16/12/2010

Degeneração

"Nos dois ou três primeiros mil anos de existência trepamos a uma certa altura de civilização; mas depois temos vindo rolando para baixo numa cambalhota secular.

O tipo secular e doméstico de uma aldeia Ária do Himalaia, tal como uma vetusta tradição o tem trazido até nós, é infinitamente mais perfeito que o nosso organismo doméstico e social. Já não falo de gregos e romanos: ninguém hoje tem bastante gênio para compor um coro de Ésquilo ou uma página de Virgílio; como escultura e arquitetura, somos grotescos; nenhum milionário é capaz de jantar como Lúculo; agitavam-se em Atenas ou Roma mais idéias superiores num só dia do que nós inventamos num século; os nossos exércitos fazem rir, comparados às legiões de Germânicos; não há nada de equiparável à administração romana; o boulevard é uma viela suja ao lado da Via Ápia; nem uma Aspásia temos; nunca ninguém tornou a falar como Demóstenes: — e o servo, o escravo, essa miséria da antiguidade, não era mais desgraçado que o proletário moderno."
(Eça de Queirós)