopia de ratos, nós podemos fazer algumas comparações. A gaiola de ratos era compartimentada. Similarmente, a Alemanha é dividida em diversas regiões, todas com amplos recursos. Na Alemanha, algumas regiões estão se tornando mais populosas, isso é causado pela demanda de mão-de-obra em algumas regiões e a falta da mesma em outras.
Previsão: Eu prevejo que conforme as cidades cresçam, alguns dos comportamentos observados por Calhoun se tornarão aparentes. Esses incluirão inquietação social e taxas de fertilidade mais baixas.
A condensação de população foi uma causa principal da inquietação na utopia de ratos. O tempo nos dirá se será o caso na Alemanha.
Despovoamento (insucesso em atingir a fertilidade de reposição)
Fenômeno mundial.
Caso estudado: República da Coreia (Coreia do Sul), Japão.
A maior correlação entre o experimento da utopia de ratos e os nossos tempos é o despovoamento.
O despovoamento levou à extinção dos camundongos. É fascinante, porém terrível pensar que sem as dificuldades da vida, uma espécie não consegue sobreviver. Se pensarmos sobre isso de uma perspectiva humana, nós vemos que a nossa luta por sobrevivência nos une como uma espécie. Sem obstáculos nossa vida se torna sem sentido e superficial.
Se vermos a taxa de fertilidade da Coreia do Sul por mulher, que é de 1.24, podemos prever que essa nação de 50 milhões de habitantes atingirá o pico por volta de 2017. De lá a população é esperada para se reduzir a 42 milhões por volta de 2050.
A origem desse declínio é a falta de empregos e portanto a ausência da renda necessária para criar crianças. Como em muitas outras nações, a escadaria do emprego está travada, já que as pessoas se aposentam mais tarde. A Coreia do Sul, assim como o Japão, tinha um mercado de trabalho em expansão que garantia empregos vitalícios. Infelizmente, não é mais o caso. O trabalho das cidades atraiu muitos para fora do interior e criou uma concentração populacional em cidades como Seul.
A despopulação apresenta à nossa espécie um problema sempre crescente, já que a taxa de fertilidade sub-reposição está se tornando predominante no mundo desenvolvido.
Se olharmos ao Japão, veremos que o Japão agora enfrenta uma população declinante. O despovoamento é estimado para fazer a população se reduzir a 87 milhões em 2050, dos atuais 127 milhões. Em termos econômicos isso seria catastrófico, já que o Japão possui um estado de bem-estar social como o do Reino Unido e depende de ter uma base fiscal maior que a base de aposentado. O problema está tão fora de mão lá que o governo japonês está até considerando imigração (um grande tabu por lá).
Fertilidade abaixo da taxa de reposição também se nota na República da Coreia, Espanha, Alemanha, China, Rússia, Estados Unidos, Dinamarca, Suécia e Noruega.
A despopulação é provavelmente um efeito do colapso social, e não uma causa.
Agressão Sem Sentido
Fenômeno mundial.
Caso estudado: Ilha de Páscoa
A agressão é um aspecto óbvio em tanto a utopia de ratos quanto o caso da Ilha de Páscoa. É também facilmente comparável com a nossa sociedade contemporânea. Enquanto a violência sempre existiu entre nossa espécie, isso sempre foi atribuído a uma variedade de fatores como a pobreza ou guerras entre as tribos (agressão causada pela falta de recursos) e não como um resultado da condensação populacional (agressão apesar de recursos abundantes).
Os primeiros sinais de trabalho na utopia de ratos eram os camundongos machos lutando por aceitação. Isso aparentemente levou à uma espiral de outros problemas sociais.
“...haviam três vezes mais camundongos jovens aspirando a entrar em grupos sociais do que haviam vagas em grupos socialmente estabelecidos...”
A agressão é a causa do colapso social. Qual foi a causa da agressão? Como observado, a falta de espaço, tanto fisicamente quanto socialmente, o que causa uma série de eventos que levaram ao resultado de extinção.
Colapso de Papéis de Gênero
Fenômeno do mundo desenvolvido.
Caso estudado: EUA, Japão
Na Return of Kings, nós damos uma grande importância aos papeis de gênero. Ver esse assunto da perspectiva de outra espécie pode nos dar uma visão melhor do tópico. Nós observamos que o despovoamento é um efeito, então qual é a causa? Talvez há mais do que apenas uma causa. O ralo comportamental observado na utopia de ratos mostrou diversos comportamentos sociais anormais.
Entre os camundongos macho, o espaço limitado e a explosão populacional fez com que os machos lutassem mais para serem aceitados. Já que nem todos os camundongos podem ser machos alfa, os perdedores se tornavam reclusos. Com machos em excesso lutando por dominação, machos mais velhos desistiam, deixando as fêmeas para cuidar da família. Estas, por sua vez, se tornariam cada vez mais agressivas, e algumas até atacaram as próprias crias.
Calhoun notou que conforme o tempo progredia “...as mães ficavam aquém de expectativas maternais”. Em anos recentes houve um aumento crescente de casos de negligência e abuso infantil por mães humanas que conseguiram chegar às manchetes nacionais. Não é difícil especular que há muito mais que não ouvimos falar. Na Austrália, a polícia liberou estatísticas que atribuem metade dos infanticídios às suas mães.
Já que esses são os casos mais notórios que a mídia publica, os menos extremos passam desapercebidos, sub-informado ou nem informado na mídia (nas últimas décadas houve uma série de matérias na mídia, que quando examinadas como um todo nos contam que as mulheres estão começando a perder seus instintos naturais de criação). Nós sabemos que as mulheres em nações desenvolvidas suprimem seus instintos maternais, ou intrinsecamente ou extrinsecamente. Também está se tornando mais comum para as mulheres buscar uma vida movida a sexo, algo também observado na utopia de ratos.
“...os camundongos se tornaram mais promíscuos...camundongos vagariam atacando outros ou os montando, sem discernir gênero...”
“...fase C, a incidência de concepção em fêmeas caiu e a reabsorção em fetos aumentou. O comportamento materno foi interrompido. Algumas mães em buscas desesperadas por áreas mais calmas abandonaram os filhotes que caíssem no caminho...” – Tragedy in Mouse Utopia, Dr.J.R. Vallentine
Conforme o comportamento na gaiola se deteriorava, as fêmeas abandonariam sua cria deixando-os para se defender sozinhos. Sem pais em volta para os ensinar como ser camundongos bem ajustados,
“...prematuramente rejeitados, primeiro por seus pais, então por suas mães, e finalmente por grupos estabelecidos na sociedade, os jovens cresceram sem saber como se comportar, pessoalmente ou socialmente, como camundongos...” – Tragedy in Mouse Utopia, Dir.J.R. Valentine.
Papéis de gênero são vitais em uma espécie social, seu colapso leva à fertilidade abaixo da reposição, despovoamento, e finalmente, extinção.
Isolamento
Caso estudado: Japão
“Indivíduos apenas emergiriam para comer e dormir quando o resto estivesse dormindo.” Quando li isso, a primeira coisa que veio à minha mente foram os Hikkikomori. É um termo utilizado para se referir a um adolescente recluso que é introvertido demais para ser funcional na sociedade. Esses jovens são tão socialmente ineptos que eles se trancam em ambientes fechados e só se aventuram fora de casa {a noite para estocar mantimentos. Este é um fenômeno que ocorreu por 20 anos mas apenas recentemente está vindo à luz no Japão.
O número de Hikkikomori é estimado em cerca de um milhão. Algo que alarmou o governo japonês, que foi incapaz de lidar com um assunto que eles não entendem completamente. No Japão, uma inteira geração de jovens japoneses nasceram em uma sociedade em que todo o espaço já estava socialmente definido da mesma forma que na utopia de ratos, onde “as novas gerações foram inibidas já que a maior parte do espaço estava socialmente definido”.
Porém essa tendência não é exclusiva ao Japão. O Japão é, porém, uma aproximação à utopia de ratos assim como a Ilha de Páscoa. Sob stress, esses rapazes (e homens) foram debilitados por uma sociedade estressada e disfuncional. A reclusão é uma causa do despovoamento e um efeito de uma sociedade supra-estressada que em sua vez é causada pelo ralo comportamental.
Os Bonitões
Caso estudado: Japão
Tem outro mal social no Japão que é comparável aos camundongos de Calhoun. Esses são os comedores de grama (Soshoku kei Danshi) do Japão. O termo, “comedor de grama”, se refere aos homens que não possuem interesse em se relacionar com o sexo oposto. A mídia e os MRA’s confundiram esses caras com qualquer pré-concepções que eles tiveram. Por exemplo, o documentário da BBC “No Sex please, we are Japanese”, explora o fenômeno com parcialidade e jornalismo de má-qualidade. Para assegurar que não cairemos nos mesmos preconceitos, permita-me reiterar que comedores de grama são homens que não têm interesse em relacionamentos com o sexo oposto. Eles não são homossexuais, assexuais, otaku ou Hikkikomori.
A diferença entre comedores de grama e Hikikomori é que os Soshoku kei Danshi estão desistindo de relacionamentos e os hikkikomori estão desistindo de toda a sociedade. Comedores de grama não são assexuais, eles preferem a vasta gama de pornografia disponível a eles. Muitos comedores de grama, apesar de nem todos, são metrossexuais. Esses são caras que gastam muito tempo e dinheiro em cuidados pessoais. Mais uma vez, isso não é aplicável a todos os comedores de grama.
Alguns deles lembram os “bonitões”, passando seu tempo “[obsessivamente] se arrumando, comendo e dormindo...[e]...não se reproduzindo”. A correlação aparenta ser que indivíduos não se conformam com um modelo de sociedade estressado e estão optando não relacionar e não assumir um papel de gênero masculino. Os comedores de grama se tornaram tão numerosos que isso forçou algumas garotas japonesas a iniciar o cortejo. Esse fenômeno é mais pronunciado no Japão, mas também é aplicável em outras nações desenvolvidas.
Na República da Coreia, 10% dos homens usam maquiagem. Em outras nações desenvolvidas, os “bonitões” são as celebridades insípidas e superficiais e a juventude obcecada com o embelezar. É possível que os comedores de grama podem se tornar uma causa de despovoamento que é causada pelo ralo comportamental.
Conclusão
O experimento da utopia de ratos nos apresenta uma visão decidida de nosso presente e nosso futuro. Conforme o tempo progride nós veremos mais evidências que estamos caminhando para um declínio na população cuja causa principal é a decadência social.
Através da História nós desenvolvemos uma visão antropocêntrica do mundo. Isso é tolice. Humanos são animais--animais altamente desenvolvidos--porém animais mesmo assim. Independente do que pensamos de nós mesmos, ou do quanto tentarmos nos dissociar do resto do reino animal, as regras da natureza que se aplicam aos camundongos se aplicam a nós. Não aprender ou aceitar os resultados desses experimentos pode apenas ser prejudicial para nós como uma espécie.
Animais sociais parecem ser regulados por fatores comportamentais intrínsecos. A questão é se há um kill switch natural para uma espécie que não possui predadores. Calhoun concluiu que o stress da interação social causou os distúrbios no comportamento de seus experimentos. Se nós realmente nos destacamos do resto do reino animal, nós devemos ser capazes de evitar as mesmas armadilhas. O que é certo é que a menos que humanos coletivamente façam um exame de consciência, nós cairemos na ratoeira.
1. Era moderno e teve ligações com conceitos pertencentes à filosofia do Iluminismo. Isso é absolutamente incorreto: a modernidade é o mal e a falsidade. Era uma teoria política moderna. Muito melhor que outras teorias políticas modernas, mas ainda assim moderna. Essencialmente. Em todos seus aspectos não-modernos, anti-modernos e pós-modernos não se equivocava.
2. Era eurocêntrico. Qualquer grupo étnico (o grupo do "nós") é etnocêntrico. É bastante normal. Porém ser eurocêntrico na Europa Moderna é o mesmo que ser anti-europeu, porque a modernidade européia não é européia em absoluto. Ser eurocêntrico na Europa Moderna e contra todas as outras sociedades (não-européia) julgadas atrasadas e sub-humanas, significa ser anti-tradicional. A chamada ao retorno às raízes européias (germânicas, indo-árias) foi algo legítimo e bom. Porém a oposição da profunda identidade da Europa às identidades de outras sociedades (muito menos modernizadas que a Alemanha do século XX), era absolutamente equivocada e injustificável.
3. Se baseava em um pequeno nacionalismo. Desse modo, temos alemães contra franceses, eslavos e assim sucessivamente. Isso era um erro e muitos pensadores alemães e combatentes que apoiavam Hitler estavam contra tal posição (incluindo Leon Degrelle, por exemplo). O nacionalismo alemão ou italiano é uma questão finalmente insignificante. O indo-europeu (indo-ario) é outra coisa, muito superior. A Sagrada Tradição e o Terceiro Império do Espírito é a terceira questão, a mais importante. Se o pequeno nacionalismo aceita estar incrustado no contexto indo-europeu é bom. Quando faz questão de afirmar as diferenças internas é mau. O mesmo vale para a civilização indo-européia. Se se reconhece seu caráter sagrado (Tradição) é bom. Se concebe a si mesma como um fim em si, não é aceitável e perde sua legitimidade.
4. Ele atacou a primeira e a segunda teoria política ao mesmo tempo. Essa foi a razão principal de sua derrota estratégica e militar. No plano ideológico, essa foi a mesma razão de sua derrota intelectual. A regra (definida explicitamente na Quarta Teoria Política), é que o ataque contra o comunismo é válido e legítimo SÓ DEPOIS da vitória comum sobre os liberais. Geopoliticamente falando, a Terra ganhar do Mar e só DEPOIS que suas partes decidem quem é o Heartland. Se a luta interna se inicia ANTES da vitória sobre a primeira teoria política (o capitalismo e o império talassocrático anglo-saxão do dinheiro e da mentira), ou inclusive se os comunistas são declarados o inimigo primário em lugar dos liberais, o fascismo ajuda os liberais a ganhar e empurra os comunistas ao bando do MAL PRINCIPAL. Assim, o fascismo estava absolutamente equivocado aqui.
Estes quatro pontos são fatos negativos essenciais. Havia outros menos importantes como o peso teórico. Houve alguns fatos positivos: anti-capitalismo, anti-materialismo e outros traços anti-modernos. Isso é válido para o verdadeiro fascismo histórico com todos seus terríveis e fascinantes (para alguns) aspectos.
Hoje o "fascismo" consiste só nos pontos débeis e perversos. É totalmente redutível a estes quatro pontos: é moderno (como o conceito de Nação é moderno), eurocêntrico, chauvinista e primeiro anti-comunista e só depois (demagogicamente) crítico do liberalismo. Reúne todos os pontos débeis do fascismo histórico e está totalmente desprovido de qualquer coisa positiva. É por isso que não é mais que uma caricatura. É por isso que deve ser superado e transcendido. É por isso que só serve como uma arma secundária para os liberais (assim como os neo-esquerdistas, os anti-globalistas e os eco-palhaços - todos esses também títeres dos amos capitalistas).
O fascismo está semântica e historicamente esgotado. Seus restos são uma auto-paródia. Isso nos resplandece. Vamos dar um passo adiante.
A ordem de destruição (desconstrução) se converte agora em DOGMÁTICA:
• Contra o liberalismo.
• Quando os liberais estiverem mortos, é claro, vamos liquidar os marxistas materialistas (os críticos principais do mundo moderno, segundo Guénon, no lugar dos críticos radicais do capitalismo segundo Marx). Quando a oligarquia mundial repousar sobre suas ruínas, precisaremos acabar com os vermelhos. Porém, antes desse ponto somos aliados. Aqueles que chamam a lutar contra a esquerda primeiro são traidores. A luta é primeiro contra o inimigo verdadeiro.
• Quando não houver mais liberais nem oligarquia global, não haverá mais marxistas com seus idiotas materialismos e determinismos mecanicistas; com seu proletariado imaginado, ou pior, suas "multidões"; com seu igualitarismo incondicional; com seus "intelectuais" pervertidos mentalmente e sua "arte degenerada". Os exterminaremos finalmente, os idiotas neonazis. Só então, mas não antes. Porém se qualquer pessoa proveniente desses três campos ideológicos mudar finalmente sua mente, aceitando nossa lógica e nossa Quarta Via, ele ou ela será cordialmente bem-vindo.
• É quase impossível passar da primeira teoria política à Quarta. É o mesmo que nascer de novo.
É muito difícil passar do comunismo à Quarta Via. Porém o ódio ao capitalismo e descobrir a própria identidade étnica e cultural, assim como um sentimento anti-imperialista, anti-hegemônica e o amor pela justiça podem ajudar muito. Nesse caso os comunistas, especialmente os nacional-comunistas, são bem-vindos.
É muito mais fácil para os ex-fascistas dar o passo seguinte sobre a base de uma fria análise geopolítica e ideológica da história intelectual e política do século XX, e unir-se à Quarta Via. Porém se não se dá esse passo a culpa de não o fazer é mais que a atitude obstinada dos comunistas ou liberais inamovíveis. Eles pertencem ao passado. Porém se aqueles que realmente sonham com o futuro perdem a oportunidade histórica, não terão misericórdia. Serão destruídos por último, mas seu crime será maior. Deverão ser considerados como traidores à nossa luta.
"Não há Rússia ou Ucrânia separadas, mas apenas uma Santa Rus" - Ancião Iona de Odessa
O ano de 2014 viu um crescimento sem precedentes de patriotismo na Rússia contemporânea, que resultou na popularização da noção do Mundo Russo. Uma razão para o crescimento do sentimento patriótico foi o retorno da Criméia ao lar após a votação esmagadora de seus residentes majoritariamente russos em um referendo há um ano. O início da guerra de liberação no Donbass contra o regime ocidentalista de Kiev foi a outra. Essa guerra efetivamente delineou o que estava em jogo para a existência do Mundo Russo. Este não é um conceito étnico, mas civilizacional que engloba cultura, história e língua compartilhadas no espaço eurasiano dentro de uma estrutura tradicional. Em certa medida e apesar das diferenças ideológicas óbvias, o Império Russo e a URSS incorporavam a mesma entidade geopolítica. Um aspecto particularmente notável da atual crise no Donbass é o simbolismo - religioso e histórico - que ultrapassa o espectro político comumente usado, mas ultrapassado de Esquerda-Direita. No contexto russo, isso significa superar a divisão Vermelho-Branco da Revolução Comunista. Que essa guerra tenha empurrado os russos a examinar a raison d'être de seu país é de certa forma notável: por duas décadas seus cidadãos não tiveram uma ideologia oficial, proibida pela Constituição que está baseada nos modelos ocidentais. A emergência de uma nova maneira de pensar na Rússia se tornará mais clara uma vez que façamos referência ao significado de insígnias religiosas, guerras - civil russa e grande patriótica, bem como às questões de ideologia no mundo pós-moderno.
Panorama do Conflito Ucraniano
Antes de examinar esses fatores, vamos recapitular os eventos históricos recentes que levaram a eles. Desde 1991, a OTAN tem se aproximado das fronteiras da Rússia apesar de suas promessas do contrário à época do colapso soviético. O oficialato ocidental usou o Projeto Ucrânia - não sem a concordância de suas próprias elites oligárquicas - como Projeto Anti-Rússia, baseado na identidade negativa da minoria ucraniana ocidental. Grandes somas de dinheiro foram investidos em estabelecer grupos agressivamente anti-russos na mídia e em setores formadores de opinião como Kiev, onde nenhum existia antes. Internamente, a Ucrânia pós-soviética era uma entidade historicamente problemática desde o princípio. De fato, ela tentava abrigar duas identidades conflituosas sem esforço de coesão razoável: russos deixados para trás da fronteira recentemente instituída bem como ucranianos orientais e centrais partilhando raízes com a Rússia atual (historicamente, Novorossia ortodoxa oriental e Malorossia) por um lado, e ucranianos ocidentais, tal como os galicianos (greco-católicos no Império Austro-Húngaro) buscando laços mais fortes com a Europa, do outro.
Em fevereiro de 2014, essas duas identidades entraram em choque, quando o país viu um golpe de Estado apoiado pelo Ocidente sob a bandeira de integração européia. Uma canção de sereia, essa serviria apenas para transformar a Ucrânia em um mercado para despejar bens europeus, economicamente, bases da OTAN, militarmente, como uma miríade de outras possibilidades negativas que aparecem sempre que créditos do FMI estão envolvidos. O golpe canalizou um certo nível de descontentamento popular com o governo Yanukovich, expressado no Maidan, para levar a sua conclusão lógica o Projeto Ucrânia. Esse seria um Estado ideologicamente anti-russo - baseado nas visões étnicas fundamentalistas de sua minoria ocidental - que ignorasse os desejos dos ucranianos orientais. Seu nascimento violento levou a outra conclusão lógica. Quando o governo de Kiev negou àquela região seus direitos básicos de idioma e representação popular por federalização, e tentou esmagá-los pela força, uma guerra de liberação no Donbass - Novorossia histórica desde o tempo de Catarina a Grande - começou como resposta. Aqueles que os frequentadores do Maidan chamaram de "escravos" buscaram ser livres afinal.
Um ano e 50.000 mortes depois - se puderemos crer no serviço secreto alemão - esse conflito permanece nos lábios de analistas políticos. A infraestrutura do Donbass está destruída, 2.5 milhões de refugiados fugiram para a Rússia (incluindo trabalhadores convidados), a economia ucraniana está em colapso, e metade de suas melhores terras agrícolas já foram compradas pelos oligarcas e por empresas estrangeiras. Há até mesmo uma crescente discordância dentro da Europa - sobre as questões da Ucrânia e das sanções russas - cuja atomização beneficiaria a habilidade de Washington de exercer ainda maior influência na região sobre Estados cada vez menos soberanos.
O cenário de guerra civil dentro do grande esquema da geopolítica não foi uma surpresa para alguns. O escritor de Lugansk Gleb Bobrov, por exemplo, lançou o que agora parece um romance profético chamado Época do Natimorto em 2008 por uma grande editora Yauza-EKSMO. O livro descrevia uma hipotética guerra civil na Ucrânia. Em 2014, ele foi republicado cinco vezes por razões óbvias.
Símbolos da Tradição...e Além
A iconografia da luta de liberação no Donbass funde várias camadas de história russo-ucraniana compartilhada. Ela tenta superar os pontos de conflito e dar origem a uma nova síntese do Mundo Russo que ultrapasse a especificidade das ideologias de base iluminista, canalizando tradições mais antigas ou encontrando pontos focais positivos.
Um aspecto proeminente da resistência do Donbass é o uso de insígnias religiosas. Os protestos pós-Maidan na Ucrânia oriental - antes de Kiev ter iniciado uma "operação anti-terrorista" contra civis na região - frequentemente usava imagens ortodoxas orientais nas barricadas. Estes eram ícones de proteção, como os da Virgem e do Czar Nicolau. Insígnias ortodoxas, unificando eslavos orientais, permaneceram parte importante da guerra de liberação desde então.
Tanques avançam para as batalhas levando estandartes do Mandylion, tal como bloqueios de estrada e comandantes individuais. Igor Strelkov explicitamente teve a bandeira do batalhão voluntário de Slavyansk abençoada em uma igreja e a marchou com ela pela cidade em meados de 2014. Talvez, inconscientemente, tais atos enfatizam as ainda mais antigas raízes indo-europeias - aqui, a liderança política e social de guerreiros e sacerdotes, que se impõe em duro contraste ao comerciante-político das democracias de massa.
O Cristianismo Ortodoxa tem sido, é claro, a traição religiosa milenar na Rus Moscovita e Kievana, no Império Russo, e, hoje, tanto na Rússia como na Ucrânia oriental e central. E, conquanto a URSS fosse oficialmente ateísta, seguindo a ideologia marxista, a religião jamais abandonou plenamente a esfera privada, particularmente fora dos centros urbanos; em certos momentos, ela foi até mesmo oficialmente sancionada, como foi o caso com Stálin em 1941. De fato, os historiadores tem apontado que por volta da década de 30, a URSS havia se tornado um Estado neo-tradicionalista - ainda que com economia comunista - nos quais valores socialmente conservadores, como o pró-natalismo, foram reintroduzidos de cima para baixo.
Um papel importante desempenhado pelo Cristianismo Ortodoxo no conflito do Donbass também é evidenciado pelo fato de que mais de 70 igrejas foram deliberadamente atacadas ou destruídas nessa região pelas forças kievanas ocidentalistas. Portavozes da Nova Rússia afirmaram que elas não possuíam posições militares estratégicas por perto, e que geralmente nada mais era atingido perto das igrejas. Atacar arquitetura religiosa e centros comunitários não deveria surpreender, considerando que a Ortodoxia fornece elos culturais poderosos entre a Rússia atual e a Ucrânia.
No que concerne ao cisma Vermelho-Branco, a leitura oficial da história na União Soviética denunciava muitos aspectos da Rússia imperial tardia em uma base ideológica. Na década de 90, o pêndulo balançou na direção diametralmente oposta - dessa vez o alvo era todo o período soviético - com visões históricas mais equilibradas emergindo na década seguinte. Essas visões são socialmente unificadoras ao invés de divisivas, com estas sendo muitas vezes exploradas por certas forças externas que buscam desestabilizar a Rússia. Ainda que alguma polarização permaneça, a maioria dos russos amadureceu a ponto de ultrapassar a ideologia e interpretar o Império Russo e a União Soviética como variações da mesma entidade geopolítica. Ademais, muitas famílias contém essas contradições aparentes dentro de si: enquanto alguns de seus ancestrais estavam bem posicionados durante a era imperial, ou foram expurgados na década de 30, outros foram camponeses, trabalhadores e soldados no Exército Vermelho.
Por essas razões, os participantes nas Forças Armadas da Nova Rússia exibem uma variedade de símbolos, cuja síntese indica a emergência de uma visão equilibrada do próprio passado: nela, nem um único período singular é totalmente positivo ou negativo. Por exemplo, na primavera e verão de 2014, a mídia deu bastante atenção ao interesse de Igor Strelkov em reencenações históricas, focadas primariamente no Exército Russo na Primeira Guerra Mundial e no Movimento Branco durante a Guerra Civil de 1917-1921.
O atual líder de Donetsk, Aleksandr Zakharchenko, foi eleito em novembro de 2014, escolhendo ser empossado ao som da Marcha do Regimento Preobrazhenskii do período petrino do Império Russo.
A posse de Zakharchenko também envolveu participação cossaca. Antes da divisão política artificial em Rússia do Sul e Ucrânia Oriental, essa região abrigava os mesmos povos (narod), incluindo os Cossacos do Don - um soslovie (estado) que era autônomo, mas radicalmente leal a Deus e, geralmente, ao czar. Dormentes durante o período soviético, as tradições cossacas estão reemergindo. Elas, também, vieram desempenhar um papel proeminente nas linhas de frente da liberação do Donbass.
A herança cossaca ressalta a complexidade histórica do Donbass. Cem anos atrás, a Guerra Civil Russa polarizava a população nessa região primariamente com base em ideologia entre o Movimento Branco e os Bolcheviques. De fato, o atual aspecto de guerra civil da liberação do Donbass gera essa comparação. Afinal, muitos dos soldados conscritos por Kiev são etnicamente russos de cidades como Dnepropetrovsk lutando contra outros russos étnicos mais ao leste.
Ademais, apesar do simbolismo imperial russo, a liderança da Nova Rússia se vê explicitamente como herdeiros da breve e transitória República Soviética de Donetsk-Krivoi Rog (1918). E, na área industrial pesada, primariamente focada na carvoaria, referências soviéticas classistas não podem ser ignoradas. O estandarte da Nova Rússia é baseado na Cruz de Santo André e diz, "Vontade e Trabalho", a bandeira da República de Donetsk, também, usa um esquema de cores pego daquele período.
Porém, a questão do trabalho tem mais continuidade entre esses dois campos aparentemente polares Vermelho e Branco do que se poderia pensar. Conquanto a União Soviética tentasse instituir a igualdade social de cima para baixo, alguns industriais do período tardio do Império Russo eram pios cristãos ortodoxos, que acreditavam em caridade a nível pessoal. Eles criaram boas condições de trabalho para seus empregados antes da existência de qualquer legislação trabalhista, incluindo creches e hospitais para mulheres no caso de Abrikosov & Filhos, ou escolas e pensões no caso de Einem, só para citar.
Segunda Guerra Mundial de novo?
Porém é a Segunda Guerra Mundial que mantém o maior legado soviético e o papel central no conflito do Donbass. A narrativa midiática mainstream em língua inglesa, até mesmo as raras matérias inicialmente simpáticas, descreve os residentes do Donbass sendo ludibriados pela televisão russa para pensar que estão revivendo a Segunda Guerra Mundial lutando contra o fascismo. Considerando que muitos deles são mineiros por profissão, a implicação derrogatória é a de que essa população proletária é ignorante demais para pensar por si mesma. Há duas questões de interesse aqui: uma da Segunda Guerra Mundial, em geral, e a outra de ideologia, especificamente.
Primeiro, fundamentalmente toda família da ex-URSS foi tocada pelo que na Rússia é chamado de Grande Guerra Patriótica (1941-45) com as perdas totais estimadas em aproximadamente 26 milhões. As pessoas tem consciência das experiências de seus pais e avós, alguns dos quais ainda vivem. A nível ideológico, essa guerra foi o grande solidificador da URSS após os anos turbulentos da Revolução de Lênin e da consolidação de Stálin (1917-1941). Mais é muito mais do que isso. Toda a geografia e topografia da Nova Rússia replica batalhas famosas do Exército Vermelho nessa região, tornando difícil evitar comparações.
A cidade de Slavyanoserbsk perto de Lugansk, por exemplo, foi batizada em homenagem aos oficiais sérvios a serviço da Imperatriz Elizabeth da Rússia em meados do século XVIII. A cidade esteve sob ocupação nazista de 1942 a 1943 - com partisans soviéticos ativos na área até a liberação pelo Exército Vermelho em setembro daquele ano. Representantes das Forças Armadas da Nova Rússia enfatizaram como o posicionamento geográfico entre as tropas soviéticas e nazistas correspondiam aos das suas forças e as de Kiev. Além disso, supostamente voluntários sérvios teriam sido os responsáveis pela liberação da cidade em agosto de 2014.
Saur Mogila, uma elevação estratégica na região de Donetsk, serviu como o local de uma das mais duras batalhas da Grande Guerra Patriótica, com tropas soviéticas a recapturando em agosto de 1943. Esse nível de intensidade pareceu como um déjà vu no verão de 2014, quando Saur Mogila trocou de mãos várias vezes entre as tropas de Kiev e as Forças Armadas da Nova Rússia. Estas finalmente a recapturaram em agosto daquele ano. De fato, o obelisco memorial de 1963 à Grande Guerra Patriótica foi destruído como resultado dessa batalha.
Assim, parece que cada centímetro dessa paisagem poderia narrar uma história ismilar. Há uma caricatura de Hitler "preocupado" com a retomada de Mariupol, uma fotografia de 1945 de um T-34 escrito nele "Vingadores do Donbass", incluindo dois irmãos e um primo, e uma pintura do pós-guerra da estação de trem de Debalsevo por um professor local.
Há até inúmeros T-34s de museu que foram ressuscitados pelos combatentes da resistência, como esse tanque de Lugansk no início de 2015.
Ademais, há brigadas internacionais em ambos os lados do conflito, aparentemente copiando a Guerra Civil Espanhola do mesmo período. Tropas de Kiev incluem suecos, espanhóis, americanos. As Forças Armadas da Nova Rússia incluem espanhóis, brasileiros, franceses, sérvios. No máximo, os mineiros do Donbass poderiam ser culpados por conhecer a história de sua terra bem demais, ao fazer essas comparações da Segunda Guerra Mundial.
Então há a questão do fascismo na Ucrânia que a mídia ocidental evita, enquanto a contraparte russa enfatiza. Durante a Segunda Guerra Mundial, alguns na Ucrânia inicialmente saudaram os nazistas contra os comunistas soviéticos, mas rapidamente passaram a odiar sua colonização. A Ucrânia conheceu graus variáveis de colaboração, das SS Galicianas ao Exército Insurgente Ucraniano que odiava e lutava contra todos - alemães, poloneses, russos e judeus - e foi cúmplice da limpeza étnica na região de Volyn.
Os etno-nacionalistas fundamentalistas ucranianos atuais, o Setor Direito, a Assembléia Social-Nacional, e o Batalhão Azov, se veem como os herdeiros dos líderes do Exército Insurgente Ucraniano, Bandera e Shukhevich, e subscrevem explicitamente à "Terceira Posição", incluindo insígnias inspiradas na Segunda Guerra Mundial. E é a sua leitura da história que foi efetivamente estabelecida após o golpe em fevereiro de 2014. Que essas figuras não são simplesmente marginais é evidente da completa negação da federalização e dos direitos linguísticos russos ao Presidente Poroshenko chamando Odessa de "cidade banderista" - particularmente insultuoso para muitos residentes dessa Cidade de Heróis da era soviética e local do Massacre da Central Sindical em maio de 2014 nas mãos de ativistas do Maidan.
Não joguem a ideologia fora com a água do banho
Porém, não importa quão tentador seja achar que a história repete a si mesma, é importante notar as vastas diferenças ideológicas. Como alguns teóricos apontaram, a nível filosófico a Segunda Guerra Mundial conformava a luta de três ideologias para determinar qual delas melhor representa a Modernidade em uma escala global. Como resultado, o comunismo (URSS) e o liberalismo (EUA) triunfaram sobre o fascismo. Subsequentemente, a Guerra Fria serviu como o confronto das duas ideologias modernas remanescentes, na qual o colapso da URSS (1991) sinalizou a vitória do liberalismo. Com o liberalismo como o único representante da Modernidade no processo histórico - tornando o paradigma novecentista esquerda-direita obsoleto - o período da pós-modernidade começou. Alguns analistas chamam essa ideologia de "neoliberalismo", outros de "pós-liberalismo". Ambos, porém, descrevem a mesma trajetória histórica, na qual esse conjunto de idéias se desenvolveu até sua forma atual: o indivíduo - com todos os seus elos tradicionais removidos - no centro da história, o capital financeiro com suas corporações transnacionais anônimas bem como como consumismo acéfalo bem como entretenimento para as massas, a falsa crença no progresso econômico infinito, e a religião secular dos "direitos humanos" como ferramenta de política externa que é geralmente menos que humanitária, só para citar algumas característica.
É claro, as outras ideologias do século XX não desapareceram completamente. Mas é o pós-liberalismo com sua hegemonia global que permite que elas existam e sirvam a seus próprios propósitos. E são os promotores dessa ideologia, as elites do Ocidente, que sancionam a existência dos assim chamados fascistas na Ucrânia, tal como eles fazem com os chamados rebeldes "moderados" no Oriente Médio. Assim, o portavoz das elites, a mídia de massa, camufla aqueles como "nacionalistas", a "direita radical" ou simplesmente "controversos". Em contraste, aqueles que desafiam sua dominação ideologicamente, mesmo das maneiras mais modestas, estão sujeitos ao reductio ad Hitlerum. Esse é o caso com qualquer partido político, por exemplo, o Front National, que exibe uma aparência de tradicionalismo (antiglobalismo), tão modesta quanto a ênfase em soberania nacional acima de corpos supranacionais, como a OTAN.
De fato, a ideologia pós-liberal é um dos fatores que cega muitos ocidentais às realidades da guerra de liberação no Donbass. O atual modelo ocidental de cidadania é abstrato: ele se centra em um conjunto de princípios no qual os indivíduos são intercambiáveis - desde que eles adotem "valores europeus" ou o "modo de vida americano" - ao invés das noções mais tradicionais de enraizamento na paisagem, elos linguísticos e culturais e laços ancestrais. Assim, aqueles que subscrevem a essa abstração tem dificuldades para entender como que pertencer ao mesmo povo (narod) é mais importante do que viver em dois Estados diferentes - Rússia contemporânea e Ucrânia - apressadamente formados à época do colapso soviético, e por que eles estão tão ligados a seu idioma, cultura, religião, história e terra a ponto de estarem dispostos a morrer por elas. Mas mesmo para aqueles russos que tendem mais para o pensamento tradicionalista, foi necessário acontecer essa guerra - a guerra que supostamente deveria separar - para que se unissem ideologicamente e espiritualmente com outros similares através das fronteiras, para começarem a questionar quem eles realmente são, incertos, mas esperançosos de forjar a idéia do Mundo Russo. Para além da Esquerda e da Direita, para além do Vermelho e do Branco.
No florescer da arena da espionagem internacional, um nome, mais que outros, evoca uma imagem de uma paciente, magistral traição, a presença insidiosa do inimigo no próprio santuário. Não importa qual país eles sirvam, é esperado que gerações de trainees de inteligência e contra-inteligência conheçam bem o seguinte nome: Philby. Há meio século, Harold Adrian Russell "Kim" Philby (1912-1988) permanece tanto na história da espionagem quanto na literatura popular, o traidor por excelência, o agente de penetração profunda que fez seu próprio caminho ao topo da inteligência britânica para fornecer à Rússia soviética os mais guardados segredos da Coroa.
O choque da traição de Philby reverberou por todo o Establishment britânico, enquanto em retrospectiva, o caso nos fala mais sobre a depravação social, cultural e espiritual de uma elite inteira, mais do que apenas das façanhas sórdidas de um espião.
Uma nova visão acerca da mais notória das verdadeiras histórias de espiões, "A Spy Among Friends: Kim Philby and the Great Betrayal" captura não apenas o trabalho em si de Philby para a M16 e a KGB, mas também examina a trilha de vidas destruídas que ele deixou em seu rastro. Usando entrevistas e materiais arquivados, o jornalista Ben McIntyre realizou um trabalho para saber como e os porquês de um homem britânico de alta classe ter enviado dezenas de agentes ocidentais para o outro lado da Cortina de Ferro até seus relentos, trazido miséria e ruína para suas diversas esposas, e destruído as carreiras de seus colegas e amigos íntimos. Philby era um traidor com uma causa; ele espionava não por dinheiro ou adrenalina, mas sim porque sinceramente acreditava em um futuro radiante prometido pelo comunismo.
Desde 1934, quando um recém graduado de Cambridge’s Trinity College, foi recrutado pela inteligência soviética, até sua dramática deserção em Beirute em 1963, Philby nutriu uma fé interior inabalável em sua missão, uma convicção mantida até sua morte.
A conversão do jovem Philby ao marxismo dificilmente se consideraria extraordinária – em toda a Europa do entre guerras, a ideologia comunista estava em voga entre intelectuais, e a União Soviética era vista como um experimento promissor na criação de uma nova sociedade. Assim, mais quatro colegas de classe de Philby também seriam leais à Moscou, formando o "Cambridge Five", uma rede de agentes que mesmo hoje é celebrada pela sucessora da KGB, a SVR, como um clássico exemplo de penetração de longo prazo.
A causa imediata para as classes instruídas ocidentais recorrerem ao marxismo pode ser encontrada na severa crise que primeiramente estagnou a Grã Bretanha, América do Norte e o continente europeu no amanhecer da década de 1930, com empobrecimento, instabilidade política e a ascensão do fascismo. Enquanto o privilegiado Philby e seus amigos não eram diretamente afetados pela depressão, a moda intelectual mantinha que o materialismo dialético e o socialismo estatal revolucionário eram a resposta à civilização capitalista que havia falhado.
A liberal democracia já havia se revelado como fraude conforme oligarcas expandiam suas propriedades de forma proporcional à miséria dos trabalhadores comuns. Dificilmente um sistema de pensamento alienígena nascido na estepe eurasiática, a tentação totalitária nasceu das filosofias de governo do Ocidente moderno.
Nascido em Lahore e com um nome inspirado no herói de "Great Game’", de Rudyard Kipling, Kim Philby foi uma criança do Império Britânico. E a milhares de quilômetros de Punjab, liderou um empreendimento global fundado sob os princípios lockeanos do liberalismo clássico, do poderio científico-industrial e da tradição de comércio marítimo de Cartago, Atenas e Veneza. O pai ausente de Philby, John Philby, havia feito sua carreira como um conceituado orientalista nos moldes de Lawrence da Arábia e servia como um "conselheiro" ao rei Ibn Saud. O jovem Philby recebeu uma educação clássica, em grande parte dentro das mais prestigiadas escolas públicas. Mesmo "Deus, Rei e Pátria" tendo sido o credo do serviço para a elite administrativa do império, poucos, se é que algum, desses homens acreditavam, de fato, em Deus da mesma forma que seus ancestrais, enquanto "rei" e "pátria" tornaram-se mera máscara retórica para os desígnios das predatórias dinastias bancárias. Como o melhor amigo de Philby e oficial M16 Nicholas Elliot declarou, eles serviam "rei, pátria, classe e clube", dificilmente uma fórmula inspiradora.
A insípida e ego-gratificante ideologia do humanismo liberal iluminista, junto com as cada vez mais consistentes doutrinas empiricistas de Hume, Bentham e Darwin, havia esvaziado instituições sociais – e o Cosmos – de qualquer significado transcendente. Era de se imaginar que um jovem aristocrata como Philby iria buscar uma nova revelação no marxismo, a narrativa salvífica de um reino terreno tornado perfeito pela revolução proletária. Em seu trabalho secreto para o partido, Kim Philby aplicou as conclusões lógicas dos princípios materialistas que a filosofia liberal havia ultimamente produzido; ele buscou a destruição de uma já então decadente Grã-Bretanha da partir de dentro para o alvorecer de uma nova e transformadora era. Assim como o asceta Ortodoxo Fr. Seraphim Rose tão bem diagnosticou, o jovem radical estava apenas consumando um processo iniciado bem antes dele pelos campeões da "liberdade" e da "razão":
O liberal, o homem mundano, é o homem que perdeu sua fé; e a perda da fé perfeita é o início do fim da ordem erguida sobre essa fé. Aqueles que buscam a preservação do prestígio da verdade sem crer nela oferecem a mais potente arma para todos os seus inimigos; uma mera fé metafórica é suicida. O radical ataca a doutrina liberal a cada ponto, e o véu de retórica não é proteção contra o forte impulso de sua lâmina afiada. O liberal, sob esse ataque persistente, dá ré ponto após ponto, forçado a admitir a verdade das acusações lançadas contra ele sem ser capaz de contrariar essa verdade crítica, negativa, com qualquer verdade positiva própria; até que, após uma transição longa e gradativa, de súbito ele acorda para descobrir que a Velha Ordem, não defendida e aparentemente indefensável, foi derrubada, e que uma nova verdade, mais 'realista' - e mais brutal - tomou o espaço".
A espionagem é o negócio de traição, e até seus camaradas e colegas agentes de Cambridge Guy Burgess e Donald Maclean fugirem para Moscou em 1951, o negócio era bom para Philby. Promovido após a Segunda Guerra Mundial para liderar operações anti-soviéticas e então enviado a Washington como o representante do MI6, o amistoso e produtivo infiltrado conquistou amigos com facilidade. Ele também conseguiu ser nomeado cavaleiro, a Ordem do Império Britânico, dada a ele pela Rainha Elizabeth. Para que não pensemos nessa honraria como uma mera aberração, lembremos o lamento de Edmund Burke:
"A era da cavalaria se foi. A dos sofistas, economistas e calculadores, triunfou; e a glória da Europa está extinta para sempre".
Que Philby e Anthony Blunt, outro dos Cinco de Cambridge e Inspetor das Imagens do Rei, foram condecorados antes de sua traição ter sido exposta pelo MI5 é perdoável, mas eles próprios eram sintomas de uma patologia mais profunda. A cavalaria em nossa era, como cada outra coisa de valor, foi sistematicamente sujeita à lógica de inversão. Como explicar de outra forma títulos nobiliárquicos dados a mestres da usura, promotores da anti-cultura e rock stars dissolutos? E quanto a "Sir" Jimmy Savile, DJ da BBC e famoso confidente da Família Real, que por décadas cometeu estupros contra incontáveis crianças de toda a Grã-Bretanha, ou as várias dúzias de parlamentares e burocratas do governo que só agora foram implicados em organizações de pedofilia e assassinato infantil? Muito mais do que a espionagem, malignidade dessa natureza porta diretamente a estampa do satânico; quisera Deus despertasse Artur e seus cavaleiros para varrer essa imundície da terra verde e agradável da Inglaterra.
Guerreiro frio até o fim, Philby reivindicava seu próprio papel dúplice no confronto bipolar entre capitalismo e comunismo. Só que desconhecido para as fileiras de cada lado, o resultado planejado desse confronto dialético era a tirania universal. Assim como os marxistas apelavam para a inevitabilidade da história, a superclasse plutocrática ocidental - muito abertamente através de teóricos de H.G. Wells e Aldous Huxley a Bertrand Russel e Zbigniew Brzezinski - tem celebrado a supremacia da "ciência" para justificar sua vontade de poder total. O Estado Mundial tecnocrático, um sonho de louco que ameaça se transmutar em nossa realidade, faria com que o projeto soviético parecesse brincadeira de criança. Kim Philby era sem dúvida um traidor; níveis acima dele, criminosos muito mais pomposos tem engendrado a aniquilação da família, da herança nacional e religiosa, e da própria essência da identidade humana. Aí reside a maior das traições.