por Cristian Taborda
(2020)
Dominação Política, Disciplina Social, Subordinação Cultural
Dizia Marx em "A Ideologia Alemã": "As idéias da classe dominante são as idéias dominantes de cada época [...] portanto, na medida em que dominam enquanto classe e na medida em que determinam todo o âmbito de uma época histórica, é compreensível que o façam em toda a sua extensão e, portanto, entre outras coisas, também como pensadores, como produtores de idéias, que regulem a produção e distribuição das idéias de seu tempo; e que suas idéias sejam, portanto, as idéias dominantes da época”.
Devemos então nos perguntar, em relação ao presente, quais são as idéias dominantes de nossa época? Qual é a "classe" dominante? Quem produz, regula e distribui essas idéias? Qual é a ideologia inquestionável?
Uma das principais características de qualquer ideologia é não se assumir como tal, ela se naturaliza e é dada como algo óbvio, ela consegue se instalar no senso comum sem ser questionada. A ideologia como um conjunto de ideias nos permite dar a nós próprios uma forma de conhecer as coisas, uma cosmovisão, tendo o viés de expandir essa forma particular de ver o mundo à totalidade. Vê-se o mundo através dessas lentes. Foi isso que o marxismo, o liberalismo e o fascismo fizeram durante o século passado, a ideologia dominante acabou se tornando um totalitarismo, as ideologias acabam pensando pelo povo e instalando o pensamento único, perseguindo e eliminando o dissidente.
Hegemonia e Globalização
Após a implosão da União Soviética e a queda do Muro de Berlim, o liberalismo se alçou triunfantemente e o domínio da economia a nível global através de um mercado único se impôs acima de tudo, se produziu uma neutralização da política nos termos de Carl Schmitt. O marxismo, o liberalismo e as posturas de terceira posição foram fabocitados, absorvidos, pelo capitalismo financeiro e pela globalização. A luta pela distribuição de renda, por direitos sociais, por liberdade, por justiça social e pelas idéias de família, país e religião foram substituídas pela luta por direitos individuais, reivindicações de minorias e integração cultural em um mundo cosmopolita. A globalização alcançou a sua hegemonia pós-liberal com base no consenso dos derrotados e na interdependência econômica construída.
Diante da consagração de um capitalismo absoluto, o marxismo abandonou a luta de classes e os trabalhadores como sujeito político, integrando-se no mundo globalizado; o liberalismo foi absorvido pela gestão tecnocrática e pela administração econômica, deixando de lado os ideais liberais; e os partidos que expressavam os movimentos institucionalizados de terceira posição implementaram políticas neoliberais e discursos progressistas. Acompanharam o processo de globalização com a reivindicação das minorias, os postulados cosmopolitas de um mundo sem fronteiras, descartando suas idéias tradicionais e submetendo-se ao politicamente correto. Estas tradições filosóficas se viram agora recicladas na única ideologia viva, a ideologia globalista, o "progressismo transnacional", como o cientista político americano John Fonte a descreve. O pensamento hegemônico.
O ‘68’ como "Revolução Cultural". A Esquerda Pós-Moderna
Mas esta ideologia tem a sua origem antes, em uma época em que a sua expressão histórica e política é o maio francês de 1968, um movimento cultural onde o eixo da esquerda muda, com ela adotando as idéias provenientes da "Escola de Frankfurt", que enfatiza os elementos éticos, subjetivos e individuais da "teoria crítica", de modo que esta foi configurada como uma teoria geral de transformação social, impulsionada por um desejo de "libertação" entendida em um sentido individual. A “libertação" e a "emancipação" eclipsam assim o objetivo da revolução e se fundem no horizonte utópico de uma "felicidade" orientada para o desenvolvimento pessoal. O ponto de partida era o indivíduo, seu desejo, sua arte e a cultura como forma de expressão política contra a ordem estabelecida, abandonando as antigas premissas socialistas.
Este movimento tinha uma amálgama de pensadores que construíram a sua visão da realidade e acabaram por moldar a ideologia atual, cujos fundamentos se encontram na Teoria Queer de Judith Butler. Parte da "escola da suspeita" de Nietzsche, Marx, Freud, a "teoria crítica" de Adorno, Marcuse, Horkheimer, o pós-estruturalismo de Michel Foucault, Gilles Deleuze e Jacques Derrida com a sua desconstrução.
Ideologia de Gênero e Relativismo
Influenciada por todos esses pensadores, dos quais toma conceitos diferentes, e por feministas radicais como Simone de Beauvoir e Monique Wittig, Butler faz uma síntese que ela expõe em "Desfazer o Gênero" onde ela sustenta como premissa fundamental que "as categorias homem e mulher são idéias políticas e não naturais", ideia que dá suporte à ideologia dominante desta época. A ideologia de gênero.
Ela propõe o gênero como uma construção social, diferente do sexo biológico naturalmente dado, onde as mulheres e as "minorias" devido à sua condição de gênero são oprimidas por uma estrutura patriarcal machista. E uma heteronormatividade que persegue as "dissidências" e sexualidades "não-binárias".
A solução já não seria uma revolução social e uma luta de classes como proposto pelo marxismo, mas a subversão de valores e a disputa pelo poder nos espaços públicos por parte dos corpos (individuais). A desconstrução como método de resistência, distorcendo a proposta gramatical de Derrida.
Esta ideologia, coerente com o capitalismo financeiro e funcional à libertação absoluta do indivíduo, que o dissocia de qualquer vínculo histórico, coletivo, transcendente e biológico, que promove um hedonismo incessante, conclui no consumismo e no prazer sexual como única realização do homem ou da mulher, a liberalização do desejo, a mera satisfação material, aniquilando toda espiritualidade e naturalidade. O niilismo de Nietzsche, o desejo de Freud, a descentralização que propõe Deleuze e a ideia transgênero de Butler são o resumo da nova ideologia dominante, de um capitalismo especulativo, que, nos termos de Hegel, reflete os conceitos da nova classe global na realidade: uma elite sem Deus, sem pátria, consumista e transexual.
A Revolução Antropológica
Como propõe Michel Onfray, entramos em um novo tipo de sociedade totalitária que destrói a verdade, abole a liberdade e nega a natureza. É isto que define perfeitamente a ideologia de gênero que promove uma verdadeira revolução, uma "revolução antropológica", apagando a diferença biológica dos sexos sob a máscara conceitual do gênero, eliminando a transcendência, a ideia de Deus e com a ditadura do relativismo que instala a "pós-verdade" e elimina a distinção entre o bem e o mal, abre as portas para o transumanismo como conseqüência lógica da evolução, o homem sem limites o "Homo Deus".
As burguesias industriais de raízes nacionais foram superadas pelo desenvolvimento econômico transnacional diante desta nova classe global apátrida, que retomou o controle da economia, a oligarquia financeira internacional, a classe dominante representando o capital financeiro que consolidou seu poder econômico proveniente do mercado mundial encontra, hoje, como limites de sua expansão política, a soberania dos territórios, os Estados reguladores e a Igreja, um obstáculo para instalar o sistema de governança global segundo o mercado único, e que encontra como outro de seus limites de expansão biológica a condição humana.
Tendo "consciência para si" reside aí a sua necessidade de produzir, financiar, distribuir e regular as suas ideias, transnacionalistas, transumanistas e transexuais, para ultrapassar as barreiras nacionais, os limites humanos impostos pela moral e uma revolução sexual para frear a reprodução, especialmente nos países da periferia, que vê como uma explosão demográfica em detrimento dos seus interesses, tal como expresso por Henry Kissinger no relatório NSSM 200 (National Security Study Memorandum 200).
Totalitarismo Globalista
A mídia, as ONGs e as universidades são as "fábricas de subjetividades" que reproduzem as ideias do poder global e censuram os dissidentes. Podemos ver como estes "aparatos ideológicos do mercado", reformulando o conceito de Althusser, são hoje os promotores do aborto, da subrogação de ventre ou da linguagem "inclusiva" entre outras políticas "progressistas". Um exemplo claro é a propaganda emanada em série de empresas como a Netflix ou a Disney que promovem a hipersexualização ou a transexualidade, diferentes mídias que realizam um bombardeio sistemático de notícias ligadas ao gênero, ao feminicídio ou ao hedonismo nas redes sociais e na televisão, as políticas promovidas por organizações como a Open Society Foundation ou Human Rights Watch e universidades como a UBA que aceitam a linguagem "inclusiva" de forma oficial.
No plano da censura e da marginalização, basta ver o pouco espaço que têm aqueles que diferem do pensamento politicamente correto, e se há espaço, a tentativa de ridicularizá-los ou rotulá-los como "retrógrados", "conservadores" ou "conspiratórios" para anular a opinião daqueles que pensam de forma diferente. Mais explícito se faz no espaço público; quando a intolerância e o ridículo chegam ao ponto de cobrir um mural de um bebê no ventre de sua mãe e depois o de uma mulher grávida, como os feitos pela artista Lisette Feider na parte exterior da maternidade do Hospital Piñero em Buenos Aires, estes foram censurados como um ato de "violência simbólica" e "provocação". Claramente, expressar através da arte a representação de trazer uma vida ao mundo é uma provocação para a necropolítica.
Como se isso não fosse suficiente para instalar sua ideologia no fundo da consciência, o globalismo, seguindo os conceitos de Pierre Bourdieu, conta com o Estado, que tem o "monopólio da violência simbólica". A institucionalização da ideologia de gênero como um credo oficial com o dispositivo legal-repressivo em suas mãos. Podemos ver a título de exemplo o caso da Espanha com o novo Ministério da "Igualdade" ou o nosso país com o Ministério de "Gênero e Diversidade", organismos encarregados da difusão propagandística ideológica de gênero. Os governos cooptados e sob pressão dos organismos supranacionais que representam a elite financeira estão encarregados de difundir a ideologia dominante usando o Estado e órgãos como a ONU, o FMI, a União Europeia ou o Banco Mundial que carecem de legitimidade democrática e fazem parte da plutocracia globalista. O totalitarismo financeiro que, através da ditadura do dólar, promove o progressismo cultural e a anarquia comercial.
A ideologia de gênero é usada pela oligarquia de três maneiras: 1) Como dominação política através do politicamente correto e sob o disfarce moral da "diversidade", da "igualdade" e da "inclusão", desta forma eleva-se acima do resto exercendo a supremacia moral; 2) Como disciplina social se impõe através do punitivismo e do normativismo legal promovido pelo direito com uma "perspectiva de gênero", acabando com o princípio da inocência diante de uma acusação através da sentença midiática, e quando não, por meio do escrache público; 3) Como subordinação cultural, aceitando crédito internacional sob a condição de implementar políticas de gênero ou antinatalistas como fazem o Banco Mundial ou o FMI, o financiamento de organismos para promover políticas públicas baseadas no lobby LGTB e ONGs que financiam o ativismo feminista, a aceitação de ideias com origem nos grandes think-tanks estrangeiros, usados como métodos de dominação. Estamos assistindo a uma neocolonização, que é ideológica, uma homologação cultural onde o pensamento se torna homogêneo e as diferenças que enriquecem cada povo são apagadas, sendo estas subordinadas à monocultura mundialista do consumo.
Hoje, inquestionavelmente diante do circo midiático que representa o establishment globalista, a ideologia do poder é apresentada como nobre e em defesa das minorias "oprimidas", quem procure retirar o véu e desmascarar as falácias em que incorre, informar quem financia e promove estas ideias, ou apontar os meios de comunicação e as empresas aliadas no negócio do capitalismo “gay friendly”, é demonizado e perseguido pela polícia do pensamento progressista que, sob uma suposta superioridade moral e em nome da "inclusão", exclui qualquer um que pense de forma diferente. Qualquer um que ouse desafiar a ditadura do relativismo imposta pela ideologia de gênero é acusado de ser "ultra-direitista" ou "populista", para dizer o mínimo, se não for marcado como fascista em nome do antifascismo. A ideologia está conseguindo consumar o crime perfeito, como diria Jean Baudrillard, matando a realidade.
A Nova Ordem Simbólica
Esta nova ordem simbólica que tenta destruir tradição, costumes e cultura, é imposta pela apropriação dos símbolos nacionais e populares pelos progressistas para seu benefício político e através da novilíngua do gênero, da promoção de indivíduos unisex sem distinção de gênero, da hipersexualização da vida e da feminização da política. É a consumação da batalha cultural travada pela esquerda progressista desde 1968. Ao se converter na hegemonia político-cultural, esta simbologia alcança agora consenso tanto à esquerda como à direita.
A nova ordem é imposta à esquerda pelo progressismo com a ideologia do gênero e à direita pelo neoliberalismo com a ideologia do livre comércio. De ambos os polos, determinam um indivíduo sem família, cosmopolita, precarizado, de baixo custo, em um único mercado global sem fronteiras onde a sua única liberdade é consumir. O globalismo tem como ideal o homem consumista sem identidade, sem pátria e sem sexo. Uma não-pessoa. A proposta da classe global radicalizada é a configuração de uma nova ordem mental através da psicopolítica e da guerra psicocultural, mantendo o controle das ideias e as desigualdades sociais, sem alterar a ordem material e o status quo.
A partir desta nova ordem simbólica o progressismo classifica a família tradicional como uma "opressão patriarcal", a nação como uma ideia fascista e vê a religião como uma mentira. A partir do peronismo vemos, em tudo isso, o contrário, a construção de um povo: unidade, identidade e cultura. A família, anterior ao indivíduo, como célula orgânica de toda a sociedade, é a primeira comunidade onde se formam os laços naturais de solidariedade e amor, na relação única de mãe e filho. A Nação como a conformação da identidade de um povo que promove a unidade em um determinado território no qual a comunidade é realizada preservando suas tradições e costumes. A religião como fundamento da cultura que determina a moralidade do povo e os seus valores, de raiz cristã no nosso caso. Família, pátria e religião são os pilares de uma vida comum que constroem uma identidade e uma cultura enraizadas na tradição e nos costumes, são hoje a verdadeira resistência ao poder hegemônico.
Cultura da Vida
Diante do avanço desta cultura de descarte e colonização ideológica, é imperativo promover a cultura da vida e do amor à família, reivindicar a pátria e a fé nos valores transcendentes, o bem, a verdade e a justiça.
O bom senso deve ser oposto à ideologia maluca do gênero, ao relativismo absoluto e à revolução antropológica. E o princípio que diz: "A realidade é superior à ideia".
Contra o capitalismo financeiro absolutista uma economia para o benefício dos povos, onde no centro esteja o trabalho e não o Deus-dinheiro.
Contra a luta dos sexos e a disputa de gênero a máxima que diz: "a unidade prevalece sobre o conflito". Porque nem o homem nem a mulher se podem realizar sozinhos, muito menos em uma comunidade que não se realiza a si mesma.