A princípio, a violência e o espírito são antíteses. O espírito é o primeiro antagonista da violência. O espírito cresceu a tal extremo que, no fim das contas, ele se situa sempre contra a violência. A violência é sentida como ampla e maciça no espaço; o espírito tem ao seu lado o tempo, e em todo caso mostra ir mais longe com ele. Onde a violência se sobrepõe, o espírito mina o terreno em que ela descansa. Quando a pressão da violência cresce de forma desmesurada, o espírito organiza uma contrapressão que não pode ser controlada; onde a sua compulsão não deixa alternativa de escape, ele descobre portas traseiras. Ele destroi a reputação da violência, rouba sua boa consciência e a leva a um estado máximo de ridículo que é fatal para ela. Esta oposição primordial emerge historicamente nas mais variadas formas. Aparece como a polaridade do espírito e da espada, do santo e do heroi, do papa e do imperador, do sacerdote e do guerreiro, do letrado e do soldado. A violência é segura de si, se mantém autossuficiente para a certeza de sua irresistibilidade, ameaça intolerantemente todas as resistências com a destruição existencial; por sua vez, o espírito dá reconhecimento aos valores contra os quais pode resistir por um longo tempo, mas aos quais um dia inevitavelmente acaba se submetendo: ele cede perante ela, mas com um tom ressentido de desprezo como "crua", "desajeitada", "estúpida", "estreita", "intransigente", "bárbara", "imoral", para colocá-la em descrédito. Este foi o mais decisivo êxito do espírito contra a violência: que ele se impôs como a instância legitimada para julgar. Assim ficou a reputação da violência à sua mercê. É parte de um de seus outros empreendimentos de guerra não lidar suavemente com essa reputação. Mas ao dar prioridade a se tornar seu próprio juiz, ele tomou o cuidado de não ocultar sua luz com modéstia. Ele era tão "superior" quanto a violência era "inferior", tão refinado quanto ela era crua, tão habilidoso quanto ela era desajeitada, tão amplo quanto ela era estreita, tão claro quanto ela era escura, tão perspicaz quanto ela era cega, tão livre quanto ela era escravizada, tão universal quanto ela era confinada.
A Violência é a manifestação imediata de uma vitalidade existente, uma descarga natural de potencialidade vital inquebrantável. Onde sob nenhuma circunstância podem a violência e o espírito marchar lado a lado, um ser de ordem inferior se revela. Onde harmonia e irmandade entre ambas é autoevidente, o ser superior, o homem de ordem superior, o homem de caráter grandioso, se anuncia.
Há algo de errado no élan vital quando a violência é isolada contra o espírito e o espírito é isolado contra a violência. Quando o espírito sabota a violência, ele consome a substância da vida, ele é "estrangulador da vida". Por isso que a desconfiança da violência em relação ao espírito não pareça carecer completamente de fundamentos. O Heroi Alemão não quer ser esperto; ele não seria ele mesmo se deixasse de ser o bárbaro às portas de Roma. Hebbel, em Os Nibelungos, faz Siegfried nos dizer o que sua mãe pensava dele: "Ela diz que sou forte o bastante para conquistar o mundo, mas que sou estúpido demais para reivindicar o menor montículo de terra; e que se não perco meus próprios olhos, é somente porque isso é impossível". Como a Violência é a primeira a impor ordem, o status político, constroi o "Estado", que realiza o "ato", ela se sente como um fundamento criativo em si mesmo. Já a interpretação de sua obra pelo espírito a percebe como uma estéril sabe-tudo, e sua crítica como uma desintegração audaz, arrogante e destruidora.
Há casos nos quais há um auspicioso compromisso entre violência e espírito; ele se forma em um equilíbrio vantajoso para ambas as partes. A violência entende que ela dirige melhor quando ela cede ao espírito a honra da representação; assim, por assim dizer, ela ganha terreno sem ser percebida. Crê-se que tem algo a ver com o espírito e ela então tem a oportunidade de se enraizar. Ela vem como "serva da Ideia"; ela se traja nessas vestes porque ela sabe que através disso o reino de seu domínio se espalha ilimitadamente. O espírito, porém, colhe elevadas honrarias; através da simbiosa com a violência ele se torna mais importante, dotado de maior autoridade. Aí residia a grandeza da antiga Roma, espírito e violência mantidos em estreita proximidade; a espada romana adquiriu o renome de pavimentar o caminho para a lei pacificadora. Quando Roma perdeu a espada, o pensamento de sua liderança senhorial estava implantado tão fundo nos corações dos homens ocidentais que ele pôde ser reclamado por outros meios: os dogmas cristãos assumiram o lugar das leis, a igreja assumiu o lugar do império, os sacerdotes e monges assumiram o lugar dos legionários. Primeiro os imperadores, então os príncipes dos muitos povos cederam à Roma eclesiástica a espada que eles próprios não mais possuíam.
A violência econômica é a forma que a violência assume quando ela é exercida por mãos judaicas. Tudo recebe seu preço aqui - também o espírito; e quando se paga alto o suficiente ele se deixa comprar. A educação passa a ser considerada como equivalente à propriedade; o poder do ouro não se mostra desnudo, mas se oculta por trás das "realizações culturais e civilizatórias" que ele financia. A plutocracia está ligada tão proximamente ao espírito quanto a teocracia e a cesarocracia. Isso dá a estes sistemas de poder a sua aparência encantadora, cativante, convincente e universal.
O cidadão capitalista é o ex-bárbaro que cresceu na direção dos horizontes do plano capitalista. Os laços nacionais que ele ainda cultiva são os resquícios de seu barbarismo; mas em seu imperialismo econômico ele obedece ao momentum da racionalidade econômica.
Este foi o impacto fundamental do Império, sob cuja influência o cidadão sempre manteve um bom relacionamento com o espírito; que apenas no longo prazo ele se voltou contra o camponês e o soldado. Em suas cidades ele honra o artista, o erudito e o literato por preservarem seus interesses espirituais; assim ele se compromete com a causa do espírito por gratidão: ele não tem motivos para se rebelar contra ele. Ao se converter em promotor de "interesses intelectuais" e dos valores "civilizatórios", ele é considerado como tendo degradado os trabalhadores, explorado as massas populares consumidoras e submetido os povos coloniais a impiedosas chantagens.
(Trecho do livro Das Dritte Imperiale Figur)
(Trecho do livro Das Dritte Imperiale Figur)