por Anne-Laure Debaecker
(2023)
Neste livro, você examina a espinhosa questão da identidade. Como explica o retorno dessa questão ao centro das atenções?
Não se trata tanto de um retorno, mas de um surgimento gradual, que é o resultado de um longo processo. Nas sociedades tradicionais, que são sociedades de ordens e estatutos, a questão da identidade dificilmente surge. As coisas mudaram com o advento da modernidade. No século XVIII, a ideologia do progresso incentivou as pessoas a olhar para o futuro e a valorizar as coisas novas, que supostamente seriam cada vez melhores. As tradições herdadas do passado foram desvalorizadas da mesma forma: o passado estava, literalmente, ultrapassado. A antropologia liberal, por sua vez, concebe o homem como um ser que busca maximizar seus melhores interesses em todos os momentos por meio de escolhas racionais que não devem nada ao que está acima dele, à sua herança e às suas lealdades. A desintegração das sociedades orgânicas enfraquece o vínculo social. A pessoa dá lugar ao indivíduo. Os pontos de referência começam a desaparecer, ainda mais porque a aceleração da mobilidade está levando ao êxodo rural e ao desenraizamento. O trabalho, que contribuiu muito para a identidade, também se transforma: o "emprego" está substituindo o ofício, e a insegurança no trabalho está se espalhando.
Mais recentemente, a imigração em massa levou a uma reviravolta nas relações sociais que está exacerbando o problema. O mesmo se aplica à moda de todas as formas de hibridização, apoiada especialmente pelos delírios da teoria de gênero, que defende uma sociedade "fluida", "inclusiva" e "não binária". A diferença mais básica da humanidade, a diferença entre os sexos, está sendo questionada. É o desaparecimento generalizado de pontos de referência em um momento em que todas as instituições estão em crise que acaba explodindo a eterna questão da identidade: Quem sou eu? Quem somos nós? É claro que essa questão só surge de fato quando a identidade se torna incerta, ameaçada ou desaparece completamente.