Há muita coisa no Manifesto Comunista que é válida desde uma perspectiva tradicionalista/conservadora. Marx foi um produto do "espírito" de sua Era, ou zeitgeist. Esse zeitgeist oitocentista permanece o mesmo hoje. Assim, Marx fornece um insight no materialismo, ou o que poderia também ser chamado determinismo econômico, que continuou a ser o ethos dominante do século XX e do atual. Como Oswald Spengler apontou, o marxismo não busca transcender o espírito do Capital, mas expropriá-lo. A perspectiva fundamental de um marxista ou de um CEO corporativo globalista é a mesma. Este artigo examina a análise marxista do que hoje é chamado "globalização", mas o faz sob uma perspectiva conservadora.
O método de análise histórica de Marx era o da dialética: tese, antítese e síntese. Sua atitude frente ao capitalismo como parte necessária da dialética histórica precisa ser compreendida sobre essa base. Não é necessário ser um marxista para apreciar a dialética como método válido de interpretação histórica, e Marx de fato repudiou Hegel, o mais conhecido dos teóricos dialéticos, por causa da abordagem metafísica de Hegel. Em contradistinção, o método de Marx é chamado "materialismo dialético".
Dialeticamente, a antítese, ou "negação" como Hegel a teria chamado, do marxismo é o "reacionismo", para usar o próprio termo de Marx, e se for aplicada uma análise dialética aos argumentos fundamentais do Manifesto Comunista uma metodologia prática para a sociologia da história de uma perspectiva "reacionista" emerge.
Conservadorismo e Socialismo
Pelo menos nos países anglófonos há uma dicotomia nebulosa em relação a Esquerda e Direita, particularmente entre especialistas da mídia e acadêmicos. O que é normalmente chamado "Nova Direita" ou "Direita" no mundo anglófono é mais precisamente identificável com o Liberalismo Whig. O filósofo conservador inglês Anthony Ludovici sucintamente definiu a dicotomia histórica, ao invés de comunalidade, entre Toryismo e Liberalismo Whig, quando discutindo a saúde e vigor da população rural em contraste à urbana:
"...E não é assombroso portanto que quando o tempo da Grande Rebelião, a primeira grande divisão nacional, ocorreu por uma grande questão política, o Partido Tory-Rural-Agrícola deveria ter se mobilizado em proteção e defesa da Coroa, cotra o Partido Whig-Urbano-Comercial. Verdade, Tory e Whig, como a designação dos dois principais partidos no Estado, ainda não eram conhecidas; mas nos dois lados que se digladiavam sobre a pessoa do Rei, o temperamento e objetivos desses partidos já eram discerníveis com clareza.
Carlos I, como eu apontei, foi provavelmente o primeiro Tory, e o maior conservador. Ele acreditava em garantir a liberdade pessoal e a felicidade do povo. Ele protegeu o povo não só contra a rapacidade dos empregadores no comércio e na manufatura, mas também contra a opressão dos poderosos e grandes".
Foi a ordem tradicional, com a Coroa no ápice da hierarquia, que resistiu aos valores monetários da revolução burguesa, manifesta pela primeira vez na Inglaterra, e então na França e por muito do resto da Europa do século XIX. O mundo permanece sob a influência dessas revoluções, como o faz ainda sub a Reforma que forneceu à burguesia uma sanção religiosa. Essas Revoluções foram parte da dialética histórica que Marx via como necessária na marcha rumo ao comunismo.
Como Ludovici apontou, pelo menos na Inglaterra, e portanto como uma herança mais ampla das nações anglófonas, a Direita e os Liberais "Livre-Mercadistas" emergiram não só como adversários ideológicos, mas como soldados em um conflito sangrento durante o século XVII. O mesmo conflito sangrento se manifestou nos EUA na guerra entre o Norte e o Sul, a União representando no sentido político inglês o puritanismo e os interesses plutocráticos concomitantes; o Sul, um renascimento da Tradição da Cavalaria, o ruralismo e o ethos aristocrático. Era assim, pelo menos, que o Sul percebia o seu conflito e estava agudamente consciente dessa tradição. Daí, quando em 1863 o Secretário Confederado de Estado Judah P. Benjamin foi questionado por idéias para um Selo nacional dos Estados Confederados da América, ele sugeriu "um cavaleiro" baseado na estátua equestre de Washington na Praça do Capitólio em Richmond e afirmou:
"Faria honra justa ao nosso povo. A figura do cavaleiro é típica do cavalheirismo, da bravura, da generosidade, da humanidade, e de outras virtudes da cavalaria. Cavalier é sinônimo de 'gentil-homem' em quase todas as línguas modernas... a palavra é eminentemente sugestiva da origem da sociedade sulista como usada em distinção à puritana. Os sulistas permanecem o que seus ancestrais foram, cavalheiros".
Esse é o fundamento histórico pelo qual, para a indignação de Marx, os resquícios das classes governantes tradicionais buscavam uma solidariedade anticapitalista com os camponeses e artesões crescentemente proletarizados e urbanizados. Para Marx, tal "reacionismo" era uma interferência no processo dialético ou na "roda da história".
O filósofo-historiador conservador Oswald Spengler era intrinsecamente anticapitalista. Ele e outros conservadores viam no capitalismo e na ascensão da burguesia o agente da destruição das bases da ordem tradicional, assim como Marx. Quase nada disso é compreendido pelos conservadores hoje, especialmente no mundo anglófono, onde o conservadorismo é geralmente considerado como uma defesa do capitalismo, que é também equiparado com "propriedade privada", apesar das tendências centralizantes que Marx previu - com razão.
O marxismo, crescendo a partir do mesmo zeitgeist que o capitalismo inglês em meio a revolução industrial, procede do mesmo ethos. Marx escolheu a escola inglesa de economia, e desprezou a escola alemã, de orientação conservadoria-protecionista. Spengler notou que:
"Marx era assim um pensador exclusivamente inglês. Seu sistema biclasse deriva da situação de um povo mercantil que sacrificou sua agricultura ao grande capital, e que nunca havia possuído um corpo de servidores civis com uma consciência estatal pronunciada, prussiana. Na Inglaterra havia apenas 'burguesia e proletariado', agentes ativos e passivos nas questões empresariais, ladrões e roubados - todo o sistema era bastante viking. Transferidos para o âmbito dos ideais políticos prussianos, esses conceitos não fazem sentido".
Spengler em Declínio do Ocidente afirma que no ciclo tardio de uma Civilização há uma reação contra o domínio do dinheiro, que derruba a plutocracia e restaura a tradição. É um conflito final na Civilização Tardia do que ele chama "sangue contra dinheiro":
"...Se chamamos a esses poderes financeiros de 'Capitalismo', então nós podemos designar como socialismo a vontade de chamar à vida uma poderosa ordem político-econômica que transcende todos os interesses de classe, um sistema de consciência elevada e senso de dever que mantém a totalidade em boas condições para a batalha decisiva de sua história, e essa batalha é também a batalha do dinheiro e da lei. Os poderes privados da economia querem caminhos livros para sua aquisição de grandes recursos..."
Em uma nota de rodapé ao trecho acima Spengler lembra os leitores em relação ao "capitalismo" que, "nesse sentido a política de interesses dos movimentos de trabalhadores também pertencem a ele, na medida em que seu objetivo não é a superação dos valores monetários, mas a sua posse".
O conceito "prussiano" de "socialismo" pode ser resumido em um de serviço ao interesse comum, acima dos interesses seccionais: "organização, disciplina, cooperação. Todas as coisas que são independentes de qualquer classe singular". Spengler afirma que Marx tomou essas características externas do que é essencialmente uma idéia ética, e os tornou instrumentos de uma luta de classes, como uma doutrina para o saque.
Enquanto Spengler era motivado pelo "espírito prussiano" da disciplina e do dever, em distinção ao individualismo inglês, que ele via no programa marxista, havia aqueles na Inglaterra que também buscavam uma alternativa ao ethos monetário tanto do capitalismo como do marxismo, e doutrinas como o Crédito Social, o Distributismo e o Socialismo de Guildas, muitas vezes em aliança e centrados ao redor do milieu de A.R. Orage e sua revista The New Age, emergiram e chamaram a atenção de Ezra Pound, T.S. Eliot, Hillaire Belloc, G.K. Chesterton e o poeta neozelandês Rex Fairburn.
Casta & Classe
O "conservadorismo revolucionário" de Spengler et al é predicado no reconhecimento do caráter eterno de valores centrais e instituições que refletem o ciclo - ou morfologia - de culturas no que Spengler chamou de sua época da "Primavera". Um exemplo dessa diferença em ethos entre ciclos tradicionais ("Primavera") e modernos ("Inverno") de uma civilização é visto em manifestações como a casta, como um reflexo espiritualmente fundado das relações sociais, em distinção à classe como entidade econômica; ou profissão como dever social de proveniência divina representada pela corporação de ofícios, como distinta de ser um enfado econômico representado pelos sindicatos (incluindo associações de empregadores) como instrumentos de divisão de classe. A ordem tradicional representa o ethos espiritual e cultural; a época "moderna", o dinheiro, algo reiterado por Spengler em nosso próprio tempo. Os livros sagrados de muitas culturas dizem muito do mesmo, e se poderia apontar para o Livro das Revelações.
O Mito do "Progresso"
Enquanto a Civilização Ocidental se orgulha de ser o epítome do "progresso" através de sua atividade econômica, ela é baseada na ilusão de uma evolução darwiniana linear do "primitivo" ao "moderno". Talvez algumas palavras mais sucintamente expressem a antítese entre as percepções modernista e conservadora tradicional da vida do que o otimismo vivaz do darwinista oitocentista Dr. A.R. Wallace em seu O Século Maravilhoso (1898):
"Não só nosso século é superior a qualquer um que já tenha passado mas...ele pode ser comparado melhor com todo o período histórico precedente. Deve ser assim sustentado que ele constitui o início de uma nova era de progresso humano... Nós homens do século XIX não temos sido lentos em elogiá-lo. O sábio e o tolo, o erudito e o ignaro, o poeta e o jornalista, o rico e o pobre, todos incham o coro de admiração pelas invenções e descobertas maravilhosas de nossa própria era, e especialmente por aquelas inúmeras aplicações da ciência que agora fazem parte de nossa vida quotidiana, e que nos lembram a cada hora de nossa imensa superioridade sobre nossos comparativamente ignorantes ancestrais".
Como a crença de Marx de que o comunismo é o último modo de vida humana, o capitalismo possui a mesma crença. Em ambas visões-de-mundo não há nada além de mais "progresso" de natureza técnica. Ambas doutrinas representam o "fim da história". O tradicionalista, porém, vê a história não como uma linha reta do "primitivo ao moderno" mas como um contínuo fluir, de ondas históricas cósmicas, ou ciclos. Enquanto a "roda da história" de Marx se move para a frente atropelando toda tradição e herança até se deter eternamente em um muro cinzento de concreto e aço, a "roda da história" tradicionalista revolve em um ciclo em um eixo estável, até o momento em que o eixo apodrece - a não ser que esteja suficientemente lubrificado ou seja substituído na hora certa - e os raios caem; para ser substituída por outra "roda da história".
Dentro do contexto ocidental, as revoluções de 1642, 1789 e 1848, ainda que em nome do "povo", buscaram dar poder ao mercador sobre as ruínas do Trono e da Igreja. Spengler escreve sobre esta última era que na Inglaterra, "...a doutrina do Livre Comércio da Escola de Manchester foi aplicada pelas corporações de ofício à forma de bens chamada 'trabalho', e eventualmente receberam formulação teórica no Manifesto Comunista de Marx e Engels. E assim foi completado o destronamento da política pela economia, do Estado pelo banco..."
Spengler chama os tipos marxianos de socialismo de "capitalistas" porque eles não objetivam substituir os valores fundados no dinheiro, "mas possuí-los". Ele afirma do marxismo que ele não é "nada além de um capanga confiável do Grande Capital, que sabe perfeitamente bem como fazer uso dele". Ainda:
"Os conceitos de liberalismo e socialismo são postos em movimento apenas pelo dinheiro. Foram os Equites, o partido do dinheiro, que tornou o movimento popular de Tiberius Gracchus possível; e assim que a parte das reformas que lhes era vantajosa havia sido legalizada com sucesso, eles se retiraram e o movimento entrou em colapso.
Não há movimento proletário, ou mesmo comunista, que não haja operado nos interesses do dinheiro, nas direções indicadas pelo dinheiro, e pelo tempo permitido pelo dinheiro - e isso sem os idealistas entre seus líderes terem a menor suspeita do fato"
É essa identidade de espírito entre capitalismo e marxismo que muitas vezes se tem manifesto no subsídio de movimentos "revolucionários" pela plutocracia. Alguns plutocratas são capazes de discernir que o marxismo e movimentos similares "do povo", são de fato instrumentos úteis para a destruição de sociedades tradicionais e estorvos para a maximização global de lucros. O Duque de Orleans buscava usar "o povo" para os mesmos propósitos na França durante o século XVIII.
O Capitalismo na Dialética Marxista
Enquanto o que é muitas vezes suposto ser "Conservadorismo" é defendido por seus aderentes como o custódio do "livre comércio", que por sua vez é tornado sinônimo de "liberdade", Marx compreendeu o caráter subversivo do Livre Comércio, que é qualquer coisa além de uma tendência conservadora. Spengler cita a posição de Marx em relação ao Livre Comércio expressa em 1847:
"Geralmente falando, o sistema protecionista de hoje é conservador, enquanto o sistema de livre comércio possui um efeito destrutivo. Ele destrói as nacionalidades e torna os contrastes entre proletariado e burguesia mais agudos. Em uma palavra, o sistema de livre comércio precipita a revolução social. E apenas nesse sentido revolucionário eu voto favoravelmente pelo Livre Comércio".
Para Marx, o capitalismo era parte de um processo dialético inexorável que, como na visão progressiva-linear da história, vê a humanidade ascendendo do comunismo primitivo, através do feudalismo, do capitalismo, do socialismo e finalmente - como o fim da história - a um mundo milenarista do comunismo. Ao longo desse desdobramento dialético progressivo a força impulsora da história é a luta de classes pela primazia dos interesses econômicos seccionais. No reducionismo econômico marxiano, a história é relegada à luta:
"[uma luta entre] homem livre e escravo, patrício e plebeu, senhor e servo, mestre de guilda e aprendiz, em uma palavra, opressor e oprimido...em constante oposição um ao outro, travada ininterruptamente, agora oculta, agora aberta, uma luta que a cada vez terminou, ou em uma reconstituição revolucionária da sociedade em geral, ou na ruína comum das classes em confronto".
Marx corretamente descreve a destruição da sociedade tradicional como intrínseca ao capitalismo, e segue para descrever o que hoje chamamos "globalização". Aqueles que defendem o Livre Comércio enquanto ao mesmo tempo chamam a si mesmos conservadores poderiam querer considerar o motivo pelo qual Marx apoiava o Livre Comércio e o descrevia tanto como "destrutivo" e "revolucionário". Marx o via como ingrediente necessário do processo dialético que está impondo a padronização universal; que é também o objetivo do comunismo.
Marx ao descrever o papel dialético do capitalismo, afirma que onde quer que a "burguesia adquiriu a predominância ela pôs um fim a todas as relações feudais, patriarcais e idílicas". A burguesia ou o que poderíamos chamar de classe mercantil - a qual é atribuída uma posição subordinada nas sociedades tradicionais, mas assume dominância sob o "modernismo" - "tem impiedosamente arrasado" os laços feudais, e "não tem deixado qualquer outro nexo entre homem e homem do que o egoísmo nu", e o "indiferente pagamento em dinheiro". Ele, entre outras coisas, "afogou" a religiosidade e o cavalheirismo "nas águas gélidas dos cálculos egoístas". "Ele resolveu o valor pessoal em valor de troca, e no lugar das inumeráveis liberdades irrevogáveis, estabeleceu aquela única liberdade desarrazoada - o Livre Comércio". Onde o conservador de discernimento se situa em oposição à análise marxiana do capitalismo é onde Marx considera o processo inexorável e desejável.
Marx condenava a oposição a esse processo dialético como "reacionária". Marx estava aqui defendendo comunistas contra as acusações dos "reacionários" de que seu sistema resultaria na destruição da família tradicional, e relegaria as profissões a mero "trabalho assalariado", afirmando que isso já estava sendo feito pelo capitalismo de qualquer jeito e que, portanto, não era um processo a ser resistido - o que seria "Reacionismo" - mas saudado como fase necessário na caminhada rumo ao comunismo.
Tendências Universalizantes
Marx via a necessidade constante de revolucionar os instrumentos de produção como inevitável sob o capitalismo, e isso por sua vez punha a sociedade em um contínuo estado de fluxo, de "incerteza e agitação duradouras", que distingue a "época burguesa de todas as outras". A "necessidade para uma constante expansão do mercado" significa que o capitalismo se espalha globalmente, e portanto dá um "caráter cosmopolita" a "modos de produção e consumo em cada país". Isso na dialética marxista é uma parte necessária da destruição das fronteiras nacionais e culturas distintas como prelúdio para o socialismo mundial. É o capitalismo quem estabelece a base para o internacionalismo. Portanto, quando o marxista clama contra a "globalização" ele o faz como retórica na defesa de uma agenda política; não por uma oposição ética ao globalismo enquanto tal.
A esse processo capitalista internacionalizante Marx identifica os oponentes não como revolucionários, mas como "reacionistas". Os reacionários ficam horrorizados com o fato de indústrias nacionais e locais estarem sendo destruídas, a autossuficiência estar sendo solapada, e "nós temos...uma interdependência universal de nações". Similarmente na esfera cultural, onde "literaturas nacionais e locais" são deslocadas por "uma literatura mundial". O resultado é uma cultura econômica global, e mesmo um humano global, apartado de todos os laços geográficos e culturais, como enaltecido por apologistas da globalização como G. Pascal Zachary. Um tipo de nômade emerge que serve aos interesses de uma economia internacional onde quer que ele seja necessário.
Com esse revolucionamento e padronização dos meios de produção vem uma perda do sentido de ser parte de um ofício ou profissão, ou "vocação". A obsessão com o trabalho se torna um fim em si mesmo, o qual deixa de fornecer um significado superior pelo fato de se reduzir a uma mera função econômica. Em relação à ruína da ordem tradicional pelo triunfo da "burguesia", Marx disse o seguinte:
"Devido ao uso extensivo de maquinário e à divisão do trabalho, o trabalho dos proletários perdeu todo caráter individual, e, consequentemente, todo encanto para o trabalhador. Ele se torna um apêndice da máquina, e é apenas a habilidade mais simples, monótona e facilmente adquirida, que é demandada dele..."
Enquanto as corporações clássicas e as guildas medievais preenchiam um papel que era metafísico e cultural em termos da própria profissão, estes foram substituídos pelos sindicatos e associações patronais como nada além de instrumentos de competição econômica. A totalidade da civilização ocidental, e singularmente, muito do resto do mundo, por causa do processo de globalização, se tornou uma expressão de valores monetários. Porém, a preocupação com o PIB - geralmente a única preocupação da politicagem de urnas - não pode ser um substituto para valores humanos mais profundos. Daí é amplamente percebido que aqueles entre os ricos não são necessariamente o que estão realizados, e o afluente muitas vezes existe em um vácuo, com um anseio indefinido que pode ser preenchido com drogas, álcool, divórcio e suicídio. O ganho material não se iguala com o que Jung chama "individuação". De fato, a preocupação com acúmulo material, seja sob capitalismo ou sob o marxismo, encadeia o homem ao mais baixo nível da existência animalista.
A Megalópole
De interesse particular é que Marx escreve da maneira pela qual a base rural da ordem tradicional sucumbe à urbanização e industrialização, que é o que formou o "proletariado", a massa desenraizada que é defendida pelo socialismo como o ideal e não como uma aberração corrupta do camponês e do artesão. As sociedades tradicionais são literalmente enraizadas no solo, com um senso de continuidade através das gerações. Sob o capitalismo a vida campesina e a vida localizada, são, como disse Marx, tornadas ultrapassadas pela cidade e pela produção em massa. Marx se referiu ao campo sendo sujeito ao "domínio das cidades". Era um fenômeno - a ascensão da Cidade concomitante com a ascensão do comerciante - que Spengler afirma como sintoma da decadência de uma Civilização em sua fase estéril, onde valores monetários imperam.
Marx escreve que o que foi criado foram "cidades enormes"; o que Spengler chama "Megalopolitismo". Novamente, o que distingue Marx em sua análise do capitalismo dos tradicionalistas conservadores, é que ele saúda esse caráter destrutivo do capitalismo. Quando Marx escreve sobre urbanização e da alienação do antigo campesinato e artesãos por sua proletarianização nas cidades, se tornando engrenagens no processo de produção em massa, ele se refere a isso não como a um processo a ser resistido, mas como inexorável e tendo "resgatado parte considerável da população da idiotice da vida rural".
"Reacionismo"
Marx aponta no Manifesto Comunista que os "reacionistas" veem com "grande desapontamento" os processos dialéticos do capitalismo. O reacionário ou conservador no sentido tradicional, é anticapitalista par excellence, porque ele está acima e além do zeitgeist do qual tanto capitalismo como marxismo emergiram, e ele rejeitam na totalidade o reducionismo econômico em que ambos são fundados. Assim a palavra "reacionário", usualmente usada em sentido derrogativo, pode ser aceita pelo conservador como um termo preciso para o que é necessário para uma renascença cultural, ética e espiritual.
Marx condenava a resistência ao processo dialético como "reacionista", e identificava o conservadorismo como a força real em revolta contra o espírito mercantil:
"A classe média baixa, o pequeno manufatureiro, o lojista, o artesão, o camponês. Todos esses lutam contra a burguesia, para salvar da extinção sua existência como frações da classe média. Eles são, portanto, não revolucionários, mas conservadores. Não, mais, eles são reacionários, pois eles tentam reverter a roda da história. Se por acaso eles são revolucionários, eles o são apenas em vistas de sua transferência iminente para o proletariado, eles assim defendem não seu presente, mas seus interesses futuros, eles desertam assim de seu próprio ponto de vista para se situarem no do proletariado".
Essa chamada "classe média baixa" está portanto inexoravelmente condenada ao purgatório da despossessão proletária até o tempo em que reconheça seu papel histórico como classe revolucionária, e "exproprie os expropriadores". Essa "classe média baixa" pode ou emergir do purgatório se juntando as fileiras do povo escolhido proletário, se tornando parte da revolução socialista e ingressando em um novo milênio, ou ela pode descer de seu purgatório de classe, se insistir em tentar manter a ordem tradicional, e ser relegada ao esquecimento, que pode ser acelerado pelos pelotões de fuzilamento do bolchevismo.
Marx devota a seção três de seu Manifesto Comunista a um repudio do "socialismo reacionário". Ele condena o "socialismo feudal" que emergiu entre os velhos remanescentes da aristocracia, que buscava unir forças com a "classe trabalhadora" contra a burguesia. Marx afirma que a aristocracia, ao tentar reafirmar sua posição pré-burguesa, havia na verdade perdido de vistas seus interesses de classe ao ter que se aliar com o proletariado. Isso não faz sentido. Uma aliança das profissões despossuídas no que se tornou o proletariado, com a cada vez mais despossuída aristocracia, é uma aliança orgânica, que encontra seus inimigos tanto no marxismo como no mercantilismo. Marx se enfurecia contra a aliança emergente entre a aristocracia e aquelas profissões despossuídas que resistiam a proletarização. Daí, Marx condena o "socialismo feudal" como "parte eco do passado, parte ameaça do futuro". Era um movimento que desfrutava de apoio significativo entre os artesãos, o clero, os nobres e letrados na Alemanha em 1848, que repudiavam o livre mercado que havia divorciado o indivíduo da Igreja, do Estado e da comunidade, "e posto o egoísmo e o interesse próprio antes da subordinação, da comunalidade e da solidariedade social" (isto é, os elementos do que Spengler definiria como "Socialismo Prussiano"). Em relação a esses "reacionistas", Max Beer, um historiador do socialismo alemão, afirmou o seguinte:
"A era moderna parecia a eles ser construída sobre areia movediça, ser caos, anarquia, ou uma explosão completamente imoral e profana de forças intelectuais e econômicas, que deve inevitavelmente levar a agudos antagonismos sociais, a extremos de riqueza e pobreza, e à tormenta universal. Nesse visão, a Idade Média, com sua firme ordem na Igreja, na vida social e econômica, sua fé em Deus, suas instituições feudais, seus claustros, suas associações autônomas e guildas pareciam a esses pensadores como um edifício bem construído..."
É exatamente tal aliança de todas as classes - outrora veementemente condenada por Marx como "reacionista" - que é necessária para se resistir aos fenômenos subversivos comuns do Livre Comércio e da revolução. Algo do tipo foi visto novamente, como mencionado antes, nas doutrinas pós-Primeira Guerra do Distributismo, do Crédito Social e do Socialismo de Guilda, os primeiros dois pelo menos, tendo recebido ímpeto por encíclicas papais, que viam o perigo do marxismo como subproduto dos excessos do capitalismo, e ambos como formas de materialismo levando a um mundo desprovido de fé. É esse mundo secular e sem fé, onde Mammon governa, o que Spengler viu como a época do declínio, mas talvez também como uma de prelúdio de revolta contra o "dinheiro" e de uma "Segunda Religiosidade".
Enquanto a Civilização Ocidental se orgulha de ser o epítome do "progresso" através de sua atividade econômica, ela é baseada na ilusão de uma evolução darwiniana linear do "primitivo" ao "moderno". Talvez algumas palavras mais sucintamente expressem a antítese entre as percepções modernista e conservadora tradicional da vida do que o otimismo vivaz do darwinista oitocentista Dr. A.R. Wallace em seu O Século Maravilhoso (1898):
"Não só nosso século é superior a qualquer um que já tenha passado mas...ele pode ser comparado melhor com todo o período histórico precedente. Deve ser assim sustentado que ele constitui o início de uma nova era de progresso humano... Nós homens do século XIX não temos sido lentos em elogiá-lo. O sábio e o tolo, o erudito e o ignaro, o poeta e o jornalista, o rico e o pobre, todos incham o coro de admiração pelas invenções e descobertas maravilhosas de nossa própria era, e especialmente por aquelas inúmeras aplicações da ciência que agora fazem parte de nossa vida quotidiana, e que nos lembram a cada hora de nossa imensa superioridade sobre nossos comparativamente ignorantes ancestrais".
Como a crença de Marx de que o comunismo é o último modo de vida humana, o capitalismo possui a mesma crença. Em ambas visões-de-mundo não há nada além de mais "progresso" de natureza técnica. Ambas doutrinas representam o "fim da história". O tradicionalista, porém, vê a história não como uma linha reta do "primitivo ao moderno" mas como um contínuo fluir, de ondas históricas cósmicas, ou ciclos. Enquanto a "roda da história" de Marx se move para a frente atropelando toda tradição e herança até se deter eternamente em um muro cinzento de concreto e aço, a "roda da história" tradicionalista revolve em um ciclo em um eixo estável, até o momento em que o eixo apodrece - a não ser que esteja suficientemente lubrificado ou seja substituído na hora certa - e os raios caem; para ser substituída por outra "roda da história".
Dentro do contexto ocidental, as revoluções de 1642, 1789 e 1848, ainda que em nome do "povo", buscaram dar poder ao mercador sobre as ruínas do Trono e da Igreja. Spengler escreve sobre esta última era que na Inglaterra, "...a doutrina do Livre Comércio da Escola de Manchester foi aplicada pelas corporações de ofício à forma de bens chamada 'trabalho', e eventualmente receberam formulação teórica no Manifesto Comunista de Marx e Engels. E assim foi completado o destronamento da política pela economia, do Estado pelo banco..."
Spengler chama os tipos marxianos de socialismo de "capitalistas" porque eles não objetivam substituir os valores fundados no dinheiro, "mas possuí-los". Ele afirma do marxismo que ele não é "nada além de um capanga confiável do Grande Capital, que sabe perfeitamente bem como fazer uso dele". Ainda:
"Os conceitos de liberalismo e socialismo são postos em movimento apenas pelo dinheiro. Foram os Equites, o partido do dinheiro, que tornou o movimento popular de Tiberius Gracchus possível; e assim que a parte das reformas que lhes era vantajosa havia sido legalizada com sucesso, eles se retiraram e o movimento entrou em colapso.
Não há movimento proletário, ou mesmo comunista, que não haja operado nos interesses do dinheiro, nas direções indicadas pelo dinheiro, e pelo tempo permitido pelo dinheiro - e isso sem os idealistas entre seus líderes terem a menor suspeita do fato"
É essa identidade de espírito entre capitalismo e marxismo que muitas vezes se tem manifesto no subsídio de movimentos "revolucionários" pela plutocracia. Alguns plutocratas são capazes de discernir que o marxismo e movimentos similares "do povo", são de fato instrumentos úteis para a destruição de sociedades tradicionais e estorvos para a maximização global de lucros. O Duque de Orleans buscava usar "o povo" para os mesmos propósitos na França durante o século XVIII.
O Capitalismo na Dialética Marxista
Enquanto o que é muitas vezes suposto ser "Conservadorismo" é defendido por seus aderentes como o custódio do "livre comércio", que por sua vez é tornado sinônimo de "liberdade", Marx compreendeu o caráter subversivo do Livre Comércio, que é qualquer coisa além de uma tendência conservadora. Spengler cita a posição de Marx em relação ao Livre Comércio expressa em 1847:
"Geralmente falando, o sistema protecionista de hoje é conservador, enquanto o sistema de livre comércio possui um efeito destrutivo. Ele destrói as nacionalidades e torna os contrastes entre proletariado e burguesia mais agudos. Em uma palavra, o sistema de livre comércio precipita a revolução social. E apenas nesse sentido revolucionário eu voto favoravelmente pelo Livre Comércio".
Para Marx, o capitalismo era parte de um processo dialético inexorável que, como na visão progressiva-linear da história, vê a humanidade ascendendo do comunismo primitivo, através do feudalismo, do capitalismo, do socialismo e finalmente - como o fim da história - a um mundo milenarista do comunismo. Ao longo desse desdobramento dialético progressivo a força impulsora da história é a luta de classes pela primazia dos interesses econômicos seccionais. No reducionismo econômico marxiano, a história é relegada à luta:
"[uma luta entre] homem livre e escravo, patrício e plebeu, senhor e servo, mestre de guilda e aprendiz, em uma palavra, opressor e oprimido...em constante oposição um ao outro, travada ininterruptamente, agora oculta, agora aberta, uma luta que a cada vez terminou, ou em uma reconstituição revolucionária da sociedade em geral, ou na ruína comum das classes em confronto".
Marx corretamente descreve a destruição da sociedade tradicional como intrínseca ao capitalismo, e segue para descrever o que hoje chamamos "globalização". Aqueles que defendem o Livre Comércio enquanto ao mesmo tempo chamam a si mesmos conservadores poderiam querer considerar o motivo pelo qual Marx apoiava o Livre Comércio e o descrevia tanto como "destrutivo" e "revolucionário". Marx o via como ingrediente necessário do processo dialético que está impondo a padronização universal; que é também o objetivo do comunismo.
Marx ao descrever o papel dialético do capitalismo, afirma que onde quer que a "burguesia adquiriu a predominância ela pôs um fim a todas as relações feudais, patriarcais e idílicas". A burguesia ou o que poderíamos chamar de classe mercantil - a qual é atribuída uma posição subordinada nas sociedades tradicionais, mas assume dominância sob o "modernismo" - "tem impiedosamente arrasado" os laços feudais, e "não tem deixado qualquer outro nexo entre homem e homem do que o egoísmo nu", e o "indiferente pagamento em dinheiro". Ele, entre outras coisas, "afogou" a religiosidade e o cavalheirismo "nas águas gélidas dos cálculos egoístas". "Ele resolveu o valor pessoal em valor de troca, e no lugar das inumeráveis liberdades irrevogáveis, estabeleceu aquela única liberdade desarrazoada - o Livre Comércio". Onde o conservador de discernimento se situa em oposição à análise marxiana do capitalismo é onde Marx considera o processo inexorável e desejável.
Marx condenava a oposição a esse processo dialético como "reacionária". Marx estava aqui defendendo comunistas contra as acusações dos "reacionários" de que seu sistema resultaria na destruição da família tradicional, e relegaria as profissões a mero "trabalho assalariado", afirmando que isso já estava sendo feito pelo capitalismo de qualquer jeito e que, portanto, não era um processo a ser resistido - o que seria "Reacionismo" - mas saudado como fase necessário na caminhada rumo ao comunismo.
Tendências Universalizantes
Marx via a necessidade constante de revolucionar os instrumentos de produção como inevitável sob o capitalismo, e isso por sua vez punha a sociedade em um contínuo estado de fluxo, de "incerteza e agitação duradouras", que distingue a "época burguesa de todas as outras". A "necessidade para uma constante expansão do mercado" significa que o capitalismo se espalha globalmente, e portanto dá um "caráter cosmopolita" a "modos de produção e consumo em cada país". Isso na dialética marxista é uma parte necessária da destruição das fronteiras nacionais e culturas distintas como prelúdio para o socialismo mundial. É o capitalismo quem estabelece a base para o internacionalismo. Portanto, quando o marxista clama contra a "globalização" ele o faz como retórica na defesa de uma agenda política; não por uma oposição ética ao globalismo enquanto tal.
A esse processo capitalista internacionalizante Marx identifica os oponentes não como revolucionários, mas como "reacionistas". Os reacionários ficam horrorizados com o fato de indústrias nacionais e locais estarem sendo destruídas, a autossuficiência estar sendo solapada, e "nós temos...uma interdependência universal de nações". Similarmente na esfera cultural, onde "literaturas nacionais e locais" são deslocadas por "uma literatura mundial". O resultado é uma cultura econômica global, e mesmo um humano global, apartado de todos os laços geográficos e culturais, como enaltecido por apologistas da globalização como G. Pascal Zachary. Um tipo de nômade emerge que serve aos interesses de uma economia internacional onde quer que ele seja necessário.
Com esse revolucionamento e padronização dos meios de produção vem uma perda do sentido de ser parte de um ofício ou profissão, ou "vocação". A obsessão com o trabalho se torna um fim em si mesmo, o qual deixa de fornecer um significado superior pelo fato de se reduzir a uma mera função econômica. Em relação à ruína da ordem tradicional pelo triunfo da "burguesia", Marx disse o seguinte:
"Devido ao uso extensivo de maquinário e à divisão do trabalho, o trabalho dos proletários perdeu todo caráter individual, e, consequentemente, todo encanto para o trabalhador. Ele se torna um apêndice da máquina, e é apenas a habilidade mais simples, monótona e facilmente adquirida, que é demandada dele..."
Enquanto as corporações clássicas e as guildas medievais preenchiam um papel que era metafísico e cultural em termos da própria profissão, estes foram substituídos pelos sindicatos e associações patronais como nada além de instrumentos de competição econômica. A totalidade da civilização ocidental, e singularmente, muito do resto do mundo, por causa do processo de globalização, se tornou uma expressão de valores monetários. Porém, a preocupação com o PIB - geralmente a única preocupação da politicagem de urnas - não pode ser um substituto para valores humanos mais profundos. Daí é amplamente percebido que aqueles entre os ricos não são necessariamente o que estão realizados, e o afluente muitas vezes existe em um vácuo, com um anseio indefinido que pode ser preenchido com drogas, álcool, divórcio e suicídio. O ganho material não se iguala com o que Jung chama "individuação". De fato, a preocupação com acúmulo material, seja sob capitalismo ou sob o marxismo, encadeia o homem ao mais baixo nível da existência animalista.
A Megalópole
De interesse particular é que Marx escreve da maneira pela qual a base rural da ordem tradicional sucumbe à urbanização e industrialização, que é o que formou o "proletariado", a massa desenraizada que é defendida pelo socialismo como o ideal e não como uma aberração corrupta do camponês e do artesão. As sociedades tradicionais são literalmente enraizadas no solo, com um senso de continuidade através das gerações. Sob o capitalismo a vida campesina e a vida localizada, são, como disse Marx, tornadas ultrapassadas pela cidade e pela produção em massa. Marx se referiu ao campo sendo sujeito ao "domínio das cidades". Era um fenômeno - a ascensão da Cidade concomitante com a ascensão do comerciante - que Spengler afirma como sintoma da decadência de uma Civilização em sua fase estéril, onde valores monetários imperam.
Marx escreve que o que foi criado foram "cidades enormes"; o que Spengler chama "Megalopolitismo". Novamente, o que distingue Marx em sua análise do capitalismo dos tradicionalistas conservadores, é que ele saúda esse caráter destrutivo do capitalismo. Quando Marx escreve sobre urbanização e da alienação do antigo campesinato e artesãos por sua proletarianização nas cidades, se tornando engrenagens no processo de produção em massa, ele se refere a isso não como a um processo a ser resistido, mas como inexorável e tendo "resgatado parte considerável da população da idiotice da vida rural".
"Reacionismo"
Marx aponta no Manifesto Comunista que os "reacionistas" veem com "grande desapontamento" os processos dialéticos do capitalismo. O reacionário ou conservador no sentido tradicional, é anticapitalista par excellence, porque ele está acima e além do zeitgeist do qual tanto capitalismo como marxismo emergiram, e ele rejeitam na totalidade o reducionismo econômico em que ambos são fundados. Assim a palavra "reacionário", usualmente usada em sentido derrogativo, pode ser aceita pelo conservador como um termo preciso para o que é necessário para uma renascença cultural, ética e espiritual.
Marx condenava a resistência ao processo dialético como "reacionista", e identificava o conservadorismo como a força real em revolta contra o espírito mercantil:
"A classe média baixa, o pequeno manufatureiro, o lojista, o artesão, o camponês. Todos esses lutam contra a burguesia, para salvar da extinção sua existência como frações da classe média. Eles são, portanto, não revolucionários, mas conservadores. Não, mais, eles são reacionários, pois eles tentam reverter a roda da história. Se por acaso eles são revolucionários, eles o são apenas em vistas de sua transferência iminente para o proletariado, eles assim defendem não seu presente, mas seus interesses futuros, eles desertam assim de seu próprio ponto de vista para se situarem no do proletariado".
Essa chamada "classe média baixa" está portanto inexoravelmente condenada ao purgatório da despossessão proletária até o tempo em que reconheça seu papel histórico como classe revolucionária, e "exproprie os expropriadores". Essa "classe média baixa" pode ou emergir do purgatório se juntando as fileiras do povo escolhido proletário, se tornando parte da revolução socialista e ingressando em um novo milênio, ou ela pode descer de seu purgatório de classe, se insistir em tentar manter a ordem tradicional, e ser relegada ao esquecimento, que pode ser acelerado pelos pelotões de fuzilamento do bolchevismo.
Marx devota a seção três de seu Manifesto Comunista a um repudio do "socialismo reacionário". Ele condena o "socialismo feudal" que emergiu entre os velhos remanescentes da aristocracia, que buscava unir forças com a "classe trabalhadora" contra a burguesia. Marx afirma que a aristocracia, ao tentar reafirmar sua posição pré-burguesa, havia na verdade perdido de vistas seus interesses de classe ao ter que se aliar com o proletariado. Isso não faz sentido. Uma aliança das profissões despossuídas no que se tornou o proletariado, com a cada vez mais despossuída aristocracia, é uma aliança orgânica, que encontra seus inimigos tanto no marxismo como no mercantilismo. Marx se enfurecia contra a aliança emergente entre a aristocracia e aquelas profissões despossuídas que resistiam a proletarização. Daí, Marx condena o "socialismo feudal" como "parte eco do passado, parte ameaça do futuro". Era um movimento que desfrutava de apoio significativo entre os artesãos, o clero, os nobres e letrados na Alemanha em 1848, que repudiavam o livre mercado que havia divorciado o indivíduo da Igreja, do Estado e da comunidade, "e posto o egoísmo e o interesse próprio antes da subordinação, da comunalidade e da solidariedade social" (isto é, os elementos do que Spengler definiria como "Socialismo Prussiano"). Em relação a esses "reacionistas", Max Beer, um historiador do socialismo alemão, afirmou o seguinte:
"A era moderna parecia a eles ser construída sobre areia movediça, ser caos, anarquia, ou uma explosão completamente imoral e profana de forças intelectuais e econômicas, que deve inevitavelmente levar a agudos antagonismos sociais, a extremos de riqueza e pobreza, e à tormenta universal. Nesse visão, a Idade Média, com sua firme ordem na Igreja, na vida social e econômica, sua fé em Deus, suas instituições feudais, seus claustros, suas associações autônomas e guildas pareciam a esses pensadores como um edifício bem construído..."
É exatamente tal aliança de todas as classes - outrora veementemente condenada por Marx como "reacionista" - que é necessária para se resistir aos fenômenos subversivos comuns do Livre Comércio e da revolução. Algo do tipo foi visto novamente, como mencionado antes, nas doutrinas pós-Primeira Guerra do Distributismo, do Crédito Social e do Socialismo de Guilda, os primeiros dois pelo menos, tendo recebido ímpeto por encíclicas papais, que viam o perigo do marxismo como subproduto dos excessos do capitalismo, e ambos como formas de materialismo levando a um mundo desprovido de fé. É esse mundo secular e sem fé, onde Mammon governa, o que Spengler viu como a época do declínio, mas talvez também como uma de prelúdio de revolta contra o "dinheiro" e de uma "Segunda Religiosidade".